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21ª MOSTRA DE CINEMA
Ambiguidade marca "A Vida de Jesus", do estreante Bruno Dumont
CÁSSIO STARLING CARLOS
Editor-adjunto de Especiais
"A Vida de Jesus", filme de estréia do francês Bruno Dumont,
constrói seu principal interesse a
partir de idéias ambíguas.
A mais óbvia delas está no título.
Contrariando expectativas, não se
trata aqui de um filme religioso
nem de uma versão, factual ou
simbólica, da história de Jesus. Em
seu lugar, "A Vida de Jesus" oferece um drama realista e seco sobre personagens quase destituídos
de espessura humana.
De fato, o filme narra a vida sem
graça de cinco adolescentes tardios, no norte da França. Desempregados, eles gastam o tempo
passeando de moto, adestrando
passarinhos e assistindo TV.
Talvez para ludibriar a platéia,
em busca de um Jesus, mesmo que
simbólico, o diretor Dumont dá
mais atenção à existência morna
de Freddy, um dos rapazes.
Freddy sofre de epilepsia, mora
com a mãe, namora Marie -a
única personagem que sugere vínculos bíblicos, mas esses se resumem a seu nome- e vive entediado, sentimento agravado pelos frequentes exames hospitalares.
A primeira impressão que se tem
dos rapazes é de um certo humanismo, decorrente de uma das cenas iniciais, que mostra uma visita
ao irmão de um dos companheiros, paciente terminal de Aids.
Daí em diante, porém, o diretor
intensifica a ambiguidade. As situações que se seguem vão configurar os personagens do grupo,
Freddy à frente, como antipáticos.
A principal delas mostra a reação
racista do grupo à presença de um
garoto árabe na cidade. O tema da
intolerância passa, então, ao centro da narrativa. Em consequência
do interesse do árabe por Marie, o
grupo se articula para promover a
vingança, que culmina com a eliminação do indesejado.
Como "A Vida de Jesus" não
chega a ser enfático sobre o problema da intolerância, o diretor foi
acusado de "ideologia suspeita".
Sua ambiguidade, contudo, mesmo na cena final, não chega ao
ponto de justificar a intolerância.
Apesar de, às vezes, parecer não
ter o que dizer, "A Vida de Jesus"
é um filme que tem forças. A mais
evidente é o domínio que Dumont
demonstra do uso da linguagem
realista, direta, sem efeitos grandiloquentes.
O uso da tela larga, por sua vez,
acentua o efeito de abandono daqueles seres, além de dar oportunidade para Dumont filmar os corpos de uma maneira crua, brutal,
escassa no cinema hoje.
Abandonando grandes significados, profundos ou superficiais,
Dumont se afirma em seu filme de
estréia como uma boa promessa.
Onde: hoje, às 21h50, no Vitrine
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