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Comentário
Mostra é importante, mas se tornou menos urgente
TONY GOES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Neste ano, entraram em cartaz em São Paulo filmes de quase 30 países. Vieram títulos da
Turquia, da Romênia, da Tunísia e do Cazaquistão. Muitos fizeram carreiras discretas nas
salas "de arte", mas não importa: entraram em cartaz. Não foram exibições especiais nem
parte de retrospectivas. Disputaram público com "Tá Chovendo Hambúrguer" e "Se Beber, Não Case".
Há dez ou 20 anos, a situação
era diferente. Filmes "exóticos", de países "periféricos", só
na Mostra e olhe lá. Vencedores
do prêmio César e campeões
das bilheterias gaulesas não
saíam nem em vídeo. A Mostra
funcionava como uma janela
temporária, transbordando de
opções, e de curtíssima duração. Como ver tanto filme em
tão pouco tempo? Impossível.
Os aficionados acabavam se enganando, vendo porcarias e deixando escapar obras-primas.
Por todos os séculos e séculos,
amém.
Se o panorama mudou, a
Mostra tem a ver com isso. Ela
educou uma geração de espectadores e provou que existe
mercado para obras que não seguem o padrão blockbuster.
Criou um selo, o Filmes da
Mostra, para distribuir os queridinhos de seu público. E, ao
cumprir tão nobre objetivo,
deu um tiro no próprio pé.
Hoje ela continua importante, mas menos urgente. Para
que correr, procurar vaga e enfrentar fila? Só para ver o novo
do Almodóvar? Daqui a um
mês ele entra em cartaz. "A Fita
Branca", ganhador de Cannes,
tem estreia garantida. E dezenas de filmes só estarão na
Mostra para dar o pontapé inicial nas carreiras. Depois os veremos nos cinemas dos shoppings, em DVD, na TV a cabo,
nas Lojas Americanas. E, talvez, já os tenhamos visto em
versões baixadas da internet
sem a menor cerimônia.
Então a Mostra esvaziou?
Por um lado, não. O público
cresce a cada ano, as permanentes se esgotam em minutos,
as filas seguem imensas. Mas é
cada vez mais raro o frisson,
quase desespero: "Ou vemos o
Jarmusch hoje, ou baubau".
Ah, que saudade da Mostra.
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