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CINEMA
Nas telas, os clichês
que nunca morrem
FERNANDO MORGADO
especial para a Folha
O homem foge do assassino,
que o alcança e o mata violentamente. De repente, o morto acorda, tudo não passou de pesadelo,
senta-se abruptamente na cama,
de frente para a câmera, suando e
assustado.
Melhor é a perseguição de carros em alta velocidade, por ruas e
becos da cidade. Subitamente,
surge do nada, de uma rua transversal, um grande caminhão, o
choque é inevitável, o mocinho
mal tem tempo de se desviar, mas
evita o desastre.
Clichês cinematográficos como
esses, hoje, além da tela, se tornaram atração em livros, revistas e
na Internet, onde um dos maiores
especialistas é Giancarlo Cairella,
que reuniu centenas deles, por
conta própria e com ajuda de colaboradores de todo o mundo.
Seu site, chamado "The Movie
Cliches List", www.moviecliches.com (leia texto abaixo), é
motivo de constante delícia para
fãs de cinema e navegadores,
constrangimento e, com certeza,
inspiração para os roteiristas de
cinema. Mesmo porque, para
usar um dos mais antigos, nesta
vida, nada se perde, tudo se repete. Mas há muitos outros.
Há o do garoto de 11 anos, que
sabe tudo sobre computadores e
consegue salvar o mocinho e o
mundo da destruição, acessando
nos últimos segundos um site inacessível a qualquer ser adulto normal. Ah, não, esse é gasto, não
tem graça.
Melhor ainda é o do herói que,
no turbilhão da metrópole, consegue pegar um táxi a qualquer
hora do dia ou da noite, a não ser
se estiver sendo perseguido por
bandidos, quando então nada
consegue e é obrigado a fugir a pé.
E que tal a luta de esgrima, e de
morte, entre herói e vilão? De repente, as armas se encostam, os
dois ficam frente a frente, olho no
olho, o rival solta uma frase de
efeito, a do mocinho é bem mais
divertida, então vem o golpe final
e o bandido cai morto. Todos esses são velhos demais, o melhor
de todos mesmo ainda é o do...
Se tudo isso parece bastante familiar, não estranhe, você já viu, e
continuará vendo, dezenas, centenas de vezes mais. São os clichês
do cinema, sem os quais Hollywood e qualquer filme que se preze não conseguiriam sobreviver.
São situações clássicas, conhecidas, repetidas, gastas, renovadas
ou recauchutadas, constantemente recriadas pelos roteiristas,
como se consultassem um antigo,
secreto e grosso manual com todos os clichês catalogados por assunto. Basta escolher o tema e o
clichê mais adequados e encaixar
no filme.
Pode ser até que exista tal manual de clichês à disposição dos
escritores de cinema. De certa
maneira, ele seria útil apenas como obra de referência, porque clichês estão em toda a parte, à disposição de todos, centenas, dezenas, milhares deles, na mente do
espectador, em livros, revistas e,
naturalmente, nos filmes. E não é
de hoje, eles surgiram há um século, com o cinema.
Modernamente, o crédito
maior deve ir para a revista
"Mad", a primeira a fazer dos clichês do cinema uma arte, saborosa e impagável arte, de sátira e
criatividade. E quando seus escritores e artistas acharam que os clichês que satirizavam estavam...
Bem, virando velhos clichês, inverteram as situações, criando os
"anticlichês", ou seja, o outro lado
deles. Um exemplo é o do namorado que consola a namorada,
gravemente doente na cama, e
diz: "Agora durma, querida.
Amanhã, as coisas ficarão ainda
piores para você". Ou o do velho
pioneiro do Oeste, para o neto:
"Quando chegamos aqui, muitos
anos atrás, esta terra não passava
de um vasto deserto. Agora, olhe
para ela, conseguimos destruí-la
mais ainda".
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