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3º CHIVAS FESTIVAL
Ibrahim apresenta jazz em feitio de oração
CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL
Em sua primeira apresentação no Brasil, anteontem, o
lendário pianista Abdullah Ibrahim transportou o inóspito DirecTV Music Hall para algum topo perdido de monte em alguma
cordilheira nebulosa do globo.
Mais do que música, foi meditação o que propôs o instrumentista
e compositor sul-africano de 67
anos na primeira noite do 3º Chivas Jazz Festival em São Paulo.
Ibrahim, ou Adolphus "Dollar"
Brand, como era conhecido antes
de sua conversão ao islamismo,
em 1968, chegou ao palco de bata
roxa e olhar longínquo. Sentou ao
piano e tocou por uma hora, sem
deixar nenhum vazio entre o final
de um tema e o começo de outro.
Domínio do espaço musical,
aliás, foi uma das grandes qualidades da apresentação do pianista. Escoltado pelo também elegante baixista Beldon Bullock e
pelo competente, ainda que por
vezes ruidoso, baterista George
Gray, Ibrahim mesclou com
maestria as suas intervenções
com os silêncios que vivem dentro de cada música.
Suas raízes jazzísticas ficaram
bastante expostas. Por um lado,
demonstrou a introspecção e a sonoridade angulosa de Thelonious
Monk. Por outro, a matriz melodiosa e suingada de Duke Ellington, mito jazzístico que Ibrahim
não só conheceu pessoalmente
como também acompanhou em
shows e gravações.
Além disso, existe a África do
Sul, de cujo vasto território sonoro o pianista garimpou fascinantes texturas rítmicas.
O espetáculo terminou com
ovação de vários minutos e com o
trio agradecendo como fazem os
mestres orientais: as palmas das
mãos unidas, paradas na altura
do peito, o tronco levemente inclinado para baixo. Jazz com feitio
de oração, do começo ao fim.
A segunda atração do Chivas
Festival só trouxe em comum um
jazz com pluralidade de sotaques.
Mas o território introspectivo de
Abdullah Ibrahim deu lugar aos
padrões extrovertidos do sexteto
do israelense Avishai Cohen.
Considerado ano após ano uma
das grandes revelações do contrabaixo pela revista "Down Beat", o
músico privilegiou o piano, seu
primeiro instrumento, para apresentar um jazz contemporâneo e
rico em variedades sonoras.
Com uma banda multinacional,
com músicos de Cuba, Israel e Argentina -o destacado trompetista Diego Urcola-, Cohen aliou
generosas pitadas latinas a um padrão sonoro movimentado e encrencado, digno de Chick Corea,
pianista com quem vem se apresentando (e com quem já veio ao
Brasil, em 1998).
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