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CIA fez campanha contra Nobel para Pablo Neruda
Segundo a autora, área mais "frutífera" para a agência foi a de revistas e livros
Expressionismo abstrato, de artistas como Jackson Pollock, foi a arte oficial da
Guerra Fria cultural promovida pela agência
DA REPORTAGEM LOCAL
Leia abaixo a continuação da
entrevista com a jornalista
Frances Stonor Saunders.
FOLHA - Quais áreas da cultura foram mais "frutíferas" para a CIA?
SAUNDERS - Provavelmente, o
melhor retorno para a agência
foram as áreas dos periódicos e
livros. A CIA tinha um programa de publicações e revistas
bem abrangente e tinha um
bom orçamento -com o qual
foi possível atrair algumas das
melhores mentes da era pós-guerra e dar a essas pessoas a
plataforma para transmitir
suas idéias. Não é necessário
dizer que tais idéias tinham de
dizer, em menor ou maior grau,
simpáticas aos pagadores da
CIA. Pablo Neruda ou Sartre
não eram bem-vindos como
participantes.
FOLHA - Alguns daqueles artistas
não teriam hoje a mesma importância sem a influência da CIA?
SAUNDERS - É possível questionar a reputação de alguns escritores e artistas à luz do que sabemos sobre o envolvimento
da CIA na Guerra Fria cultural.
Por outro lado, a agência fez de
tudo para prejudicar Pablo Neruda, não apenas por sua visão
política mas também como escritor. Ela, em segredo, fez
campanha contra a premiação
dele com o Nobel. Mas muitos
escritores ou pensadores menores de repente se viram tirando proveito de passagens de
primeira classe para viajar pelo
mundo e fazer palestras tendo
uma plataforma fornecida pelo
braço secreto do governo americano. Quantos deles estavam
destinados a parar nos porões
dos sebos de livros?
No meu capítulo sobre o expressionismo abstrato, eu não
questiono o valor estético do
movimento ou o impacto que
ele teve, e continua a ter, na história da arte. Mas mostro como
a CIA estava envolvida num
cartel cujo principal objetivo
era asseverar os méritos do expressionismo abstrato como
propaganda da liberdade americana, e isso foi feito em detrimento de outros tipos de arte.
O movimento se tornou a arte
oficial da Guerra Fria americana, o tipo de arte que os diretores da CIA colocavam na parede de suas salas. Acho importante saber como isso ocorreu.
FOLHA - Pode-se comparar esta política ao que foi feito durante o nazismo e na União Soviética?
SAUNDERS - O que a CIA fez foi
infinitamente mais sofisticado
do que fizeram os nazistas ou
os soviéticos. Não se tratava de
armar estratégias para forçar
pessoas a seguir a linha oficial.
O que CIA desenvolveu foi uma
forma muito sutil de propaganda: o tipo em que as pessoas envolvidas em sua produção, e
aquelas envolvidas em seu consumo, sequer sabiam o que é
propaganda. Então, nada de
agrupamentos de massa, pinturas realistas mostrando trabalhadores brandindo suas ferramentas contra a opressão dos
capitalistas.
Pelo contrário, você mostra
às pessoas o expressionismo
abstrato, que aparentemente
não significa nada, e você diz
"olhe como somos livres, tão livres que produzimos arte que
significa tudo e nada ao mesmo
tempo". E o que você obtém é
um dispositivo bem inteligente
para encorajar a idéia de que a
América é a campeã da liberdade, apesar do que esteja acontecendo em seu nome ou sob seus
auspícios (o estabelecimento
de ditaduras na América Latina, a interferência com esquadrões da morte, tortura etc.).
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