São Paulo, sexta-feira, 24 de setembro de 2004

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"A GRAND DON'T COME FOR FREE"

Poeta juvenil, Mike Skinner conta histórias de adolescentes comuns

THIAGO NEY
DA REDAÇÃO

Com o primeiro disco, ele foi comparado a William Blake. Agora vem o segundo, e ele ganha a alcunha "Shakespeare para clubbers". A imprensa do Reino Unido, parece, não sabe o que fazer com Mike Skinner, 25.
The Streets é o nome do projeto de Skinner, que, desde a sua estréia, em 2002, com "Original Pirate Material", vem sendo incensado como poeta e/ou porta-voz de uma certa juventude britânica.
O álbum possuía canções que, menos do que letras, eram histórias sobre o cotidiano de um garoto que freqüenta bares, fuma, bebe, toma foras de várias garotas, encontra o ecstasy, ganha pouco, come fast food... Basicamente, como vive grande parte dos adolescentes britânicos (e de um monte de outros lugares do mundo) de classe média.
Skinner não cantava; suas aventuras saíam de sua voz num ritmo quase falado, que se encaixava com a música, de batidas quebradas, com um pouco de rap, um pouco de drum'n'bass, o que ficou conhecido como UK garage.
O disco, que havia sido todo ele produzido num quarto da casa de Skinner, chegou ao 18º lugar na parada britânica e vendeu, apenas ali, mais de 500 mil cópias.
Se não foi um estouro comercial, "Original Pirate..." rendeu, além de capas de jornais e revistas, dinheiro suficiente para o cantor melhorar a vida que ele expunha em suas letras. E aí, durante as gravações de "A Grand Don't Come for Free", surgiram dúvidas de quais tipos de histórias o endinheirado Skinner iria contar.
Bem, o disco chegou -também ao Brasil e também produzido no mesmo quarto- e traz a mesma temática de seu antecessor, agora tendo como protagonista um jovem que ainda leva aquela mesma vida, mas que também aluga DVDs e troca mensagens de celular com amigos e namoradas.
Dá até para dizer que "A Grand Don't Come..." é um álbum conceitual. Suas 11 canções se desenvolvem a partir da primeira faixa, "It Was Supposed to Be So Easy", em que um garoto esquece mil libras em cima de sua TV quebrada, e o dinheiro desaparece.
O segredo de Skinner não está nas situações descritas em suas letras (tem um monte de gente que canta sobre desilusões amorosas, sobre não ter muita grana), mas no modo como ele transporta isso para os hábitos de um garoto normal: essas desilusões aparecem através de mensagens de celulares; não tem muita grana para gastar em clubes da moda ou para comprar jogos de Playstation.
Isso está logo em "It Was Supposed...", quando Skinner se lembra de ter que devolver um DVD em tempo para não pagar a multa, mas ele falha, pois não conseguiu arrumar dinheiro.
Depois ele narra o encontro com uma garota que conheceu num clube no sábado passado ("Could Well Be in").
Em seguida, como ele perde dinheiro apostando em jogos de futebol ("Not Addicted").
E vem uma nova ida ao clube, agora com um olho no celular, esperando um sinal de vida dos camaradas que ainda não chegaram e que provavelmente não vão aparecer ("Blinded by the Lights").
E isso são apenas as quatro primeiras músicas do disco.
"Fit But You Know It" foi a faixa escolhida como o primeiro single. É a mais dançante e a mais pop, e traz um Skinner que, numa lanchonete, decidindo se pede hambúrguer ou batatas fritas, encontra uma garota linda: "Você merece [nota] 8 ou 9/ Talvez até um 9,5, depois de quatro cervejas". Em "Get Out of My House", um drum'n'bass lento, ele discute com a namorada. Ela reclama que ele não está por perto; ele diz que não é bem assim, que ele tinha coisas para fazer.
Em "Dry Your Eyes" Skinner mostra que, sim, tem coração quando vê seu relacionamento arruinado: "E eu estou ali, parado/ Não consigo dizer nenhuma palavra/ Pois tudo se foi/ Eu não tenho nada/ Absolutamente nada".
Cara que não é poeta, mas que sabe como ninguém costurar histórias em suas letras, Mike Skinner não dá espaço para respirar.


A Grand Don't Come for Free
    
Artista: The Streets
Lançamento: Warner
Quanto: R$ 35, em média



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