São Paulo, sexta-feira, 26 de novembro de 2004

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CINEMA

Após fazer sucesso em festivais, candidato uruguaio ao Oscar de melhor filme estrangeiro estréia hoje no Brasil

Farsa familiar move trama de "Whisky"

Divulgação
Cena do longa uruguaio "Whisky", de Pablo Stoll e Juan Pablo Rebella, que estréia hoje no Brasil


SILVANA ARANTES
DE BUENOS AIRES

Para arrancar um esboço de sorriso de seus retratados, o fotógrafo pede: "Digam "uísque'". Nessa palavra, que resume o artifício para aparentar o que não se sente e camuflar o desconforto em solicitude, os cineastas uruguaios Pablo Stoll, 30, e Juan Pablo Rebella, 30, encerraram o tema de seu segundo longa-metragem.
"Whisky" estréia hoje em circuito comercial brasileiro, com o respaldo de uma bem-sucedida carreira em festivais, que começou com a seleção para a mostra Um Certo Olhar, em Cannes (França), em maio passado.
Três meses mais tarde, o filme arrebatou na competição latina de Gramado, no Brasil, os Kikitos de melhor longa-metragem segundo os júris oficial e popular e melhor atriz (Mirella Pascual).
Mirella interpreta Marta, a abnegada gerente de uma fábrica de meias em visível decadência. Todo dia ela faz tudo sempre igual, até que o patrão a convida para tomar parte numa farsa familiar.
Do Brasil, chegará o irmão do industrial decadente, abrindo um parêntese numa longa ausência do Uruguai, onde o que permaneceu cuidou sozinho da mãe, em sua arrastada despedida da vida. O patrão de Marta quer fingir para o irmão que divide um lar (e uma vida) com uma mulher.
As fotos do casal -falso como seus sorrisos- se espalham pela casa, como prova da vida conjunta. "Whisky" constrói toda a sua narrativa muito mais em imagens do que em diálogos -raros e superficiais, já que os personagens se recusam à entrega e à intimidade. O filme consegue retratar com sutileza seus estados de espírito, numa inteligente alternância de cenários (interiores e exteriores).
Para demonstrar o acerto de contas familiar, "Whisky" se serve de uma literal mesa de apostas, onde o acaso da sorte define ganhadores e perdedores.
Sucesso de público no Uruguai, com distribuição assegurada em países como Alemanha, Argentina, França, Japão e Noruega, "Whisky" é o candidato uruguaio na corrida pelo Oscar de melhor filme estrangeiro de 2005, em que o brasileiro "Olga", de Jayme Monjardim, também busca um lugar entre os cinco finalistas.
"Não havia outra escolha. Este foi o único filme uruguaio realizado no ano", diz Stoll, minimizando o feito da indicação.
Declaradamente avessos à engrenagem comercial que move a indústria do cinema, os cineastas (que ganham a vida na publicidade) nem sequer pretendem ir a Los Angeles participar da entrega, caso sejam indicados. "Fazemos cinema por razões muito distintas do tapete vermelho."
Independentemente do desinteresse de seus diretores pelo apreço dos acadêmicos de Hollywood, "Whisky" se junta aos postulantes brasileiro e argentino ("O Abraço Partido", de Daniel Burman) na escolha de personagens judeus para suas tramas -característica que costuma cativar os votantes no Oscar.
"Não tratamos do judaísmo de maneira muito aberta em nosso filme", diz Stoll -e é fato.
A origem judaica dos personagens Herman e Jacobo Köller se deve ao fato de que "a maior parte dos industriais têxteis no Uruguai são judeus", como lembra o diretor. Aí incluídos os parentes do produtor do filme, Fernando Epstein, que colaborou no roteiro e contribuiu com essa idéia.
O fio da trama volta a ser uma história de família.


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