São Paulo, sábado, 25 de novembro de 2006

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crítica

Autor contrapõe o reacionário ao visionário

OSCAR PILAGALLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Nos trechos em que apresenta maior densidade histórica, "Montenegro", de Fernando Morais, pode ser lido como um contraponto entre um reacionário e um visionário, ou, para dar nome aos personagens, entre Eduardo Gomes e Casimiro Montenegro.
A trajetória comum dos dois aviadores, que remonta ao tempo do tenentismo, nos anos 20, quando ambos se engajaram na luta que derrubou a República Velha, termina por causa do ITA, o paradigmático instituto de engenharia criado após a Segunda Guerra Mundial. Educador entusiasmado, Montenegro o idealizou e dirigiu; ministro da Aeronáutica, Eduardo Gomes minou suas bases.
Fernando Morais pinta Montenegro com as cores da ousadia intelectual, da improvisação criativa, da resistência à mediocridade. Num país em que até privadas eram importadas, ele sonhava em fabricar aviões. Eduardo Gomes é imagem do retrógrado. Nos anos 50 e 60, esteve envolvido em todas as tentativas de golpe contra a democracia. Conservador, via comunistas em todos os cantos, e o ITA não era uma exceção.
No plano ideológico, eles não eram muito diferentes. Montenegro assinou o manifesto dos brigadeiros contra Vargas, ficou do lado dos golpistas que não queriam dar posse a Kubitscheck e apoiou o regime militar. A divergência era mesmo o ITA. Os militares queriam uma escola nos padrões militares, de preferência voltada para fins militares.
Montenegro, ao contrário, era um militar "apaisanado", como diziam seus colegas de farda em tom de ofensa. Ele defendia uma instituição civil voltada para a iniciativa privada.
Fernando Morais estabeleceu um padrão tão elevado com "Chatô" que os trabalhos posteriores lhe são devedores. Ao fim da leitura, fica-se com a impressão de que o biógrafo foi recebido na casa do personagem, de que pesquisou o material sobre a escrivaninha, mas deixou de arrombar uma ou outra gaveta.
Ainda assim, Morais conta, por um ângulo incomum, uma saborosa história do Brasil.


OSCAR PILAGALLO é jornalista e autor de, entre outros livros, "A História do Brasil no Século 20" (Publifolha, em cinco volumes)

MONTENEGRO    
Autor: Fernando Morais
Editora: Planeta
Quanto: R$ 39,90 (300 págs.)


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