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MÚSICA
Atrações famosas e novas apostas do cenário pop se revezam em evento marcado por organização e publicidade
Marketing domina festival inglês V2001
ROGÉRIO SIMÕES
FREE-LANCE PARA A FOLHA, DE CHELMSFORD
"Compre seu ingresso para o
V2001 e vá pela Virgin Trains. E
ouça ainda, na rádio Virgin, os sucessos das bandas do festival, que
tem patrocínio exclusivo dos telefones celulares Virgin Mobile."
As palavras não eram as mesmas, mas o recado era exatamente esse. Em um ano em que não
houve Glastonbury, o mais "legítimo" dos festivais britânicos, o
V2001, da Virgin, marcou no último fim de semana o domínio do
marketing nos festivais de música
do Reino Unido.
A festa comandada pelo império do empresário Richard Branson é realizada desde 1995, sempre em duas cidades, moda que,
aliás, foi a Virgin quem lançou.
Em Straffordshire e Chelmsford,
artistas como Foo Fighters, Coldplay, The Charlatans, Placebo, Texas e Kylie Minogue cantaram para multidões espalhadas por quatro palcos diferentes, num evento
cuja organização, se não foi impecável, merece pelo menos nota 8.
Em Chelmsford, quem chegasse
de trem à cidade não precisava
andar a pé até o Hylands Park
nem pegar carona. Um serviço de
ônibus, bom e gratuito, foi colocado para os fãs, que calmamente
formavam filas e eram levados
tanto na ida como na volta. Nada
daquelas cenas de jovens pedindo
carona na beira da estrada.
Em qualquer festival, o tempo é
sempre a grande incógnita. E,
quando ele não é dos melhores, o
dinheiro pago pelo ingresso começa a valer. Em Chelmsford, no
sábado, choveu. Foi apenas no final da tarde, mas choveu muito.
Apesar disso, nada da lama do
Glastonbury ou do Rock in Rio. A
Virgin sempre cobre o espaço
central ocupado pelo público com
uma capa de plástico, o que deixa
o local bem mais agradável.
A lista de artistas do V2001 costuma ficar no meio-termo: não
traz aquela constelação de estrelas
do Reading, mas consegue oferecer alguns nomes bem conhecidos. Neste ano, Coldplay, Foo
Fighters, Texas e The Charlatans
estavam nessa categoria. Mas
também havia artistas "menores", que estão começando brilhantes carreiras, como o maravilhoso Starsailor, o já reconhecido
Doves, o promissor JJ72, The
Avalanches, Sparklehorse, Ian
Brown, as abomináveis meninas
do Atomic Kitten etc.
Entre os grandes, Coldplay fez
bonito e emocionou com "Don't
Panic", "Trouble", a nova "In My
Place" e, logicamente, "Yellow".
Ao que parece, os britânicos finalmente encontraram um substituto para o Queen: apesar de suas
canções intimistas, o Coldplay é
uma banda perfeita para grandes
shows ao ar livre.
Estrelas e promessas
O fantástico Charlatans fez um
show impecável, como sempre,
em que não faltaram as gloriosas
"The Only One I Know", "North
Country Boy" e "Just Looking". Já
o Texas, outra banda que fora da
Europa todo mundo ignora, mas
que no Reino Unido vive no topo,
mostrou que não passa de um
pop sem sal. E o tão falado Muse
disparou sua barulheira sem-pé-nem-cabeça que não leva a lugar
nenhum. Simplesmente terrível.
Outra vergonha foi a graciosa
Nelly Furtado, dona de um rostinho lindo e uma voz insuportável.
Nem em "I'm Like a Bird" a esforçada canadense funcionou. Seu
show foi um indicativo de que era
melhor procurar algo de bom entre os artistas menos conhecidos.
E foi no menor palco que se apresentaram duas grandes promessas da música britânica em 2001.
Peppercorn, que não é uma
banda, mas uma cantora bonita,
simpática e de tranças quilométricas, exibiu uma ótima voz em
meio a uma combinação inspirada de soul e rock. Nascida no Saara Ocidental, de família negra e
pobre, ela vive em Londres desde
criança e lançou neste ano seu primeiro álbum, "Free Love".
O Zero Seven foi uma das melhores coisas do V2001. Combinando música eletrônica com
soul e blues, essa dupla de músicos ingleses, chamada por muitos
de Air britânico, levou ao palco
um cantor e várias cantoras, numa apresentação maravilhosa.
A exposição de produtos e suas
marcas chegou para ficar no
mundo do pop britânico. O maior
festival do ano até então, o T in the
Park, realizado na Escócia, não se
chama T por acaso. A letra refere-se à cerveja escocesa Tennent's,
patrocinadora do evento.
"Ah, mas ainda existe Reading!", alguém pode argumentar.
Sim, o festival de Reading, que
acontece no próximo fim de semana, é o mais antigo do país,
nascido nos anos 60. Mas desde
1999 não é mais apenas o "Festival
de Reading".
O tradicional evento agora não é
nada mais do que 50% do Carling
Weekend, evento dividido entre
duas cidades, Leeds (norte da Inglaterra) e Reading (sul). Carling,
para quem não sabe, é a cerveja
inglesa que abastece nove entre
dez festivais britânicos.
Desses eventos, o V2001 é, sem
dúvida, o mais contaminado pelo
marketing. No Brasil, os festivais
(com exceção do Rock in Rio)
têm no seu nome marcas de cigarro ou cerveja. Mas, entre os britânicos, quanto mais tradição, melhor. É por isso que, a dez meses
do próximo Glastonbury, muita
gente já sonha com o festival (Rod
Stewart foi o primeiro "confirmado"). Afinal, Glastonbury, desde
1970, não é Coca-Cola Glastonbury. É apenas Glastonbury.
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