São Paulo, terça-feira, 24 de janeiro de 2006

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EXPOSIÇÃO/CRÍTICA

Márcia X. explora possibilidades múltiplas do erotismo

FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

Exposições com caráter retrospectivo e logo após a morte de um artista correm o risco de apresentar ar solene que, muitas vezes, propicia uma visão condolente. Não é o que ocorre na mostra "Márcia X. Revista", em cartaz no Paço Imperial, no Rio de Janeiro, com curadoria de Claudia Saldanha e Ricardo Ventura.
A retrospectiva traça um percurso representativo de Márcia X., artista que iniciou sua carreira na década de 80 e morreu, aos 45 anos, no ano passado. Ao contrário do que se costuma afirmar da chamada Geração 80, que teria na pintura sua única expressão, a exposição no Paço demonstra que a experimentação dos anos 70 manteve adeptos nos anos 80, e a artista desponta como das mais radicais desse grupo.
Márcia X. transitou pela instalação, escultura e videoarte, mas é na performance que sua presença se torna mais significativa.
Performance é sinônimo de uma ação do corpo do artista, ou uma ação delegada a outro corpo, e são justamente diversas leituras do corpo que dão uma linha bastante clara na carreira de Márcia, vista não só em objetos como também em vídeos.
A primeira obra da mostra, "Soap Opera", de 1988, uma imensa parede construída com sabão, apresenta já vários dos elementos que marcam a obra da artista. Primeiro, a constante ironia nos títulos. "Soap Opera", em inglês, corresponde às nossas novelas e o trocadilho barato se estenderá por muitos outros trabalhos. Nessa operação, Márcia X. alcança uma comunicação direta com o público, algo que a arte contemporânea muitas vezes não consegue, e numa forma de apropriação muito próxima do que Marcel Duchamp realizava.
Para a artista, o mundo era seu ateliê, como chegou a afirmar certa vez: "Comprar materiais no Saara [área de comércio popular no centro do Rio] para fazer esculturas, instalações e performances significa me apropriar de aspectos simbólicos destes materiais, combinando objetos, imagens e idéias deste universo, associando meu imaginário a elementos do imaginário social relativo a sexo, religião, infância, morte, masculino e feminino".
Sexo é, de fato, o elemento dominante em sua obra -e na mostra. Na instalação "Os Kaminha Sutrinhas", a artista se utiliza de bonecos de brinquedo para construir várias posições sexuais. Assim ocorre uma inversão: o assexuado brinquedo infantil se torna manual de sexo. Bonecos militares enfileirados parecem participar de uma orgia, papais-noéis encenam "Papai-Papai".
Esse erotismo exacerbado tem grande vinculação às performances de Márcia X., afinal, ambos são ações do corpo. Quando cada vez mais corpo e sexo se tornam objeto de culto, o conjunto da obra da artista parece se revestir de uma ingenuidade infantil que, em vez de banalizar esse tema, aponta para suas múltiplas possibilidades. Sem preconceito.


Márcia X. Revista
    
Onde: Paço Imperial (praça 15 de Novembro, 48, centro, RJ, tel.
0/xx/21/2533-4491)
Quando: de ter. a dom., das 12h às 18h; até 29/1
Quanto: entrada franca


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