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São Paulo, segunda-feira, 25 de agosto de 2003

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LIVRO

Em "Wings of Madness", escritor Paul Hoffman coloca brasileiro no centro da discussão sobre origens da aviação

Alberto Santos Dumont retoma sua estatura heróica

SIMON WINCHESTER
DO "NEW YORK TIMES"

Quando se considera o empreendimento problemático em que se transformou a aviação comercial, surpreende que alguém ainda ouse reivindicar a invenção do avião tripulado e movido a motor. Mas muitos o fazem, e uma discussão continua a ser travada sobre onde tudo começou.
Na Carolina do Norte afirmam que, graças a Kitty Hawk, o Estado foi o primeiro; os de Ohio insistem que, já que os irmãos Orville e Wilbur Wright nasceram lá, o verdadeiro berço da aviação é a cidade de Dayton.
Na Inglaterra, no condado de Somerset, a pequena cidade Chard se proclama o berço da aviação graças a John Stringfellow, um herói local do século 19 que convenceu uma engenhoca equipada com um motor a vapor a erguer-se do chão e avançar pelo ar por cerca de três metros.
Os franceses afirmam que a aviação foi criada por eles e, mais que isso, dizem que, um século antes, os irmãos Montgolfier teriam enunciado o conceito.
Essas disputas e desentendimentos prosseguem por toda parte, menos no Brasil. Pois nenhum brasileiro duvida que o verdadeiro pai da aviação tenha sido Alberto Santos Dumont (1873-1932), o filho baixinho, elegante, excêntrico, rico, bombástico e provavelmente homossexual de um fazendeiro de café de Minas Gerais, que construiu máquinas de voar movidas a gasolina na aurora do século passado e voou nelas em Paris e em metade do mundo num momento em que os irmãos Wright tentavam, em segredo, vender seu invento ao Departamento de Guerra dos EUA.
Conforme a história brilhantemente relatada por Paul Hoffman em "Wings of Madness" (Asas da Loucura), Santos Dumont foi um homem como muito poucos e uma figura muitíssimo mais interessante que os enfadonhos consertadores de bicicletas de Dayton, aos quais o início da aviação é mais comumente associado.
O fascínio de Dumont pela aviação começou praticamente assim que chegou a Paris, em 1891, aos 18 anos. Armado com meio milhão de dólares herdado, ele comprou carros, tomou aulas de ciência e se tornou um tecnófilo.
Um dia, leu um livro sobre uma expedição balonística ao Pólo Norte que dera errado. Inspirado por uma foto, encomendou, em 1897, seu primeiro vôo de balão. A experiência o transformou: em questão de semanas, começou a construir seus próprios balões.
Colocou num deles um pequeno motor de triciclo e uma hélice e decolou. Daquele momento em diante, Dumont passou a percorrer os céus de Paris, para o deleite e o espanto das multidões.
A França inteira ficou fascinada. Foi organizada uma corrida aérea em volta da nova Torre Eiffel, e "le petit Santos" a venceu.
As histórias que Hoffman conta sobre o balonismo corajoso de Dumont e sobre seus experimentos tornam a leitura deliciosa. O vôo que ele fez em 1906 numa aeronave com asas em formato de caixas ao qual chamou de 14-Bis ainda é visto por seus partidários como o primeiro vôo mundial numa aeronave a motor publicamente testemunhado.
Mas a história também tem um lado mais sombrio. No final, Santos Dumont virou uma figura trágica: não apenas adoeceu e ficou profundamente deprimido com a rápida vitória de relações públicas dos irmãos Wright, como se chocou e entristeceu ao descobrir que a invenção, que acreditava ser sua, estava sendo usada na Grande Guerra com efeitos letais. Ele morreu em 1932, aos 59 anos, sob circunstâncias curiosas que Hoffman revela plenamente pela primeira vez.
Se o ótimo livro pode causar uma pequena sensação no Brasil, nos EUA terá o efeito positivo de reerguer Santos Dumont à merecida estatura heróica que ele desfrutou -embora brevemente- no passado.

Tradução Clara Allain


WINGS OF MADNESS. Autor: Paul Hoffman. Editora: Hyperion Books. Quanto: US$ 21 (R$ 63), em média. Onde encomendar: www.amazon.com.


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