São Paulo, quarta-feira, 24 de março de 2010

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Pra inglês não entender

Chefão da cultura do Reino Unido espanta-se com o excesso do uso de leis de incentivo fiscal no Brasil e a separação entre ministérios

Luciana Whitaker/Folha Imagem
Michael Elliott, diretor do departamento de Cultura britânico

ANA PAULA SOUSA
DA REPORTAGEM LOCAL

Na terra natal de Shakespeare, o "ser ou não ser", ao menos na cultura, não é uma questão. Lá, cultura é, sim, uma questão de Estado, ou seja, cabe ao governo destinar uma verba para a manutenção das artes.
No Reino Unido, a cultura é, também, uma questão de educação, ao ponto de, institucionalmente, estar ligada a um departamento gigante que cuida de cultura, mídia e esporte.
Foi, portanto, com surpresa - mesmo que recoberta pela discrição - que a delegação de gestores culturais britânicos em excursão pelo Brasil ouviu, na última segunda-feira, o rosário de dificuldades desfiado pelos administradores brasileiros durante um debate realizado na sede do Sesc São Paulo.
O encontro, fechado para convidados, reuniu desde produtores e intelectuais até diretores das mais importantes instituições da cidade, como Marcelo Araújo, da Pinacoteca do Estado, e Carlos Magalhães, da Cinemateca Brasileira.
Do lado britânico, estavam, entre outros, a diretora-executiva do Arts Council, Andrea Stark, secretária de cultura de Liverpool, Claire McColgan, e o diretor de Cultura do departamento de Cultura, Mídia e Esporte, Michael Elliott, nome-chave da instituição. Elliott, que havia visitado unidades do Sesc, visto um show de Jorge Mautner e visitado o teatro Oficina antes do debate, confessou, à Folha, estar pouco seguro de sua contribuição. "São experiências tão distintas, não?", perguntou, erguendo as sobrancelhas num sorriso levemente perplexo.

Leis de incentivo
As duas características brasileiras que não se encaixaram em seu pensamento ordenado foram, primeiro, a própria existência de um ministério da Cultura e, depois, a lógica das leis de incentivo, que transferem para mãos privadas o poder de decisão sobre o destino do dinheiro de imposto.
"Se você quer que a sociedade se envolva com a cultura, tem de partir do sistema educacional. As duas coisas estão interligadas", disse, após ouvir dos secretários do Estado e do município, João Sayad e Carlos Augusto Calil, que é impossível trabalhar com as secretarias da educação.
Mas nada soou tão desafinado para Elliott quanto a cantilena das leis de incentivo - que, como sempre acontece nos debates culturais no Brasil, foi tema repetido. "O benefício fiscal acarreta uma perda de arrecadação. Sempre entendemos que é preciso ter um orçamento público para a cultura."


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