São Paulo, sábado, 26 de junho de 2010

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ANÁLISE

Mais radical dos abolicionistas teve uma biografia "pronta para o cinema"

LUÍS FRANCISCO CARVALHO FILHO
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Em 1835, uma lei de exceção passou a vigorar no Brasil. A rebelião de escravos e o homicídio de seus proprietários eram temas que assombravam elites e autoridades.
Draconiana, a lei criou facilidades processuais para a condenação criminal e o enforcamento de escravos acusados de matar ou de tentar matar seus senhores.
Na década de 1870, antes de dom Pedro 2º adotar a política de comutar sistematicamente as condenações à pena de morte (o último registro de enforcamento legal é de 1876, em Alagoas), Luiz Gama pregava o direito à revolta e defendeu, nos tribunais, a presunção de legítima defesa do escravo que matasse o seu senhor.
Luiz Gama foi o mais radical dos abolicionistas. Autodidata, republicano, jornalista, poeta e rábula (profissional que exerce a função de advogado sem formação acadêmica), morreu em 1882 sem ver a extinção da escravidão com a chamada Lei Áurea. Seu funeral foi acompanhado por uma multidão.
No plano literário, Luiz Gama tem a reputação de ser o primeiro poeta negro a cantar o amor pela mulher negra e rejeitar o amor pela mulher branca (Raymon Sayers, "O Negro na Literatura Brasileira", edições O Cruzeiro, Rio de Janeiro, 1958).
Em um de seus poemas, relata o sonho de ter entre os braços uma linda mulher, "pescoço branco de neve", mas ao acordar percebeu estar abraçado a uma "estátua de mármore".
Sua vida é argumento pronto para o cinema. Nasceu livre, mas foi vendido como escravo pelo próprio pai.
Filho da negra Luiza Mahin, nas suas palavras "pagã", "bonita" e "vingativa", envolvida na Revolta dos Malês (1835) e na Sabinada (1837), na Bahia, a última pista que dela se tem é a de uma prisão no Rio de Janeiro.
O pai era "fidalgo". Gama omitiria seu nome em carta autobiográfica para "poupar à infeliz memória, uma injúria dolorosa".
Escravizado, aos 10 anos de idade percorreu a pé os caminhos entre Santos e Campinas. Aprendeu ofícios, alcançou a própria liberdade, foi soldado-preso e processado por insubordinação. Fixou-se em São Paulo, onde viveu da advocacia criminal e de solucionar qualquer pendência administrativa.
Em anúncio publicado no "Radical Paulistano", em 1869, propunha-se a aceitar gratuitamente todas as causas de liberdade que os interessados lhe quisessem confiar. Em ações judiciais, libertou cerca de 500 escravos.


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