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LIVRO
Em "Wings of Madness", escritor Paul Hoffman coloca brasileiro no centro da discussão sobre origens da aviação
Alberto Santos Dumont retoma sua estatura heróica
SIMON WINCHESTER
DO "NEW YORK TIMES"
Quando se considera o empreendimento problemático em
que se transformou a aviação comercial, surpreende que alguém
ainda ouse reivindicar a invenção
do avião tripulado e movido a
motor. Mas muitos o fazem, e
uma discussão continua a ser travada sobre onde tudo começou.
Na Carolina do Norte afirmam
que, graças a Kitty Hawk, o Estado foi o primeiro; os de Ohio insistem que, já que os irmãos Orville e Wilbur Wright nasceram lá, o
verdadeiro berço da aviação é a cidade de Dayton.
Na Inglaterra, no condado de
Somerset, a pequena cidade
Chard se proclama o berço da
aviação graças a John Stringfellow, um herói local do século 19
que convenceu uma engenhoca
equipada com um motor a vapor
a erguer-se do chão e avançar pelo
ar por cerca de três metros.
Os franceses afirmam que a
aviação foi criada por eles e, mais
que isso, dizem que, um século
antes, os irmãos Montgolfier teriam enunciado o conceito.
Essas disputas e desentendimentos prosseguem por toda parte, menos no Brasil. Pois nenhum
brasileiro duvida que o verdadeiro pai da aviação tenha sido Alberto Santos Dumont (1873-1932), o filho baixinho, elegante,
excêntrico, rico, bombástico e
provavelmente homossexual de
um fazendeiro de café de Minas
Gerais, que construiu máquinas
de voar movidas a gasolina na aurora do século passado e voou nelas em Paris e em metade do mundo num momento em que os irmãos Wright tentavam, em segredo, vender seu invento ao Departamento de Guerra dos EUA.
Conforme a história brilhantemente relatada por Paul Hoffman
em "Wings of Madness" (Asas da
Loucura), Santos Dumont foi um
homem como muito poucos e
uma figura muitíssimo mais interessante que os enfadonhos consertadores de bicicletas de Dayton, aos quais o início da aviação é
mais comumente associado.
O fascínio de Dumont pela aviação começou praticamente assim
que chegou a Paris, em 1891, aos
18 anos. Armado com meio milhão de dólares herdado, ele comprou carros, tomou aulas de ciência e se tornou um tecnófilo.
Um dia, leu um livro sobre uma
expedição balonística ao Pólo
Norte que dera errado. Inspirado
por uma foto, encomendou, em
1897, seu primeiro vôo de balão. A
experiência o transformou: em
questão de semanas, começou a
construir seus próprios balões.
Colocou num deles um pequeno motor de triciclo e uma hélice e
decolou. Daquele momento em
diante, Dumont passou a percorrer os céus de Paris, para o deleite
e o espanto das multidões.
A França inteira ficou fascinada.
Foi organizada uma corrida aérea
em volta da nova Torre Eiffel, e "le
petit Santos" a venceu.
As histórias que Hoffman conta
sobre o balonismo corajoso de
Dumont e sobre seus experimentos tornam a leitura deliciosa. O
vôo que ele fez em 1906 numa aeronave com asas em formato de
caixas ao qual chamou de 14-Bis
ainda é visto por seus partidários
como o primeiro vôo mundial
numa aeronave a motor publicamente testemunhado.
Mas a história também tem um
lado mais sombrio. No final, Santos Dumont virou uma figura trágica: não apenas adoeceu e ficou
profundamente deprimido com a
rápida vitória de relações públicas dos irmãos Wright, como se
chocou e entristeceu ao descobrir
que a invenção, que acreditava
ser sua, estava sendo usada na
Grande Guerra com efeitos letais.
Ele morreu em 1932, aos 59 anos,
sob circunstâncias curiosas que
Hoffman revela plenamente pela
primeira vez.
Se o ótimo livro pode causar
uma pequena sensação no Brasil,
nos EUA terá o efeito positivo de
reerguer Santos Dumont à merecida estatura heróica que ele desfrutou -embora brevemente-
no passado.
Tradução Clara Allain
WINGS OF MADNESS. Autor: Paul
Hoffman. Editora: Hyperion Books.
Quanto: US$ 21 (R$ 63), em média. Onde
encomendar: www.amazon.com.
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