São Paulo, sexta-feira, 25 de agosto de 2006

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Varela retorna em ano eleitoral frio

Peça "A História do Brasil Segundo Ernesto Varela - Como Chegamos Aqui?" estréia hoje para discutir a política do país

Nas quintas, Marcelo Tas promoverá debates após as apresentações, com nomes como Fernando Meirelles e Washington Olivetto


DA REPORTAGEM LOCAL

No dia 25 de abril de 1984, ao chegar ao Congresso Nacional para acompanhar a votação da emenda Dante de Oliveira, ponto culminante da campanha das Diretas Já, o jornalista e apresentador de TV Marcelo Tas percebeu que no crachá que lhe daria acesso ao plenário era outro o nome que aparecia: Ernesto Varela.
O funcionário do Legislativo tinha entendido tudo. Afinal, Varela, o personagem que fazia "perguntas óbvias" e desconcertantes a políticos e celebridades, criado no ano anterior por Tas em parceria com o hoje cineasta Fernando Meirelles, já havia se tornado àquela altura uma espécie de repórter-símbolo da redemocratização.
Mais de duas décadas depois, num ano eleitoral que desperta quase nenhum entusiasmo, suas entrevistas e reportagens históricas reaparecem na peça-palestra "A História do Brasil Segundo Ernesto Varela - Como Chegamos Aqui?", que trará, após as sessões da próxima quinta-feira, convidados para debaterem o país. Já estão confirmados Meirelles, o publicitário Washington Olivetto e o filósofo Roberto Romano.
O ano de surgimento do repórter, que fazia suas matérias para a TV Gazeta (SP), na companhia do câmera Valdeci (Meirelles), foi o mesmo das primeiras manifestações públicas favoráveis às eleições diretas para presidente da República no país.
Um dos mais antigos vídeos na peça é de 27/11/1983, quando a dupla filmou em frente ao estádio do Pacaembu o primeiro ato paulistano do movimento. Lá estavam, mais jovens e saudáveis, petistas como Luiz Inácio Lula da Silva, Marta e Eduardo Suplicy -este nem tão saudável assim, já que, recém-acidentado, era empurrado pela então mulher numa cadeira de rodas. A eles todos Varela perguntava: "Qual é o prazer da política?".
Lula responde que o prazer é que o povo participe, Marta diz não saber exatamente por que, afinal, tem que dividir com a política seu marido, e Suplicy, bem, Suplicy, enfaixado, pede para Varela, por favor, "não bater aí nas minhas costas, porque é um dos lugares em que está doendo".
A pergunta se torna mais simples e óbvia num dos primeiros encontros registrados entre Varela e Paulo Maluf, que se repetiria várias vezes dali por diante, quando o repórter pergunta ao então candidato da situação à Presidência da República se, como dizem, ele de fato é corrupto. Maluf, de cara amarrada, abandona o entrevistador sem lhe dar resposta.
"Perguntar para o Maluf se ele é ladrão é uma pergunta óbvia. O Varela sempre faz perguntas muito simples e óbvias", diz Tas. "Não valorizamos o óbvio. Às vezes é ele que traz as maiores revelações."

Contrastes
A comparação, inevitável durante a peça, entre aqueles anos que conjugavam esperança e informalidade, de um lado, e um ranço autoritário de poderosos de ocasião, resquício militar, do outro, e os anos que correm, de desesperança na política, faz Tas falar com respeito até de quem era o inimigo público nš 1 da época. "Maluf não mudou muito. É candidato de novo e um exemplo de perseverança impressionante. Perto desse cinismo de hoje, de mensaleiros e sanguessugas, ele é um homem coerente."
Resquícios do militarismo ainda se faziam sentir em 1986, quando Varela entrevista Nabi Abi Chedid, deputado e cartola da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), que fica irritado com a interpelação de Varela sobre política e o acusa de ser um mau patriota.
De outro lado, a nos basearmos na entrevista que o repórter da Globo Tonico Ferreira concede a Varela durante comício das Diretas em São Paulo, a informalidade também era grande, e profissionais de grandes veículos da mídia e da imprensa pareciam lidar com desenvoltura com os constrangimentos de seu ofício.
Comentando seu passado em "jornaizinhos" alternativos na faculdade, Ferreira é questionado por Varela: "E agora?". "Agora eu faço o jornalão da situação", responde.
Para outra pergunta "simples" de Varela, sobre o fato de a Globo não ter "divulgado tanto" o movimento pró-Diretas até aquela data, Ferreira é, mais uma vez, direto, afirmando que se trata de uma "decisão da empresa". A Globo havia escolhido "não cobrir" até aquele comício, ele diz. (RAFAEL CARIELLO)


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