São Paulo, sexta-feira, 26 de março de 2010

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Antunes Filho adapta Lima Barreto

Diretor estreia "Policarpo Quaresma"; montagem dá continuidade à fase do dramaturgo dedicada a autores brasileiros

Encenador diz que quis fazer "teatro popular" e deixou de lado sofisticações para beber no teatro de revista e nos irmãos Marx


MARIA EUGÊNIA DE MENEZES
DA REPORTAGEM LOCAL

Um turbilhão verde e amarelo arrasta Antunes Filho, 80. O diretor, que já recriou da Inglaterra vitoriana de Shakespeare à Noruega cinzenta de Ibsen, ultimamente não quer saber de nada que não seja genuinamente brasileiro. Prova disso é sua empreitada mais recente, a encenação de "Policarpo Quaresma", que estreia para convidados hoje, no Sesc Consolação.
Desde que encerrou seu ciclo de tragédias gregas, em 2005, Antunes dedica-se com afinco a pôr o país em relevo. Passou pela literatura barroca de Ariano Suassuna, voltou às tragédias de Nelson Rodrigues e agora desemboca no herói ingênuo de Lima Barreto (1881-1922).
"É um personagem que tem a estatura de Macunaíma e Riobaldo", diz ele, referindo-se ao protagonista do clássico "Triste Fim de Policarpo Quaresma".
Saudado pela crítica literária como uma espécie de Dom Quixote nacional, Quaresma é um homem pacato tomado por arroubos nacionalistas. Resolve aprender tupi, pregar mudanças para engrandecer o Brasil, mas termina desencantado.
Apenas para adaptar o livro a uma estrutura teatral, Antunes gastou seis meses. "Foi uma trabalheira danada. Transformei todas as descrições em diálogos e também criei alguns personagens para dar sustentação aos protagonistas", conta.
De resto, a tarefa de encenar a trama -que se passa em três momentos diferentes e será contada em ato único- consumiu quase dois anos de preparação e ensaios.
Um percurso que foi interrompido, em 2009, por outras duas montagens: "A Falecida Vapt-Vupt" e "Lamartine Babo". Ambientadas no Rio de Janeiro, ambas compõem, ao lado de "Policarpo Quaresma", aquilo que Antunes denominou de trilogia carioca. O próximo trabalho, ele avisa, deve seguir por trilha semelhante e se embrenhar pelo célebre conto de Machado de Assis "O Alienista".
Em cada linha do romance de Lima Barreto, salta como pano de fundo um corrosivo retrato da sociedade carioca do século 20, em que a corrupção contamina a política e espraia-se por todas as relações sociais.
Para transportar isso ao palco, o espetáculo do grupo Macunaíma e do CPT abriu mão do cenário, dispensou os recursos de ambientação em uma determinada época e tratou de estabelecer um diálogo com o Brasil de hoje, conta Lee Thalor, que interpreta o personagem-título da montagem. "A crítica que o Lima Barreto fazia ainda está latente hoje", diz.
Antunes acrescenta outra preocupação: fazer um teatro popular. E, para isso, tratou de deixar de lado pretensas sofisticações e foi beber na fonte da "commedia dell'arte", do teatro de revista e dos irmãos Marx. "Queria fazer um espetáculo
aberto, solto e dar de volta tudo aquilo que eu recebi do teatro. Tenho que me ajoelhar para agradecer a meus mestres, Ziembinski, Cacilda Becker. Será que eu vou conseguir?" Antunes promete que vai seguir tentando.


POLICARPO QUARESMA

Quando: estreia para convidados hoje, às 21h; sex. e sáb., às 21h; dom., às 19h; até 6/6
Onde: Sesc Consolação - teatro Sesc Anchieta (r. Dr. Vila Nova, 245, tel. 0/ xx/11/3234-3000)
Quanto: R$ 5 a R$ 20
Classificação: 12 anos




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