|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
17ª SP FASHION WEEK
Estilista rasga roupas de papel ao fim do desfile e cria manifesto para discutir consumismo usando o efêmero
Jun Nakao ataca a "fogueira das vaidades" fashion
FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma imagem marcou a São
Paulo Fashion Week, encerrada
anteontem: as 15 modelos do estilista Jun Nakao rasgando as perfeccionistas roupas de papel no final do desfile. Num evento que
cada vez mais reforça o caráter comercial da moda e, para alguns, se
aproxima perigosamente de uma
Fenit, a feira da indústria têxtil,
apontar para o efêmero do vestir-se ganhou marca de manifesto.
"É uma crítica a quem trabalha
sem a consciência do que faz. Há
muita gente que faz moda apenas
por uma questão egocêntrica. O
que acredito é que o artista é capaz de animar, dar alma ao objeto. Mas não vejo mesmo como
uma crítica e, sim, como falar da
responsabilidade de quem trabalha com moda, de escapar da fogueira das vaidades, de fugir da
banalização comum nesse meio.
Por isso, esse trabalho é a valorização da moda", diz Nakao, 37,
em seu ateliê na Vila Mariana.
De acordo com o estilista, contudo, esse desfile é a continuidade
de outras coleções: "É uma evolução do que tenho feito, por isso ele
não pode ser visto separadamente. Eu queria que as pessoas pensassem sobre a impossibilidade
do ter no ciclo do desejo e materializei, de certa forma, a questão
do inatingível ao destruir, para
gerar a falta, o vazio e criar uma
reflexão sobre isso".
Entretanto seria a SPFW o lugar
correto para esse manifesto? "Só
poderia ser lá, pois é onde se concentra o grupo de pessoas que justamente trabalham em torno da
moda, da imagem, do desejo. Se
fosse em outro lugar, soaria pretensioso e, por outro lado, não seria impactante. Eu não imaginava
que o público iria invadir a passarela para pegar partes das roupas,
mas, quando vi o que ocorreu,
percebi que a proposta havia funcionado", afirma.
Com isso, o estilista aproxima-se de obras e performances da arte conceitual, que se utilizam dos
próprios elementos da arte para
questioná-la. "Quis gerar o pensar
de pessoas que já pensam a moda.
Em outras coleções, já apontava
para a linguagem pasteurizada da
moda. Toda revista que abro, tudo o que vejo, é muito pasteurizado. São manuais de como ser estilista. Por isso resolvi ir na contramão, utilizando, por exemplo,
técnicas absurdas de construção,
resgatando tudo o que fosse muito artesanal", continua Nakao.
Mas, inevitável a pergunta, e a
coleção comercial? "Hoje eu penso cada vez menos em produzir,
até pelas dificuldades que temos
enfrentado. Mas há uma tendência, e consigo me encaixar nela,
que é o estilista estar ligado a
grandes grupos. Nem Alexander
McQueen nem Marc Jacobs detêm as marcas deles, elas são produzidas e comercializadas por
empresas com esse perfil. Por
meio de parcerias, consigo viabilizar a manutenção da minha marca. O que tenho buscado mesmo é
me dedicar a projetos especiais
como esse [desfile] e, no início do
ano que vem, numa parceria com
o Masp, a Abit e a Faap, vou fazer
a direção criativa do Instituto Brasil de Arte e Moda, que irá funcionar no Masp Centro."
Texto Anterior: 17ª SP Fashion Week: Na SPFW, o mundo parece um paraíso Próximo Texto: Música: "João Gilberto de saias" se solta no violão Índice
|