São Paulo, quinta, 26 de março de 1998

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ARTES PLÁSTICAS
Mostra de colecionadores "Afinidades Eletivas" abre hoje com 70 obras de artistas como Boi e Tunga
Kim Esteve apresenta acervo particular

Antônio Gaudério/Folha Imagem
O colecionador Kim Esteve posa diante de quadro de Robert Yarber exposto na mostra "Afinidades Eletivas I"


SÉRGIO MALBERGIER
da Redação

Kim Esteve, 57, é um dos maiores colecionadores de arte do Brasil. Ele inaugura hoje uma série de mostras que pretende revelar ao público um acervo fundamental e desconhecido: o das grandes coleções particulares.
A iniciativa, do pintor e agitador cultural José Roberto Aguilar, vai levar uma coleção particular por ano à Casa das Rosas. Esteve é o primeiro convidado.
A mostra tem cerca de 70 obras selecionadas entre as mais de 400 do acervo do colecionador. Logo na entrada há um óleo de Iberê Camargo, "Maria" (90), raramente visto, ladeado por duas salas temáticas: Wesley Duke Lee (dez quadros) e Maciej Babinski (nove).
"Em vez de ser um chato enfurnado em casa, Kim abriu a sua casa para os artistas. Ele começou a colecionar não só a arte, mas também os próprios artistas", diz o polonês-brasileiro Babinski, 66.
Esteve começou a colecionar após voltar de uma temporada em Nova York, na década de 70, onde estudou arte na Universidade de Nova York.
Sua casa, na Chácara Flora (zona sul de São Paulo), primeiro teve uma sala adaptada como pequena galeria. Com o crescimento da coleção, Esteve construiu uma galeria de proporções consideráveis no seu jardim: um museu particular.
Foi lá, na semana passada, que artistas como Claudio Tozzi, Antonio Peticov, Leda Catunda e Ivald Granato, entre outros, exibiram uma exposição dedicada ao futebol que vai rodar o mundo até chegar à França na época da Copa.
É na casa do colecionador também que, há cerca de 15 anos, se realiza um dos eventos paralelos mais importantes da Bienal de São Paulo: uma festa nababesca que congrega artistas nacionais e internacionais no primeiro dia da megaexposição.
Dando os últimos retoques na primeira exibição pública de seu acervo, que exibirá ainda Antônio Henrique Amaral, Tomie Ohtake, Tunga, Waltércio Caldas, Siron Franco, Granato, Boi e muitos outros, Esteve recebeu a Folha para falar do ofício de colecionador.

Folha - Quanto vale a sua coleção?
Kim Esteve -
Nunca dei tanta bola para isso. Compro, aprecio. Mas não calculo quanto vale. Acho que eventualmente vou doar a coleção, não vou vendê-la.
Folha - O sr. tem a intenção de transformar sua coleção particular em museu, como aconteceu com Guggenheim em Nova York?
Esteve -
É difícil porque é preciso mais respaldo financeiro do que eu tenho para fazer algo assim. Você morre e depois tem de bancar o jogo depois da sua morte. É preciso muito dinheiro. Eu sou mais propício a eventualmente fazer uma doação a algum museu ou entidade. Ainda não tenho pensado muito nisso, apesar de estar ficando velho.
Folha - O sr. comprou muita coisa nos anos 70. Era barato?
Esteve -
Para dar um exemplo, um Babinski na década de 70 não passava de US$ 5.000. Hoje deve estar entre US$ 35 mil e US$ 40 mil.
Folha - O dinheiro foi bem empregado?
Esteve -
É uma outra maneira de empatar o capital. Pode-se ganhar ou perder muito dinheiro com isso.
Folha - Arte brasileira é um bom investimento?
Esteve -
Essa questão tem a ver com a conjuntura do país. Como o país agora está sendo mais respeitado lá fora, as coisas devem melhorar. Foi isso que levou a arte americana lá para cima e é isso que vai levar a arte brasileira também. A arte é a manifestação do que está acontecendo. É um bom momento de comprar. Mas o momento sempre é bom, quando aparece uma boa oportunidade.
Folha - Comprar arte é um ato compulsivo?
Esteve -
Muitas vezes quase vendi carro para comprar arte. Um bom trabalho você coloca na parede e, depois de 30 dias, continua olhando porque ele ainda lhe passa coisas. É um prazer incomparável.
Folha - Falta cultura de mecenato e apoio aos artistas no Brasil?
Esteve -
O artista sempre enfrentou dificuldades. Mas, se ele é bom e dedicado, vai achar o seu caminho. Acredito nisso. O governo pode ajudar um pouquinho, mas dentro dos regimes comunistas, por exemplo, não surgiu grandes obras de arte interessantes.
Folha - O que o sr. espera passar ao público com essa mostra de seu acervo?
Esteve -
Quero que as pessoas olhem um pouco para trás e vejam um traço recente que nem sempre está exposto. Foi uma grande idéia do Aguilar fazer essa série com colecionadores. No começo relutei, mas depois percebi a importância de revelar esses acervos. Só ficar num armário fechado é desperdício. É preciso arejar as obras e sua relação com o público.

Mostra: Afinidades Eletivas I - O Olhar do Colecionador; Coleção Kim Esteve Quando: abertura hoje, às 20h; de ter a dom, das 12h às 20h; até 10 de maio
Onde: Casa das Rosas (av. Paulista, 37, tels. 011/251-5271, 288-9447) Quanto: entrada franca


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