|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FÁBIO DE SOUZA ANDRADE
Em casa, com Drummond
Redescobrimos como a inteligência e a sensibilidade sempre disputaram a primazia na lírica do autor
A COMPANHIA da poesia drummondiana não é novidade na
caminhada crítica de Alcides
Villaça, professor titular de literatura brasileira na Universidade de São
Paulo, que, aos 30 anos, há exatos 30
anos, defendia uma dissertação de
mestrado, ainda inédita, sobre esse
autor.
Hoje, "Passos de Drummond",
exame abrangente dos "caminhos
históricos e estéticos percorridos
pelo poeta", reúne os melhores frutos desta longa convivência, vivida
sob o signo de uma paradoxal combinação entre "proximidade afetiva
e distância crítica".
A fórmula, precisa, descreve o movimento que enlaça o poeta mineiro
ao mundo, mas vale também para a
natureza do vínculo, persistente e
nada apressado, entre aquela poesia
e a escrita deste apurado leitor.
Trata-se de uma paciência crítica,
contudo, que não abdica de tensão,
mas se revela o análogo da poesia inquieta que investiga. De ensaio a ensaio, seguindo as marcas do tempo e
da experiência na expressão do poeta, somos levados a redescobrir, nas
admiráveis análises de poemas-chave ("Poema de Sete Faces", "O Elefante", "A Máquina do Mundo" ou
"Coleção de Cacos", por exemplo),
distribuídos desde a estréia até a publicação póstuma, como a inteligência e a sensibilidade sempre disputaram, dramaticamente, a primazia na
lírica do autor.
O eixo de investigação não é inédito: entronca na tradição das melhores respostas à poesia de Drummond, desde Mário de Andrade. A
novidade aqui está na conjunção entre uma obsessiva busca pelo específico, jamais descolada do texto e suas
ressonâncias simbólicas, e uma visada própria e meditada, que não hesita em tomar partido nem desiste de
examinar a obra em seu arco total.
Sua leitura nunca é avulsa.
Assim, em "Primeira Poesia", desde logo um dos pontos altos do volume, palmilhando o "Poema de Sete
Faces", consegue a um só tempo dar
inédito lastro ao surrado lugar-comum gauchismo do poeta, discutir a
adesão reticente de Drummond ao
nacionalismo embutido no pacote
modernista, além de evidenciar, já
em "Alguma Poesia", a presença discreta de veios importantes da lírica
posterior.
Da estréia à poesia engajada da década de 40, Villaça defronta-se com
poema igualmente célebre e estudado, "O Elefante", figuração do encontro hostil entre o artista e o mundo moderno, em que a "problemática construção [dos mitos] entre os
alaridos e a reificação geral" ganha
formulação drummondiana exemplar.
Como no caso de "A Máquina do
Mundo", núcleo do ensaio seguinte,
dedicado à dita guinada classicizante do poeta, a afirmação enfática da
aposta drummondiana na integridade (ainda que precária) responde
pela riqueza e singularidade de sua
interpretação.
Não se poderia esperar menos de
crítico tão agudo e discreto, completamente em casa entre os versos de
Drummond.
PASSOS DE DRUMMOND
Autor: Alcides Villaça
Editora: Cosacnaify
Quanto: R$ 45 (146 págs.)
Texto Anterior: Mônica Bergamo Próximo Texto: Olhar feminino dá qualidade à literatura policial Índice
|