|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
abaixo o modernismo paulista!
O crítico
gaúcho Luís Augusto Fischer aproxima Machado e Borges, sobre
os quais lança livro, e ataca a vanguarda de Mário e Oswald de Andrade
RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL
Rio de Janeiro e Buenos Aires se encontraram em Porto
Alegre. A síntese "geográfica" e
intelectual não acontece num
conto de Jorge Luis Borges,
mas em um texto de que o autor
argentino é personagem.
Acaba de sair "Machado e
Borges", publicado pela gaúcha
Arquipélago Editorial. Nele,
Luís Augusto Fischer, 50, professor de literatura brasileira
na UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul),
traça relações entre os contextos de produção e a forma literária de suas obras.
Mas e o modernismo paulista? O ansioso leitor, autor da
pergunta, talvez prefira saltar
os próximos dois parágrafos,
que lhe parecerão inúteis.
Borges e Machado de Assis,
para Fischer, são grandes e decisivos porque conseguiram,
melhor do que qualquer autor
ou movimento literário, solucionar sua condição de escritores periféricos, embora herdeiros da tradição européia.
Nem recusaram, nem aderiram ao centro, resolvendo de
modo "dialético" o problema
imposto aos escritores da América. E com seu realismo "desfocado", encontraram forma
para momentos de crise que os
dois países atravessavam quando atingiram a maturidade.
Nisso Machado, no Brasil,
encontrou solução superior à
do "modernismo paulista",
que, de acordo com Fischer, seguiu nacionalista nos temas e
estritamente vanguardista na
forma, recusando e aderindo ao
centro, sem encontrar a síntese
de que foram capazes Borges e
Machado. Na entrevista a seguir, Fischer também questiona a posição central, "excessiva", que o modernismo ainda
ocupa "na definição que se faz
da literatura e da cultura brasileira no século 20".
FOLHA - No seu livro, o sr. relaciona
os contextos históricos da produção
das obras de Machado e Borges com
certa forma literária, comum aos
dois, de desconfiança em relação ao
realismo. Como isso se dá?
FISCHER - Tanto um quanto o
outro vivem, nos seus períodos
de formação, um momento de
"alta", digamos, de estabilidade
das condições econômicas e
políticas dos dois países. Mas só
ficam maduros em momentos
de crise. Que correspondem,
mais ou menos, à campanha republicana, no Brasil, e à Segunda Guerra, na Argentina.
Nos dois casos, o realismo
aparece como uma das formas
válidas para os escritores contemporâneos a eles discutirem
o mundo. E os dois, cada um
com seu viés, mas ambos com
muita leitura da tradição inglesa, acabam conseguindo, por
uma distância não-realista, enxergar melhor o que está acontecendo. Até por isso fizeram
obra madura, grande. Não embarcaram na onda nacionalista,
nem na onda realista -que seria a saída crítica mais imediata, aparentemente mais forte.
Os dois, com sua desconfiança em relação ao realismo, não
vão aderir à superfície. Os costumes, o modo de se vestir, aparecem lateralmente na obra do
Machado. Ao passo que num
romance como "O Cortiço", você pode fazer todo um recenseamento de modos de vida das
classes populares.
Essa adesão mimética, que é
a mesma da novela, por exemplo, tem um apelo fácil para o
leitor. Nenhum dos dois aderiu
a esse conforto. Investiram numa aventura que era mais arriscada, mas que provou ser mais
eficaz a longo prazo.
FOLHA - Outra idéia é a de que eles
atingem alto padrão porque respondem melhor à condição de fazerem
literatura fora da Europa. No que a
solução dos dois é diferente daquela
do modernismo, por exemplo?
FISCHER - É possível fazer uma
distinção, no plano do temperamento, entre uma atitude
clássica e uma atitude romântica. Nesse sentido, o modernismo de modelo paulista, de modelo vanguardista, também é
romântico. Ele é entusiasmado,
se compreende como vanguarda, se apresenta com uma face
de combate. É uma coisa que
tem um apelo forte, e é encantador para uma perspectiva
adolescente, digamos, que
quando vê alguém brigando na
rua acha que ali está o caminho
da verdade.
Texto Anterior: Mônica Bergamo Próximo Texto: "Em SP, só vale o que é novo ou vanguardista" Índice
|