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LIVRO/LANÇAMENTO
BONS TEMPOS
Para o crítico, revista "Clima" foi espaço para a produção incipiente de intelectuais de importância no país
"Ruy Coelho era excepcional", diz Candido
DA REPORTAGEM LOCAL
"Tempo de Clima" foi lançado
ontem à noite, no Centro Cultural
Maria Antonia, em São Paulo, ao
lado de outra obra de Ruy Coelho
(1920-90), "Os Caraíbas Negros
de Honduras", ambas pela editora Perspectiva.
O primeiro livro traz textos publicados desde o primeiro número de "Clima", em 1941, até o seu
16º e último, em 1944. O volume
foi organizado pelo crítico Antonio Candido, professor aposentado de teoria literária e literatura
comparada da USP, em conjunto
com a família -Ruy Coelho é pai
do crítico de teatro da Folha, Sérgio Salvia Coelho.
Com prefácio da professora Gilda de Mello e Souza, que também
atuou na revista, inclui artigos,
críticas e crônicas de Coelho sobre cinema, literatura e arte.
"O seu ponto de vista em "Introdução ao Método Crítico" procura
associar a análise literária à reflexão filosófica, o que não era corrente no Brasil. E os escritos sobre
cinema revelam uma sensibilidade e uma segurança de juízo que
explicam porque pouco depois,
quando era crítico cinematográfico de "O Diário de São Paulo",
Paulo Emilio dizia que era o melhor", afirma Candido.
Já "Os Caraíbas Negros de Honduras" corresponde à tese de doutorado de antropologia que Coelho defendeu nos EUA em 1954.
Ele exerceu a carreira de docente
em Paris e na USP, onde dirigiu a
Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas.
O crítico pondera quanto à certa
mitificação da revista que circulava entre São Paulo e Rio de Janeiro, com tiragem de mil exemplares, e que reuniu intelectuais brasileiros de importância em início
de carreira. "Clima" não foi nenhum acontecimento decisivo.
Era uma boa revista, na qual um
grupo de jovens começou a se
manifestar intelectualmente, mas
o que produziram de mais relevante foi posterior", afirma o crítico literário.
Leia, a seguir, a segunda parte
da entrevista feita com Antonio
Candido.
(VALMIR SANTOS)
Folha - Como o sr. conheceu Ruy
Coelho?
Antonio Candido - Conheci Ruy
Coelho quando entramos ambos
em 1939 no primeiro ano do curso
de ciências sociais da Faculdade
de Filosofia da USP. Aliás, ele entrou simultaneamente para o de
filosofia. Naquele tempo logo me
impressionaram nele algumas
coisas. Em primeiro lugar a perfeição com que falava francês sem
nunca ter saído do Brasil, e isso na
faculdade era importante, porque
quase todas as nossas aulas eram
nessa língua. Outra coisa que me
impressionou num rapaz tão moço foi a cultura. As suas leituras já
eram extensas em vários setores, e
ao comentá-las ficava evidente
uma de suas qualidades fundamentais: a capacidade excepcional de concentração. Era também
amador bem informado de música, conhecendo muitos compositores clássicos e modernos.
Logo nos juntamos a alguns jovens licenciados, formando um
grupo agradável, alegre, de rapazes em moças. Uma das grandes
contribuições da faculdade de filosofia foi dar oportunidade às
mulheres, que mal participavam
das faculdades tradicionais. Saíamos juntos, íamos ao cinema e
aos concertos, frequentávamos
sobretudo a confeitaria Vienense,
na rua Barão de Itapetininga. E
passeávamos tranquilos, a qualquer hora, por aquela São Paulo
limpa e segura de pouco mais de
um milhão de habitantes.
Folha - Seis décadas depois, como
o sr. avalia a geração "Clima"?
Candido - O "grupo de "Clima'"
era formado por moças e rapazes
em número variáveis, mas só uma
minoria trabalhou e escreveu na
revista: Antonio Lefèvre, Cícero
Cristiano de Sousa, Décio de Almeida Prado, Gilda de Moraes
Rocha, Lourival Gomes Machado, Paulo Emílio Salles Gomes,
Ruy Coelho e eu. Muitos colaboradores não eram do grupo. Éramos muito ligados afetivamente e
exercemos influência uns sobre
os outros. Quase todos acabaram
se tornando intelectuais conhecidos nos setores em que trabalharam e que começaram a praticar
em "Clima". Lembro, por exemplo, Décio na crítica teatral, Lourival na crítica de arte e Paulo Emílio na de cinema. Ruy era, como
vimos, um caso especial, escreveu
para todas as seções e em todas
mostrou capacidade.
Folha - A memória de "Clima" está bem recuperada? O livro vem
preencher uma lacuna?
Candido - É preciso não exagerar. "Clima" não foi nenhum
acontecimento decisivo. Era uma
boa revista, na qual um grupo de
jovens começou a se manifestar
intelectualmente, mas o que produziram de mais relevante foi
posterior. Como em seguida alguns colaboradores se projetaram, pode haver a tendência de
supervalorizar o que fizemos nela.
Ruy foi dos que manifestaram
mais cedo aquilo de que éramos
capazes. Este livro revela nível excepcional para um jovem de 20
anos, naquele meio ainda provinciano que era São Paulo.
TEMPO DE CLIMA - Autor: Ruy Coelho.
Org.: Antonio Candido e Sociedade
Científica dos Estudos da Arte. Prefácio:
Gilda de Mello e Souza. Lançamento:
editora Perspectiva. Quanto: R$ 15 (140
págs.).
OS CARAÍBAS NEGROS DE HONDURAS
- Autor: Ruy Coelho. Lançamento:
editora Perspectiva. Quanto: R$ 20 (216
págs.). Na internet:
www.editoraperspectiva.com.br
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