São Paulo, sábado, 25 de abril de 2009

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LIVROS

Memória

Meschonnic defendia entendimento da poesia

JERUSA PIRES FERREIRA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Jornais franceses e do mundo inteiro, amigos e estudiosos do pensador singular prestam homenagem a Henri Meschonnic. Nascido em Paris em setembro de 1932, morreu no último dia 8 de abril, após conviver com a leucemia, o que não o impediu de exercitar sua criação, produzir trabalhos e oferecer o legado de seu pensamento crítico e poético.
Teórico da linguagem, da literatura e da tradução, foi um dos fundadores do Centro Experimental de Vincennes, professor em Paris 8 e fundou uma linha de trabalho que veio a ser a escola doutoral das "disciplinas do sentido".
Tradutor do Antigo Testamento, fez dos estudos bíblicos um campo de experimentação e descoberta poética. A partir dessa experiência nos passou sua lição magistral, apontando a Europa como o continente da tradução. Tendo participado da aventura estrutural, passou a combater os estruturalismos em apogeu na França nos anos 70. Judeu, conduziu uma batalha contra o pensamento de Heidegger e severos ataques contra a poesia francesa contemporânea e a ideia de uma clareza do espírito francês.
Tendo Wilhelm von Humboldt e depois Emile Benveniste como mestres e inspiradores, importava-lhe a complexidade dos textos poéticos. Contra uma ciência da tradução ou da tradutologia instala, ao contrário, a ideia de um laboratório de experiência e discussão de linguagens, em que se posiciona contra a modéstia e o apagamento, a favor da audácia.
Ao traduzir com Suely Fenerich "La Poétique du Traduire" ("A Poética do Traduzir", a sair pela Perspectiva), pude perceber todo um movimento de luta interna, um discurso crítico e combativo ativado, até para discutir repercussões na imprensa, mal-entendidos e teorias que ele critica. Propõe uma antropologia histórica da linguagem, incluída nas noções de discurso e de poética, diante de fenômenos como a descolonização e a globalização cultural.
Apoiando-se no tripé ética, poética e política, vai conduzindo uma posição por sua extensa obra (traduções, ensaios e poemas) dando o subtítulo "Antropologia Histórica da Linguagem" à série que chamou "Para a Poética". Contido, polêmico, preciso e extenso, ao mesmo tempo, pensando nas práticas do sagrado, nas questões do divino e nas contingências do presente e da história, insistiu sempre na noção de historicidade. Meschonnic é sensibilidade e agudeza. Poeta, deixa-nos a marca de um trabalho incansável pelo entendimento da poesia, da história do pensamento e de seus impasses.
Entre seus livros, destacam-se "Spinoza: Poème de la Pensée" (Maisonneuve & Larose, 2002), "Rythme: Politique du Sujet" (Verdier, 1995) e "La Rime et la Vie" (Verdier, 1989).

JERUSA PIRES FERREIRA é professora da ECA-USP e do programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da PUC-SP.


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