São Paulo, sexta-feira, 24 de maio de 2002

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"UM CASAMENTO À INDIANA"

Premiada em Veneza, Mira Nair destaca "cor local"

Novelão para exportação

TIAGO MATA MACHADO
CRÍTICO DA FOLHA

Tomar uma cerimônia de casamento como microcosmo para dissecar a sociedade de um país não chega a constituir uma idéia das mais originais. O mote é comum a diversas cinematografias, da norte-americana ("Cerimônia de Casamento") à russa ("As Bodas"), da chinesa ("Banquete de Casamento") à brasileira ("O Casamento"). Não apenas o estilo dos autores, mas sobretudo a identidade nacional garantia a cada longa sua originalidade.
Em "Um Casamento à Indiana", a preocupação da diretora Mira Nair em enfatizar as "cores locais" é evidente. Mas elas já não compõem aqui uma identidade nacional. Servem, antes, para enfeitar a indisfarçável celebração da elite globalizada indiana em que se configura afinal o filme.
A princípio, o esfacelamento dessa identidade parece constituir o tema do filme. A diretora revela-se decidida a ressaltar o cosmopolitismo das personagens. As "cores locais" funcionam como fundo, e o fato de Nair não demonstrar senão uma preocupação estética nos previne contra a possibilidade de que a caracterização elitista-globalizada das personagens se reverta numa visão crítica.
Não há conflito nem identidade. Não por acaso, é por demais recorrente em relação aos outros do gênero. Como em "Cerimônia de Casamento", de Robert Altman, velhas (e mal resolvidas) e novas (e furtivas) relações agitam o casamento. Como em "Banquete de Casamento", de Ang Lee, ritos tradicionais se sobrepõem a demandas modernas. Como em "As Bodas", de Pavel Loguine, a evolução da trama se dá em contiguidade com a animação de um evento que coloca em xeque a autoridade de alguns personagens.
Mas não há nem trânsito social (como no filme russo) nem conflito de classe (como em Altman) ou de tradição (como em Lee). Quase tudo é conciliável nesse novelão, produto exportação que atingiu seu objetivo de ganhar o mercado com o inexplicável Leão de Ouro arrebatado em Veneza.
Há dois jovens empregados que servem para confirmar a índole conciliatória da "sociologia" de Nair: admitidos na tenda dos patrões durante a festa, são como "parvenus" a quem é permitida uma discreta e ligeira participação na grande festa da elite global.


Um Casamento à Indiana Monsoon Wedding
  
Direção: Mira Nair
Produção: Índia, 2001
Com: Naseeruddin Shah, Vijay Raaz
Quando: a partir de hoje nos cines Belas Artes, Espaço Unibanco e circuito




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