São Paulo, Sábado, 25 de Dezembro de 1999


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MÚSICA

George Michael se confunde todo

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local

Liberto de uma briga que parecia interminável com a gravadora Sony, o cantor inglês George Michael, 36, inicia vida nova, casa nova -a Virgin- com "Songs from the Last Century". E ninguém consegue entender nada.
Começa pela (chata) questão semântica. Apanhando canções compostas entre 1930 e 1995, ele as chama de "canções do século passado". Ou é irônico com o envelhecimento da canção popular na era tecno -o que é bem bobo-, ou está querendo lançar um disco para os 2000 -mas, tédio, o século 21 só começa em 2001.
Depois é questão de posicionamento. Embora sempre discriminado por seu forte apelo pop, George é artista de importância capital na constituição do pop pós-80, com grandes ("Faith", 87, "Older", 98) e enormes ("Listen without Prejudice", 90) momentos de inserção.
Agora, resolve se tornar pretensioso e avançar por solo pisado por ícones qual Frank Sinatra ("Where or When", 37) ou Nina Simone ("Wild Is the Wind", 57), exibindo seus dotes de intérprete.
Bem, claro que eles existem. Mas ele fica risível tentando incorporar Bryan Ferry -talvez o único artista pop com desenvoltura para se embrenhar em tais nichos da canção tradicional (Ferry acaba de lançar CD análogo a esse, pela mesma Virgin)- e dando a seu velho pop verniz jazzinho, salão de festinha de restaurante kitsch-chique.
Quanto à estratégia de seleção, o cara parece mais perdido que cego em tiroteio. Soaria cândida se não soasse macabra a colocação, num rol de compositores ditos de estirpe na canção tradicional, de Sting ("Roxanne", 78, do Police) e do U2 ("Miss Sarajevo", 95, aquela do encontro com Pavarotti). Ele não sabe se vai ou se fica.
"Songs from the Last Century" não é de todo ineficaz, entretanto. Torna-se funcional quando o ídolo pop se aproxima (ainda que sob arranjos pseudo-sofisticados) de seu terreno de origem.
Tal acontece nas tocantes "The First Time Ever I Saw Your Face" (63, já cantada por Elvis Presley, Roberta Flack e Marianne Faithfull), "Wild Is the Wind" (a que David Bowie, além de Nina Simone, deu versão de profundidade, em 76), até mesmo "Miss Sarajevo". Não acontece em "Roxanne", porque Sting, francamente...
No mais, a compreensão da canção do século (de que século?) por George peca, ainda, pela aceitação do estereótipo do cantor gay que vem tentar emular Ninas Simones e Robertas Flacks. Este é apenas um lado da canção popular, não permite a ela o rótulo globalizador que o menino pretende.
Bom, revisão é a moda e George não quis ficar de fora. É preocupante que o tenha feito no início de um novo ciclo, mas não é possível descobrir agora, só por esse equívoco, para onde quer ir. Espera-se, por enquanto, a volta do ídolo pop gay cheio de macheza e de propriedade que ele tem conseguido sempre ser. Está de férias.

Avaliação:  


Disco: Songs from the Last Century
Artista: George Michael
Gravadora: Virgin
Quanto: R$ 20, em média


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