São Paulo, quinta-feira, 23 de dezembro de 2004

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MERCADO EDITORIAL

Edital do governo muda regras de compras públicas e provoca reviravoltas na disputa pelo setor

Dicionários terão mudança "substantiva"

CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Não haverá Natal, Réveillon nem Carnaval para um grupo seleto de profissionais do livro. Os "dicionaristas" vão passar todo o verão com as caras enfiadas na sombra de seus verbetes.
Um edital divulgado na semana passada pelo MEC mudou as regras do jogo para compras governamentais de dicionários e aqueceu ainda mais a disputa pelo filão, que já vivia em cadência acelerada com a mudança de casa do "Aurélio" e o lançamento dos novos "Caldas Aulete" e "Larousse".
As alterações propostas pelo governo, que compra cerca de 70% da produção de dicionários, foram substantivas (e não ganharam os melhores adjetivos do mercado editorial).
A Secretaria de Educação Básica do MEC estabeleceu que o governo vai comprar não mais um tipo de dicionário, mas três. Além dos que já vinham sendo adquiridos, na faixa de 25 mil a 35 mil verbetes (os chamados mini ou escolar), passa a comprar modelos com mil a 3.000 e de 3.000 a 10 mil verbetes, para crianças de 1ª a 4ª série.
"As crianças de seis a sete anos, em processo de alfabetização, estavam recebendo dicionários de 25 mil a 35 mil verbetes. Elas dificilmente usariam os livros", diz a diretora de Políticas de Educação Infantil e Ensino Fundamental da SEB-MEC, Jeanette Beauchamp.
Ela salienta que a outra grande mudança, na política de distribuição dos volumes, está ligada a esta mesma avaliação de que os dicionários não estavam sendo bem aproveitados. Se antes eles eram distribuídos para cada aluno, agora serão consultados coletivamente em sala de aula. "De nada vale distribuição sem mediação."
As medidas não foram bem recebidas pelo meio editorial. A instituição mais importante de editoras de livros didáticos, a Abrelivros, encaminhou na sexta-feira uma carta ao FNDE questionando 11 pontos do edital.
"Os dois maiores problemas foram o prazo que recebemos para fazer produtos que poucos tinham no mercado e o número altíssimo de indefinições do documento", diz João Arinos, presidente da entidade.
As editoras interessadas têm até 4 de março para entregarem os protótipos impressos dos dicionários que pretendem vender ao governo. A Abrelivros reivindica que o processo seja esticado pelo menos até 6 de maio.
Editor de uma das principais famílias de dicionários no mercado, a "Houaiss", Roberto Feith, da Objetiva, diz que a mudança proposta pelo governo tem "consistência" e "nexo", mas é um dos que defende que a ampulheta do MEC tem muito pouca areia.
"Não é só questão de reformatação de dicionários que já temos. Precisaríamos desenvolver verbetes adequados para as crianças que estão aprendendo a ler."
Feith diz que ele e a equipe do Instituto Antonio Houaiss vão passar as festividades de final de ano "queimando pestanas" para ver se entrarão na disputa pelos tipos 1 e 2 (o tipo 3 eles já têm).
"Vamos comer o peru em uma hora e meia e voltar ao trabalho", brinca Breno Lerner, da Melhoramentos. Dona da marca Michaelis, que acaba de colocar no mercado um diferencial importante no segmento "escolar" (a inclusão de um CD-ROM gratuito), a Melhoramentos trabalhará para os tipos 1 e 2 em cima de produtos que já tinha no catálogo.
É o caso também da Nova Fronteira. Antiga dona do "Aurélio" (agora com o grupo paranaense Positivo), a editora ainda têm direitos sobre a versão infantil desta marca, com desenhos da Turma da Mônica. O dicionário será remodelado para se encaixar no tipo 1. Para o tipo 3 ela acaba de lançar uma versão totalmente nova, e com muitos diferenciais, do tradicional "Caldas Aulete". O "tipo 2" ainda está sendo estudado.
Situação análoga vive a Larousse. A gigante francesa de dicionários, que lançou há pouco seu modelo escolar (tipo 3), fará ajustes em seu "Meu Primeiro Larousse Dicionário", ilustrado, para atender as crianças de 1ª e 2ª série. Também trabalham no tipo 2. "Neste país é impossível trabalhar sem pensar nas compras do governo", diz o diretor da empresa, Jean-Christophe Marc.
Embora o número de dicionários não esteja definido no edital, assim como a verba que será usada na empreitada, estima-se que serão adquiridos cerca de 4 milhões de exemplares (Beauchamp diz que serão comprados cerca de um dicionário para cada quatro alunos -o número total de alunos nessas séries é de 17 milhões), números atraentes para toda a turma das letras.


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