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LITERATURA
Autor de "O Zahir" diz que só "une visível e invisível" por ser brasileiro
"Graças a Deus eu nasci no Brasil", diz Paulo Coelho
MARCELO PEN
CRÍTICO DA FOLHA
Depois do sexo, a pergunta. Se o
ponto de partida para o romance
anterior de Paulo Coelho, 57,
"Onze Minutos", foi a pulsão erótica, agora, em "O Zahir", o autor
toma como base uma indagação
que ele resume assim: "Por que vivemos uma história que nos foi
imposta, inventada por outros?".
Para isso, ele cria um enredo
mirabolante, com fortes traços
autobiográficos, misturando a
história de um autor de sucesso
internacional cuja mulher desaparece em Paris com teorias místicas diversas, em especial teorias
das estepes do Cazaquistão.
No cenário parisiense, membros de uma seita cazaque: o que
há de brasileiro, afinal, nesta história? Ele diz que o elemento nacional está na união de mundos
aparentemente estanques: o visível e o invisível. Ao abolir o muro
que separa essas realidades, o autor promove algo que qualquer
brasileiro saberia desde pequeno:
há mais coisas entre o céu e a terra
do que sonha nossa vã filosofia.
"Não poderia escrever sobre o
que escrevo se fosse francês, alemão ou americano. Sou um produto das minhas circunstâncias,
as quais foram, graças a Deus, ter
nascido no Brasil."
E a fórmula mágica parece ter
dado muito certo, como atestam
as capas de todas as importantes
revistas brasileiras, destacando
números surpreendentes: ele já
vendeu 65 milhões de livros, em
56 idiomas de 150 países. Coelho
falou por telefone à Folha de seu
refúgio nos Pireneus, na França.
Leia a seguir trechos da entrevista.
Folha - Você concorda que "O Zahir" trata da obsessão?
Paulo Coelho - Acho que a obsessão está presente no comportamento humano de uma maneira
geral. Ulisses é obcecado por chegar a Ítaca, Dante por encontrar
Beatriz. Trata-se, porém, da manifestação enferma da lenda pessoal de cada um.
Folha - Como separa joio e trigo
na busca por idéias para escrever?
Coelho - Exerço a disciplina rígida de não ter mais do que uma
idéia a cada dois anos. As outras
são descartadas. Quando sento
para escrever, começo por falsos
livros. Em um dado momento,
percebo o verdadeiro chegando.
Folha - Como sabe?
Coelho - Pela primeira frase.
Folha - Quanto tempo você leva
para escrever um livro?
Coelho - Normalmente duas semanas. Foi o produto de dois
anos de uma maturação inconsciente. Já viu um mecânico, que
abre o capô do carro e fica observando longamente, o olhar vazio?
Quando ele enfim mexe no motor, pumba, vai direto ao ponto. O
trabalho do escritor está ligado a
essa sintonia entre ele e o objeto
do seu trabalho.
Folha - O livro pode fugir à concepção inicial?
Coelho - Muito. O consciente
empurra para um lado, mas o
subconsciente empurra para o
outro. Na batalha, é preciso deixar-se guiar pelo subconsciente.
Há ali uma parte que você desconhece e que passa por caminhos
completamente inesperados.
Folha - Não faz um planejamento
da história?
Coelho - Não. Está doido? Se já
soubesse tudo que ia acontecer
não teria o menor entusiasmo.
Folha - Em seus livros, o senhor
procura unir o plano da ficção com
um plano místico. Neste caso, há o
relato do esoterismo cazaque.
Coelho - Para mim, a realidade
visível e a invisível não estão muito separadas. Procuro viver as
duas intensamente. É a grande
herança do Brasil. O brasileiro
tem muita facilidade de navegar
por esses mundos sem se propor
problemas muito cartesianos, como vemos na Europa.
Folha - Qual é sua rotina quando
está escrevendo um livro?
Coelho - Para mim, a criação do
livro deve vir de um jato só. Após
um período de adiamentos, fico
absolutamente possuído, perco a
fome e não tenho nenhum outro
interesse senão o de escrever o livro. Nesse momento diria que estou justificando minha vida.
Folha - O Brasil está no caminho
certo?
Coelho - Se, em última análise,
sua pergunta é "o Lula está fazendo um bom governo", acho que
sim. Não vamos resolver nossos
problemas num dia. Estamos numa corda bamba. Temos boas soluções para problemas bastante
duros. Acho que o processo começa com Fernando Henrique,
que deu passos bem importantes.
Folha - O senhor enxerga uma
continuidade entre FHC e Lula?
Coelho - Diria que o Brasil passa
por duas visões ou duas abordagens não necessariamente iguais,
mas que caminham, na minha
opinião, na direção certa.
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