São Paulo, quinta-feira, 23 de outubro de 2008

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Crítica/show

Rollins empolga com vigor intacto

Na abertura do Tim Festival, saxofonista de 78 anos confirmou fôlego em longos improvisos; músico volta a tocar no sábado

CARLOS CALADO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O aviso de que fotos e filmes eram proibidos foi ignorado. Uma multidão de fãs se postou em frente ao palco, quase ao final do show de Sonny Rollins, anteontem, na abertura do Tim Festival, em São Paulo. Com celulares e câmeras nas mãos, todos queriam levar alguma lembrança do lendário jazzista, além das duas horas de música.
Ao surgir no palco do Auditório Ibirapuera, Rollins já foi aplaudido de pé. Os privilegiados que assistiram a seus dois únicos concertos no país (em 1985, no Rio, na primeira edição do Free Jazz) reencontraram um saxofonista mais abatido, mostrando dificuldade para andar, mas com seu carisma e vigor musical intactos.
É estimulante ver como Rollins, aos 78 anos, ainda tem fôlego para soprar seu sax tenor, às vezes furiosamente, em longos improvisos. Já entrou em cena solando o blues "Strode Rode", uma de suas composições dos anos 50, época em que se tornou um dos expoentes do estilo hard bop.
Suas improvisações seguem um padrão clássico. Muitas vezes extrai um fragmento da melodia da composição, que é esticado, alterado, virado ao avesso, mas sempre mantendo relação com a melodia original.
Formado na moderna escola do bebop, Rollins usa canções de sucesso como pretextos para seus solos. A balada "They Say It's Wonderful" (de Irving Berlin) foi acelerada e reduzida quase a um simples refrão melódico. Quem já a ouviu, por exemplo, na romântica gravação de Johnny Hartman, teve dificuldade para reconhecê-la.
Mas Rollins não dispensa uma dose de romantismo. Lembrou a balada "In a Sentimental Mood" (Duke Ellington), em versão prejudicada pelo descosturado solo do baixista Bob Cranshaw. No momento mais emotivo da noite, tocou a valsa-jazz "Someday I'll Find You" (Noel Coward), menção à morte de sua mulher, Lucille, que o acompanhou por 45 anos.
Ao final desse número, demonstrando estar emocionado, o veterano jazzista tentou se despedir. Jogando beijos, Rollins foi novamente aplaudido de pé pela platéia, que não o deixou sair do palco.
Assim começou uma inesquecível sessão-bis, que incluiu o calipso "Don't Stop the Carnival", um blues bem dissonante, uma breve versão de "Isn't She Lovely" (Stevie Wonder) e o bebop "Tenor Madness".
Quem perdeu essa noite histórica, ainda pode ouvir Sonny Rollins no sábado, de graça, às 11h, no parque Ibirapuera. Ver uma lenda viva do jazz, como ele, é algo para se lembrar pelo resto da vida.

Avaliação: ótimo



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