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CRÍTICA
Pai do Brasil "moderno"?
DO ENVIADO AO RIO
O painel que "Bastidores"
traça da vida de Cauby Peixoto é útil e importante menos
para biografá-lo que para redimensionar o significado incômodo guardado há 50 anos (e até hoje) numa das figuras mais esdrúxulas deste país tropical.
Em primeiro lugar, fica do livro
(apesar da excessiva paixão que o
autor faz transbordar de seu passeio pela vida do artista) a noção
(bastante plausível) de que Cauby
foi um dos maiores cantores brasileiros de todos os tempos, mas
aprisionado num repertório que
não tinha direção alguma.
Cauby cantava o que lhe passasse pela frente, fosse no espírito
mais cool do jazz ou da mais deslavada cafonice. Tudo isso sempre
coube num jarro só e está presente até em discos que o livro defende como essencialmente "chiques", como "Cauby! Cauby!"
(80), que promoveu a inusitada (e
incomum) renascença de um dos
muitos artistas "antigos" que haviam sido soterrados por sucessivas avalanches (bossa nova, jovem guarda, tropicália).
Viajando entre os dois extremos, ele era a improbabilidade, e
provou o impossível: existia. Daí
vêm as grandes revelações de
"Bastidores", que o tom às vezes
simplório do livro não prejudica.
O que se esqueceu sobre Cauby
é que ele foi um ídolo de massa,
um beatle, um Michael Jackson,
um menudo, guardadas todas as
proporções. Mais que isso, peitava corajosamente, já em 54, a encrenca de sua sexualidade, er,
pouco convencional.
Hoje se sabe que Juscelino Kubitschek e a bossa nova modernizaram o Brasil no final dos anos
50, e todo mundo se lembra da
convulsão sexual que Ney Matogrosso e seus Secos & Molhados
causaram no Brasil dos anos 70.
Ironicamente, andava esquecido que em algum nó entre a construção de Brasília e o desbunde
embalado por tortura e assassinato houve um pioneiro colorido,
caricatural, talvez o pai meio ridículo de muito do que houve de
transformação comportamental e
cultural no Brasil "moderno".
"Bastidores", com excessos e
descuidos, pode até parecer livro
de fofoca malcontada. Mas trazer
à tona esse pedaço incômodo do
passado recente do Brasil é mérito
para ninguém botar defeito.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Bastidores - Cauby Peixoto - 50 Anos da Voz e do Mito
Autor: Rodrigo Faour
Editora: Record
Quanto: R$ 49 (506 págs.)
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