São Paulo, Sexta-feira, 24 de Dezembro de 1999


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CINEMA

Nas telas, os clichês que nunca morrem

FERNANDO MORGADO
especial para a Folha

O homem foge do assassino, que o alcança e o mata violentamente. De repente, o morto acorda, tudo não passou de pesadelo, senta-se abruptamente na cama, de frente para a câmera, suando e assustado.
Melhor é a perseguição de carros em alta velocidade, por ruas e becos da cidade. Subitamente, surge do nada, de uma rua transversal, um grande caminhão, o choque é inevitável, o mocinho mal tem tempo de se desviar, mas evita o desastre.
Clichês cinematográficos como esses, hoje, além da tela, se tornaram atração em livros, revistas e na Internet, onde um dos maiores especialistas é Giancarlo Cairella, que reuniu centenas deles, por conta própria e com ajuda de colaboradores de todo o mundo.
Seu site, chamado "The Movie Cliches List", www.moviecliches.com (leia texto abaixo), é motivo de constante delícia para fãs de cinema e navegadores, constrangimento e, com certeza, inspiração para os roteiristas de cinema. Mesmo porque, para usar um dos mais antigos, nesta vida, nada se perde, tudo se repete. Mas há muitos outros.
Há o do garoto de 11 anos, que sabe tudo sobre computadores e consegue salvar o mocinho e o mundo da destruição, acessando nos últimos segundos um site inacessível a qualquer ser adulto normal. Ah, não, esse é gasto, não tem graça.
Melhor ainda é o do herói que, no turbilhão da metrópole, consegue pegar um táxi a qualquer hora do dia ou da noite, a não ser se estiver sendo perseguido por bandidos, quando então nada consegue e é obrigado a fugir a pé.
E que tal a luta de esgrima, e de morte, entre herói e vilão? De repente, as armas se encostam, os dois ficam frente a frente, olho no olho, o rival solta uma frase de efeito, a do mocinho é bem mais divertida, então vem o golpe final e o bandido cai morto. Todos esses são velhos demais, o melhor de todos mesmo ainda é o do...
Se tudo isso parece bastante familiar, não estranhe, você já viu, e continuará vendo, dezenas, centenas de vezes mais. São os clichês do cinema, sem os quais Hollywood e qualquer filme que se preze não conseguiriam sobreviver.
São situações clássicas, conhecidas, repetidas, gastas, renovadas ou recauchutadas, constantemente recriadas pelos roteiristas, como se consultassem um antigo, secreto e grosso manual com todos os clichês catalogados por assunto. Basta escolher o tema e o clichê mais adequados e encaixar no filme.
Pode ser até que exista tal manual de clichês à disposição dos escritores de cinema. De certa maneira, ele seria útil apenas como obra de referência, porque clichês estão em toda a parte, à disposição de todos, centenas, dezenas, milhares deles, na mente do espectador, em livros, revistas e, naturalmente, nos filmes. E não é de hoje, eles surgiram há um século, com o cinema.
Modernamente, o crédito maior deve ir para a revista "Mad", a primeira a fazer dos clichês do cinema uma arte, saborosa e impagável arte, de sátira e criatividade. E quando seus escritores e artistas acharam que os clichês que satirizavam estavam...
Bem, virando velhos clichês, inverteram as situações, criando os "anticlichês", ou seja, o outro lado deles. Um exemplo é o do namorado que consola a namorada, gravemente doente na cama, e diz: "Agora durma, querida. Amanhã, as coisas ficarão ainda piores para você". Ou o do velho pioneiro do Oeste, para o neto: "Quando chegamos aqui, muitos anos atrás, esta terra não passava de um vasto deserto. Agora, olhe para ela, conseguimos destruí-la mais ainda".


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