São Paulo, sexta-feira, 24 de junho de 2005

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MPB Simoninha busca identidade em Ben Jor

RONALDO EVANGELISTA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

"Vou fazer um show do Jorge sem ser o show do Jorge", diz o cantor Wilson Simoninha em certo momento da entrevista que acompanha seu novo DVD, "MTV Apresenta - Simoninha Canta Jorge Ben Jor". "Um show com a obra do Jorge, mas com a minha cara", completa. Nesse sentido, Simoninha foi bem-sucedido. O show é seu. A única questão que surge é: mas que cara é essa, que ele quer que seja a sua?
Simoninha é fruto inegável da geração Trama -a gravadora que funciona como mãezona de todos os filhos. Lá, todos têm seu espaço e são encorajados a exercer seus talentos. Dentro da Trama, onde todos vêm de berço artístico, parece existir uma idéia pré-definida do que significa ser artista. Fãs-clubes, departamento de moda, o indefectível sorriso no rosto, os pedidos de "olha o coro, rapaziada" de cima do palco: a cartilha gera previsibilidade.
Simoninha sofre problema maior. Sua voz é quase idêntica à de seu pai -mas inferior. A sombra vive lá. Simonal, aliás, é um caso à parte. Talvez o músico/artista mais carismático a já ter aparecido em nosso país tropical, era politicamente incorreto: seu lema era o da pilantragem, sua suposta arrogância, um de seus maiores charmes. Subiu tão alto que a injusta queda foi dolorosa. Simoninha, naturalmente, aprendeu e assimilou, lado bom e ruim. Sua aura de superioridade é evidente, mas o humor irônico passa longe.
Com sua seriedade, impinge formalidade avessa à divertida "Homem da Gravata Florida". Já "Amante Amado", com sua cafonice simpática, funciona bem com a participação de Paula Lima. O talento de Simoninha fica evidente nos detalhes, como ponto de convergência. A seleção musical foge do óbvio, mas não o nega. Os arranjos são o ponto alto: originais, interessantes, espetaculares. Com sonoridade retrô e moderna, utilizam-se de pianos elétricos, guitarras com wah-wah, naipe de sopros, percussão, baixo com groove. Samba-funk, samba-jazz, samba-rock.
Gravado em março na casa de shows paulistana Bourbon Street, o DVD traz Simoninha cantando canções de Ben e Ben Jor das décadas de 60, 70 e 80, como "Agora Ninguém Chora Mais" (65), "Quem Cochicha o Rabo Espicha" (72), "Santa Clara Clareou" (81). As participações especiais abundam: seu irmão Max de Castro, o rapper-sambista Rappin" Hood, o Cidade Negra Toni Garrido, Marco Mattoli, que já virou símbolo de resgate de Ben com seu Clube do Balanço.
Como especial de TV, como produto para fãs de Simoninha, tudo funciona. Como atrativo para os que buscam a fórmula da música brasileira moderna ideal (e não são poucos hoje em dia), nem tanto. Como mais um passo na busca de identidade de Simoninha, provavelmente não.
Seu pai lançou sucessos de Ben, deixou-os com sua cara. Simoninha busca o mesmo, chega perto, mas falta algo mais que bons arranjos, boas idéias, reverência. Falta o que eleva um bom músico, um bom cantor, um bom artista, a uma força cultural: o algo mais, a personalidade, a visão única.
Jorge Ben encontra por sua musicalidade única e genial, mais certa excentricidade. Simonal encontrava pelo cinismo, pelo humor, pelo carisma gigantesco. Simoninha, até agora, encontra apenas pela busca.


MTV Apresenta - Simoninha Canta Jorge Ben Jor
  
Artista: Simoninha
Lançamento: Trama
Quanto: R$ 49, em média


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