São Paulo, segunda-feira, 25 de setembro de 2000

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MÚSICA
Guilherme de Brito, 78, parceiro de Nelson Cavaquinho em "A Flor e o Espinho", grava disco de sambas inéditos
Lua Discos dá alento à tradição e inovação

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

Cabe tudo num pote só. Uma mesma gravadora independente, Lua Discos, acelera suas atividades e dá guarida a frentes aparentemente opostas da sagrada música popular brasileira.
Fundada em 98 e dirigida em São Paulo pelo compositor e publicitário carioca Thomas Roth, a Lua acaba de gravar o que o sambista carioca Guilherme de Brito, 78, classifica como seu "primeiro disco comercial" no Brasil (antes, só gravara no Japão).
Parceiro histórico de Nelson Cavaquinho e autor dos versos "tire seu sorriso do caminho/ que eu quero passar com a minha dor" (de "A Flor e o Espinho"), ele registrou, em cerca de uma semana de estúdio, 12 sambas inéditos de sua autoria.
Entre os próximos projetos da Lua, previstos para lançamento em 2001, estão o primeiro disco solo do também histórico Casquinha, da Velha Guarda da Portela, e um CD em que o (anti)tropicalista Jards Macalé se dedica ao repertório de Moreira da Silva (1902-2000).
Um templo da tradição, a Lua Discos? Não é bem assim. Ainda em 2000, antes desses lançamentos, o selo deve editar "Garotas Boas Vão pro Céu, Garotas Más Vão pra Qualquer Lugar...", o segundo CD de Rebeca Matta. Novo talento baiano, Rebeca se revelou em 98, integrando as linguagens da MPB e da música eletrônica.

Guilherme de Brito
De sua casa, no Rio, Guilherme de Brito reage à novidade de se lançar cantor no Brasil entre sereno e satisfeito: "Esse disco foi uma surpresa para mim. Moacyr Luz veio aqui em casa e disse que eu ia fazer um disco pela gravadora Lua, de São Paulo. Fiquei muito surpreso e feliz. Só saí do estúdio com a gravação pronta".
Também sambista, Moacyr Luz (quarto colocado no recente festival da Globo, com "Eu Só Quero Beber Água") é o produtor e orientador do projeto. Os cantores Luiz Melodia e Cássia Eller participam do disco, em dois duetos com Guilherme.
"Era para sair no final do ano, mas Moacyr quer que lancem logo o disco. Estou à disposição", define Guilherme.
Ele diz que o título do CD permanece indefinido: "Eu queria que fosse "O Canto do Cisne". O cisne só canta quando morre, e como estou no fim da vida... Mas Moacyr não quis esse nome".
Por que a opção apenas por sambas inéditos? ""A Flor e o Espinho" não está lá. Moacyr quis fazer um negócio novo, e fiquei dependendo da orientação dele. Ficou aquela discussão, "essa vai", "essa não vai"... Só há uma música que foi gravada quando Nelson Cavaquinho era vivo, mas que depois ficou esquecida e é como se fosse inédita."
Entre as eleitas, ele destaca "A Vegetariana", samba satírico que apresentou em São Paulo em shows que fez em abril, no Villaggio Café. "Ai, ai, ai, não posso com essa criatura/ ai, ai, ai, porque ela só gosta de verdura", canta, satirizando a seu modo a atual música de bunda.
Cantos de cisne à parte, Guilherme explicita, enfim, o efeito causado pelo convite inesperado: "Foi uma injeção de ânimo. Agora vou voltar a compor, a me interessar de novo pela música. Eu havia abandonado".


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