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"ASSIM FALAVA LAMPIÃO"
Nordeste ganha tradutor de sua língua
VANDECK SANTIAGO
da Agência Folha, em Recife
Quando um nordestino diz que
que alguém é "um cara arrombado", acredite: ele está fazendo um
elogio. Caso ele diga que gosta de
"chupa-chupa", não significa nada
que não possa ser feito diante de
crianças. E, se ele falar "e priu!", favor não insistir, porque a conversa
está encerrada.
As definições dessas e de outras
2.497 expressões estão no primeiro
dicionário de "nordestês" publicado no Brasil, obra que traz o significado de expressões típicas da linguagem dos nordestinos. O livro
será lançado hoje, em Recife (PE),
pela editora paulista Estação Liberdade.
O lançamento em São Paulo
acontecerá em 1º de outubro, no
teatro Brincante (r. Purpurina,
468, Vila Madalena).
"Assim Falava Lampião", título
do livro, é uma pesquisa de três
anos do jornalista pernambucano
Fred Navarro, 42.
Ele coletou as palavras pesquisando outros dicionários e 34 livros de autores nordestinos. A música nordestina também serviu de
fonte. Navarro usou o trabalho de
27 músicos, como Jackson do Pandeiro e Luiz Gonzaga. O autor contou ainda com a ajuda de colegas
da região e, como ele diz, "da própria memória".
Nascido em Recife, ele mora há
13 anos em São Paulo. "É um trabalho que só poderia ser feito de fora
da região, numa espécie de exílio,
porque, estando no Nordeste, essas expressões soam como rotina."
Para quem é de outra região, a
quase totalidade dos nomes e expressões é incompreensível -e,
nesse sentido, afirma o autor, o livro é também uma "tradução" do
linguajar nordestino.
"Arrombado", por exemplo, significa um bom sujeito. "Chupa-chupa" é uma laranja descascada
da qual se tira o tampo. "E priu!" é
uma expressão utilizada para dizer
que o assunto está encerrado.
Navarro diz que só incluiu no livro as palavras que tiveram a origem e o sentido checados. "Azoretar" (perturbar), por exemplo, palavra muito usada no Nordeste, é
de origem mineira, constatou.
Quase metade do material coletado (como termos muito chulos e
denominações de pássaros e plantas) ficou de fora.
Para fazer a seleção, o autor disse
que levou em conta dois outros critérios: o de o termo ser de uso corrente e a palavra, "saborosa".
Nomes e expressões picantes,
igualmente, tiveram lugar garantido. Pênis ("prativai") e vagina ("a
perseguida") têm, por exemplo,
dezenas de significados.
Masturbação chama-se "gloriosa" (mas só se for de muito boa
qualidade; caso não seja lá essas
coisas, então é "pelar o sabiá" ou
"tocar safira"). Sexo entre lésbicas,
"fazer sabão".
Dicionários de expressões estaduais já existem em pelo menos
dois Estados do Nordeste: Pernambuco ("Minidicionário de Pernambuquês", de Bertrando Bernardino) e Bahia ("Dicionário de
Baianês", de Nivaldo Lariú).
Obras específicas de termos da
região, também (como "Os Mistérios do Faz-Mal", do pernambucano Mário Souto Maior).
"Assim Falava Lampião" é um
passo adiante nessa área, com uma
abrangência geograficamente
mais ampla.
O livro é enriquecido ainda por
ilustrações de J. Borges e tem apresentações do músico baiano Tom
Zé e do ator e músico pernambucano Antônio Nóbrega.
"O livro é a compilação mais
completa de que tenho notícia sobre a contínua reinvenção que o
povo brasileiro, especialmente o
nordestino, vem fazendo da língua
que falamos", afirma Nóbrega.
"Quem inventa tais palavras é
um povo que brota e floresce",
afirma Tom Zé.
²
Livro: "Assim Falava Lampião"
Editora: Estação Liberdade (tel. 011/3824-0020)
Lançamento: hoje, às 19h
Onde: União Brasileira de Escritores - Secção
Pernambuco (r. Santana, 202, Recife)
Quanto: R$ 20 (no lançamento); R$ 25 (nas
livrarias)
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