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ANÁLISE
Faltam mecanismos para a lisura na TV
ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA
A suspensão do "Domingo
Legal" (SBT) cria um precedente favorável ao desenvolvimento, urgente, de mecanismos
democráticos de controle das
concessões públicas de televisão.
Os advogados de defesa do SBT,
assessorados pelo presidente da
OAB, procuram caracterizar a
ação do Ministério Público como
censura. Não sou jurista, nem a
favor da censura, mas creio que a
aversão ao autoritarismo não justifica compactuar com o rompimento recorrente dos princípios
mais elementares de responsabilidade pública que deveriam guiar
emissoras de TV.
Não é a primeira vez que a veracidade de depoimentos divulgados em programas do SBT é questionada. Pedidos públicos de desculpa pela prática ilícita de "pegadinhas" reais parecem estar se
tornando a regra na emissora, a
começar por Silvio Santos.
A cobertura policial é área propícia ao noticiário enganoso. Ironicamente, na TV, como no rádio,
o "jornalismo verdade" se esmera
em romantizar narrativas criminais. Nisso Gil Gomes é imbatível.
Não por acaso o radialista está de
volta ao SBT, apresentando verdadeiros clipes de suspense melô
no meio da tarde no "Falando
Francamente" -entre uma programação infantil e outra.
Mas aqui não há disfarce. O narrador fala de frente para a câmera.
Sua interpretação fantástica de intrincadas tramas permeadas pela
subjetividade dos diversos personagens é explícita.
As imagens produzidas para
ilustrar os casos não têm som. Os
personagens se movimentam
olhando uns para os outros, como
na ficção mais clássica. Não ouvimos sua voz. Só conhecemos a interpretação do narrador onipresente. Até ações de espíritos têm
espaço nesses relatos fictícios.
O estilo "over" desse policial
convencional é diferente da mentira naturalista encenada no programa do Gugu. O incidente que
gerou o atual debate impressiona
pela prepotência.
Só quem acredita que "o céu é o
limite" se aventuraria a cutucar
com vara curta a um só tempo o
PCC e os três poderes da República. O grupo criminoso certamente não curtiu a apropriação indevida de imagem (só faltava entrar
com ação por danos morais).
O Judiciário, o Executivo e o Legislativo abrem processos investigativos que, esperemos, tenham
desdobramentos punitivos reais
-um pouco como os casos desvendados por Gil Gomes.
Será que o Brasil precisa de Gugus? A suspeita de depoimento
falso aparece como a ponta de um
iceberg intolerável.
Emissoras de TV são estratégicas. Como qualquer atividade
econômica, pública ou privada,
deveria se submeter a avaliações e
auditorias periódicas. E a pena
pela transgressão deve ser a censura econômica, essa eficaz.
Faltam mecanismos que garantam aquela lisura básica.
Esther Hamburger é antropóloga e
professora da ECA-USP
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