São Paulo, Segunda-feira, 26 de Abril de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"S.O.S. Brasil"

Lili Martins/Folha Imagem
O empresário Antonio Ermírio de Moraes (à dir.), autor da peça "S.O.S. Brasil", que estréia em agosto, e o diretor Marcos Caruso no saguão do edifício-sede do grupo Votorantim, no centro de São Paulo


O empresário estréia em agosto, em São Paulo, a sua segunda peça, sobre o descaso com a saúde no país; no texto, ele questiona "os donos de hospital, os egoístas da vida"
NELSON DE SÁ
da Reportagem Local

O empresário Antonio Ermírio de Moraes fala com familiaridade de Shakespeare, de Cacilda Becker e do TBC, até do dramaturgo Abílio Pereira de Almeida, que ele chegou a conhecer. Mas é outro o seu interesse, com o teatro.
Ele estréia em agosto, no teatro Faap, "S.O.S. Brasil" -e a sua prioridade única é a saúde, o tema que aborda na peça. Moraes, que é colunista da Folha, dirige o hospital Beneficência Portuguesa há 28 anos e escreveu um desabafo contra o descaso com a saúde pública no Brasil.
Ele não adiantou o texto, mas, em entrevista, procurou deixar evidentes os seus alvos. "Quem não vai gostar da peça são os donos de hospital, os egoístas da vida", diz. "Os castelos construídos por aí, hospitais cinco estrelas, para mim terão respeito na hora em que começarem a ceder espaço para internação dos menos favorecidos."
Autor já mais experiente, ele que ficou 14 meses em cartaz com seu primeiro texto, "Brasil S.A.", o empresário carrega nas palavras. "Na saúde é isso. Ninguém quer acabar com o egoísmo. Se você puder ser considerado (entidade) filantrópica dando três ou quatro injeções por semana, numa favelinha aqui, você não interna ninguém."
Ele dá exemplos do que ouve, por vezes, nos corredores da própria Beneficência Portuguesa: "Pelo amor de Deus, tem um preto aqui ao lado". Ou então, "tem um sujeito mal vestido aqui do meu lado". O empresário e dramaturgo se revolta: "E daí?!".
Na peça, relata o próprio autor, há uma mensagem final que reflete tal revolta. "A peça é isso: tem que derrubar o egoísmo e ceder espaço aos menos favorecidos. Por enquanto, quem está lá em cima não quer de jeito nenhum. Pobre não passa nem na calçada."
Desta vez não há traços autobiográficos diretos na peça. O cenário é um hospital, mas também aqui não se trata da Beneficência Portuguesa -que, como Moraes faz questão de dizer, dedica 60% de seus serviços ao SUS (Sistema Único de Saúde).
Por outro lado, como descreve o diretor Marcos Caruso, um nome de grande êxito no teatro paulistano ("Trair e Coçar...", "Porca Miséria"), "a peça traz sempre os dois lados" e não tem posição fechada. Uma cena reúne dois pacientes num quarto do hospital: um líder sindical aposentado, Camarão, e um general reformado, Rubião. Segundo o diretor, o quadro "dá razão à esquerda e à direita, mas também tira a razão de ambas".
A trama corre em torno de Terezinha de Jesus (a ser interpretada pela atriz Mayara Magri), que, depois de passar por diversos hospitais privados e públicos do país, chega a São Paulo para se descobrir portadora de uma doença que pode levá-la à morte.
Paralelamente aos pacientes, "S.O.S. Brasil" faz surgir um médico idealista (Jandir Ferrari), uma superintendente de hospital (Jussara Freire) e um político corrupto, Dr. Praxedes (Rogério Marcico), que "manda e desmanda" nas verbas públicas de saúde.
Vários personagens são tirados diretamente da experiência do empresário na direção de hospitais, mas ele evita identificar modelos, a começar do político. O que faz é relatar na própria peça, por exemplo, como se dão os desvios de dinheiro no cotidiano da saúde.
"É uma área que você tem de observar, ir tomando nota, para depois trazer para o teatro", diz Moraes. "O que nós estamos dizendo lá não tem nenhuma mentira." Para Caruso, "o público vai se surpreender ao descobrir o que está por trás, nos hospitais brasileiros, da falta de esparadrapo".
Como em "Brasil S.A.", inclusive com a mesma atriz, Maria Eugênia de Domênico, há quadros de alívio cômico, centrados desta vez numa enfermeira, Ambrosina. Além dos citados, outros atores do elenco da primeira peça voltam em "S.O.S. Brasil", como Rogério Fróes, no papel do general.
No final da entrevista, Antonio Ermírio de Moraes anunciou que já prepara uma terceira peça: "Acorda Brasil", sobre educação.


Texto Anterior: Filmes e TV paga
Próximo Texto: "Se for pior que a primeira, estamos fritos"
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.