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COMUNICAÇÃO
Para sociólogo francês, mídia transforma tudo em satélite; ele faz hoje palestra sobre arquitetura no Rio
Baudrillard traz seu radicalismo ao país
JUREMIR MACHADO DA SILVA
especial para a Folha
O sociólogo Jean Baudrillard, 69,
está no Brasil. O pensador francês
veio à América do Sul a convite da
Bienal de Arquitetura de Buenos
Aires, que terminou ontem. A parada, no Rio, antes do retorno à
França, também servirá para "uma
reflexão sobre o espaço". A palestra acontecerá no Instituto dos Arquitetos do Brasil.
"Será que a arquitetura ainda
existe além de sua realidade própria, além da sua verdade, numa
espécie de radicalismo, de desafio
ao espaço (e não apenas da gestão
do espaço), de desafio a esta sociedade (e não apenas de obediência
às suas contingências e de espelho
das instituições), de desafio à criação arquitetônica em si, ao arquiteto criador e à ilusão de sua habilidade?", adianta ele o tom da palestra em texto de apresentação.
Pensador do radical e dos fenômenos extremos, Baudrillard considera-se um "paroxista indiferente". Praticante da ironia e do paradoxo, enxerga o conformismo onde outros imaginam germinar a revolução. Para ele, quando a crítica
se transforma em moralismo, somente a derrisão, o escárnio fatal
pode gerar rebelião.
Autor de ensaios como "A Sociedade de Consumo" e "A Transparência do Mal", Baudrillard nunca
parou de mudar para melhor destruir as ilusões do paraíso. Em seu
mais recente livro publicado no
Brasil, "Tela Total" (Sulina, 1997),
desarticula as fantasias da era do
virtual e da imagem. À Folha, Baudrillard falou sobre a mídia. Leia os
principais trechos da entrevista.
Folha - Pensar a mídia do ponto
de vista de um manual de utilização não lhe interessa. Existe ainda
alguma interrogação legítima e
inovadora sobre o funcionamento
dos meios de comunicação?
Jean Baudrillard - Deixadas de lado as soluções fáceis interessadas
em estabelecer o bom uso da mídia, vejo um território extremamente profissionalizado e que adquiriu uma espécie de transcendência em relação à sociedade.
Houve, talvez, um momento em
que foi possível estabelecer na mídia relações dialéticas entre o meio
e a mensagem. Acabou. Impôs-se
uma hegemonia que não é nem sequer política, pois o político também acaba "curto-circuitado".
Quem aceita a lógica orbital torna-se satélite. Quem se recusa a desempenhar o papel de recondutor
de informação é excluído ou, por
conta própria, retira-se do jogo. De
certo modo, é bom que a mídia
exista e absorva tudo, crie uma situação radical na medida em que
nada escapa ao controle e, se por
acaso alguém inventar algo exterior a isso, teremos certeza de que
se trata de algo substancial.
Folha - Em se tratando da mídia,
a esquerda sonhou com a transparência. Reina a obscenidade. A direita apostou nela como fator de
moralização. Impera a crise de valores. Seria a mídia regida pela lei
da inversão inexorável do sonho
em pesadelo?
Baudrillard - Trata-se de pesadelo na medida em que todos os sonhos são realizados. Tudo o que
pode depender da imaginação acaba absorvido pela imagem. Estamos de fato no domínio do visual,
sendo que não há mais possibilidade de autonomia para a imaginação e a imagem. Nem vale a pena
qualquer referência à palavra.
Folha - O que se pode esperar da
evolução da mídia?
Baudrillard - Qual será a evolução
da mídia? É limitada. Como o resto, está destinada a ser engolida
por seu próprio funcionamento.
Ela acabará por se tornar imediata,
de tal modo absorvida pela vida
corrente que não haverá mais
fronteira entre elas. Antes existia
um domínio privado. Hoje, quando alguém anda na rua, o celular
funciona. As pessoas não se desconectam mais. Se isso significa evolução, implica o desaparecimento
da mídia como a conhecemos.
Espero, contudo, que muita coisa
resista a isso. Mesmo parte da mídia começa a se questionar, numa
espécie de arrependimento, sobre
as justificativas usadas até agora. O
problema é que essa reflexão sempre aparece em termos morais, políticos ou econômicos. Tenta-se estabelecer uma política do virtual,
assim como uma política, uma
moral ou uma deontologia da mídia. Ora, por definição, a mídia representa a eliminação do político.
Folha - Há futuro para a mídia?
Baudrillard - Não. O futuro da
mídia consiste em tornar o presente cada vez mais presente, o tempo
cada vez mais real e, portanto, de
eliminar a própria questão do devir. A mídia anula todas as questões anteriores a ela, sobre a liberdade, sobre a identidade etc.
Folha - É um destino irreversível?
Baudrillard - Ninguém pode ser
profeta quanto a isso. A lógica do
sistema é irreversível, enquanto
mecanismo. Não vejo saída fora da
catástrofe do próprio sistema. Mas
não podemos esquecer que muitas
coisas resistem. Por exemplo, a linguagem. Talvez um dia se chegue a
uma transfusão de todas as línguas
numa linguagem digital e virtual.
Em todo caso, as línguas naturais
continuam irredutíveis, o que é extraordinário.
²
Palestra: Verdade ou Radicalismo na
Arquitetura, com Jean Baudrillard
Quando: hoje, às 19h
Onde: Instituto dos Arquitetos do Brasil (r.
do Pinheiro, 10, Flamengo, Rio de Janeiro,
tel. 021/557-4192)
Quanto: entrada franca
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