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Crítica/show
Rollins empolga com vigor intacto
Na abertura do Tim Festival, saxofonista de 78 anos confirmou fôlego em longos improvisos; músico volta a tocar no sábado
CARLOS CALADO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O
aviso de que fotos e filmes eram proibidos foi
ignorado. Uma multidão de fãs se postou em frente
ao palco, quase ao final do show
de Sonny Rollins, anteontem,
na abertura do Tim Festival,
em São Paulo. Com celulares e
câmeras nas mãos, todos queriam levar alguma lembrança
do lendário jazzista, além das
duas horas de música.
Ao surgir no palco do Auditório Ibirapuera, Rollins já foi
aplaudido de pé. Os privilegiados que assistiram a seus dois
únicos concertos no país (em
1985, no Rio, na primeira edição do Free Jazz) reencontraram um saxofonista mais abatido, mostrando dificuldade para
andar, mas com seu carisma e
vigor musical intactos.
É estimulante ver como Rollins, aos 78 anos, ainda tem fôlego para soprar seu sax tenor,
às vezes furiosamente, em longos improvisos. Já entrou em
cena solando o blues "Strode
Rode", uma de suas composições dos anos 50, época em que
se tornou um dos expoentes do
estilo hard bop.
Suas improvisações seguem
um padrão clássico. Muitas vezes extrai um fragmento da melodia da composição, que é esticado, alterado, virado ao avesso, mas sempre mantendo relação com a melodia original.
Formado na moderna escola
do bebop, Rollins usa canções
de sucesso como pretextos para
seus solos. A balada "They Say
It's Wonderful" (de Irving Berlin) foi acelerada e reduzida
quase a um simples refrão melódico. Quem já a ouviu, por
exemplo, na romântica gravação de Johnny Hartman, teve
dificuldade para reconhecê-la.
Mas Rollins não dispensa
uma dose de romantismo.
Lembrou a balada "In a Sentimental Mood" (Duke Ellington), em versão prejudicada pelo descosturado solo do baixista Bob Cranshaw. No momento
mais emotivo da noite, tocou a
valsa-jazz "Someday I'll Find
You" (Noel Coward), menção à
morte de sua mulher, Lucille,
que o acompanhou por 45 anos.
Ao final desse número, demonstrando estar emocionado,
o veterano jazzista tentou se
despedir. Jogando beijos, Rollins foi novamente aplaudido
de pé pela platéia, que não o
deixou sair do palco.
Assim começou uma inesquecível sessão-bis, que incluiu
o calipso "Don't Stop the Carnival", um blues bem dissonante,
uma breve versão de "Isn't She
Lovely" (Stevie Wonder) e o bebop "Tenor Madness".
Quem perdeu essa noite histórica, ainda pode ouvir Sonny
Rollins no sábado, de graça, às
11h, no parque Ibirapuera. Ver
uma lenda viva do jazz, como
ele, é algo para se lembrar pelo
resto da vida.
Avaliação: ótimo
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