São Paulo, sexta-feira, 26 de setembro de 2008

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Última Moda

ALCINO LEITE NETO, EM Milão - ultima.moda@grupofolha.com.br

Tensões eróticas nos desfiles de Milão

Principais coleções da temporada italiana, que acaba hoje, exploraram relação entre sexo e moda

Se a moda sempre diz respeito à sexualidade, como afirmou a artista plástica Louise Bourgeois (numa ótima entrevista com o estilista Helmut Lang na última "Wallpaper"), é na fa- shion week de Milão que esta relação aparece de maneira mais evidente e interessante.
Ainda mais se a temporada é a do verão, quando as roupas precisam libertar os corpos para o calor mediterrâneo.
Liberar não significa apenas expor os corpos, mas também indicar a força do desejo, explicitar a tensão sexual. Por isso a Prada buscou nas "bombshells" do cinema dos anos 50 (dos EUA e da Itália) a sua imagem feminina dominante.
As roupas estranhas da grife, o efeito "bagunçado" e "amassado", alguns laços soltos, dependurados, as blusas com construção aberta, como se tivessem sido arrancadas às pressas, expondo o busto -tudo sugere uma atitude imediatamente pré ou pós-coital.
Deve ser por isso que a coleção desagradou às melhores críticas internacionais na semana de moda de Milão -que termina hoje. Para aumentar a polêmica fashion, duas modelos caíram na passarela da Prada devido ao salto altíssimo.
Muito sexual também foi a excelente coleção do designer belga Raf Simons para a grife Jil Sander, que já chegou a ser apontado como austero e ascético. Desta vez, inspirado nos anos 20 (a vanguarda de Man Ray, o charleston) e em elementos africanos (sobretudo para as cores, terrosas e vegetais), ele dessublimou o minimalismo da grife por meio de um jogo de oposições entre o rigor simétrico da alfaiataria e a maleabilidade sinuosa das franjas (tipo melindrosa).
Parece fácil, mas não é. Simons se colocou problemas abissais na construção das roupas, que ele decifrou com brilhantismo. Na alfaiataria, explorou o arquétipo do blazer em mil formas, recortando mangas e cavas, estendendo assimetricamente as barras, esticando as lapelas e desconstruindo a forma sisuda da peça.
As franjas foram usadas de maneira estrutural, em retas, curvas e diagonais, a fim de moldar as formas e causar um efeito contínuo de estremecimento físico.
Em cada look, a questão era sempre descobrir um jeito de acentuar a sensualidade do corpo, buscando uma nova arquitetura do desejo na moda, entre discrição e exibicionismo, entre contenção e furor.
Foi erótica ainda a coleção da Marni, mas num outro sentido: o da alegria, do gozo das formas, com a proliferação feérica de cores, de elementos gráficos, de xadrezes em tules quase transparentes, de estampas de flores gigantescas.
Mais uma vez, a grife mostrou um trabalho impressionante com a tecnologia têxtil e muita criatividade no design, de inspiração pop, sem falar nos chocantes acessórios.
A Gucci -que abre sua primeira loja no Brasil em novembro, no shopping Iguatemi- fez um desfile muito glamouroso, mas sem riscos, percorrendo território conhecido.
O erotismo conduziu a coleção, seja na forma de sedutores caftans curtíssimos, seja na de ternos coloridos, que transformaram as modelos em provocantes malandrinhas. Mas no caso da Gucci o sexual não é bem um problema, nem uma tensão crítica ou uma mola criativa. É quase um marketing.


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