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"ADORÁVEL JULIA"
István Szabó se perde no tema
teatral e no louvor à protagonista
PAULO SANTOS LIMA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O teatro cai como uma luva
em filmes sobre personagens em crise existencial e às voltas com seus fantasmas e chiliques, permitindo uma aproximação (inclusive física, por meio da
câmera) com as idiossincrasias do
protagonista. É assim em "Adorável Julia", de István Szabó, que usa
o mundo do tablado para acompanhar fielmente sua atriz.
Um problema, porque temos
uma adesão irrestrita do filme à
egocêntrica Julia (Annette Bening), atriz notável, mas agressiva, que leva sempre o "acting" dos
palcos para a vida, com marido,
filho e amigos. Não só, anda enfastiada do casamento com Michael (Jeremy Irons), e a crise da
meia-idade a faz acreditar que seu
corpo está desmoronando. Insuportável, esta é a palavra para definir Julia.
Daí que esta mulher acaba se
envolvendo com um jovem fã,
Tom (Shaun Evans), que, descobriremos à frente, é um aproveitador. Surge ainda uma pragmática
(e jovem) atriz que lança charme
aos homens do filme, pedra no sapato de Julia, que arquitetará justiça e volta por cima.
O filme coloca, então, sua afetada protagonista acima de todos,
justificando assim a pequenez
egoísta de Julia. Algo recorrente
na filmografia de Szabó, aliás, que
jamais foi brechtiano na composição de seus personagens. Não é
por menos que os homens de
"Coronel Redl" e "Mephisto", por
exemplo, jamais tiveram suas
ações postas em juízo.
A falta de pudor na babação à
sua protagonista é acompanhada
pelo típico estilo anêmico de Szabó filmar. Quase tão tímido quanto alguns filmes sonoros do início
dos anos 30 (aliás, a história se
passa na Londres de 1938), "Adorável Julia" trabalha com plano
aberto que, logo depois, fecha-se
nos closes alternados. Na ausência de um trabalho mais elaborado com as imagens, o tema teatral, parece, fez Szabó não se acanhar com o excesso de falatório.
Aí que a referência imediata seja
"A Malvada". E seu oposto: também sobre o mundo teatral, e com
atriz temperamental, este clássico
de Joseph L. Mankiewicz vê glamour na Eve de Bette Davis, mas
não abandona certo cinismo. O
filme deixa claro, desde sempre:
Eve é maravilhosa mas também
uma chata de galocha. Porque se o
tema do filme é a atriz, há uma
multiplicidade de olhares (e juízos) de uma câmera que segue
não poucos personagens, todos
eles falando sobre Eve, e com um
texto tão espetacular, tão além do
nosso prosaico, que nos causa
certo distanciamento.
Mankiewicz é brechtiano no
uso da linguagem cinematográfica enquanto a câmera de Szabó
opta por um caminhar menos
moderno, mais fiel a um olhar
único sobre a protagonista. O que
faz lembrar de outro personagem
e filme, o borra-botas de "O Conformista", de Bertolucci, que vende a alma à segurança, mesmo
que a do fascismo.
Adorável Julia
Being Julia
Direção: István Szabó
Produção: Inglaterra/Canadá/EUA/
Hungria, 2004
Com: Annette Bening e Jeremy Irons
Quando: a partir de hoje no Lumière,
Top Cine e circuito
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