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"Globalistas" buscam sons periféricos
DJs como Diplo, Manga Bo e Dolores misturam ritmos que vão do hip hop norte-americano ao dancehall jamaicano
Inspirados nos sons mais urbanos das periferias, artistas negam que trabalhos tenham como fonte inicial a "world music"
CAMILO ROCHA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A maioria dos DJs costuma
direcionar seus ouvidos para
algumas poucas mecas musicais do Primeiro Mundo, como
Nova York, Londres, Berlim e
Paris. Nesta década, porém,
emergiu uma nova categoria, a
dos DJs "globalistas", que viajam muito mais longe em suas
garimpagens musicais.
Nomes como Diplo, DJ Dolores, Maga Bo, DJ/rupture,
Ghislain Poirier e Wayne&Wax
constroem sets incrivelmente
variados, que podem ter hip
hop americano, tecno alemão
ou electro francês, mas também soca de Trinidad, rap marroquino, funk carioca, kuduro
de Angola, dancehall jamaicano, o grime das Cohabs londrinas ou a cumbia colombiana.
A exposição desses ritmos
"periféricos" já influencia artistas em diferentes esferas como
a banda Bloc Party e os DJs/
produtores Simian Mobile Disco e Samim (que teve um dos
hits do ano com "Heater", no
qual juntou cumbia com tecno). Depois tem o fenômeno da
anglo-cingalesa MIA, a primeira popstar a sair dessa tendência e que lançou neste ano o elogiado álbum "Kala".
Seria tudo isso uma nova
roupagem para o desgastado
termo "world music"? Ao conversar com a Folha por telefone, o DJ e produtor canadense
Ghislain Poirier, que acaba de
lançar o álbum "No Ground
Under" pelo selo Ninja Tune
(da dupla inglesa Coldcut), nega: "World music é mais exótico, os sons que tocamos são
mais urbanos. Eles vêm de um
cenário comum: pessoas sem
muito dinheiro, fazendo música em estúdios caseiros ou num
laptop. É algo mais urgente".
Graças a um maior acesso à
internet e à tecnologia, em todo o mundo há uma proliferação sem precedentes dos sons
das periferias dos países, boa
parte deles com fortes bases
eletrônicas e criados em laptops ou PCs surrados, muitas
vezes com softwares piratas, e
divulgados via blogs, sites e sets
dos DJs "globalistas".
O DJ e MC americano Wayne&Wax, que também é etnomusicólogo, batizou o movimento de "global ghettotech".
"Inventei essa frase para descrever uma estética emergente
entre certos DJs e blogueiros,
onde se mistura gêneros "globais" como hip hop, tecno e reggae, entre outros, com estilos
"locais'", explicou Wayne à Folha. "Mas sou contra a abordagem superficial e modista. Gosto de conhecer os contextos sociais e culturais que moldaram
esse sons", esclarece.
Pioneiros
Um dos "globalistas" pioneiros é o DJ/rupture, de Boston,
EUA, que primeiro chamou a
atenção com uma mixtape (set
mixado) chamada "Gold Teeth
Thief". O set deu tanto o que falar que figurou entre os dez melhores lançamentos de 2002 da
prestigiosa revista musical inglesa "The Wire".
Por meio de seu blog e programa de rádio "Mudd Up!",
Rupture transmite uma mescla
insana de ritmos de várias partes. Um de seus interesses especiais é a música maghrebi, do
norte da África. "Estou descobrindo [também] o mundo da
cumbia -existem muitas cenas
fascinantes, do passado e do
presente", conta o DJ.
O selo de Rupture, Soot, deve
lançar em alguns meses o álbum de estréia de outro nome
importante da cena "globalista": Maga Bo, um americano de
Seattle que mora no Rio desde
1999. Maga Bo já trabalhou
com brasileiros como BNegão,
MC Catra, Marcelo Yuka, Marcelinho da Lua e Digitaldubs.
No ano que vem, ele deve começar a dar aulas sobre produção digital na sede do AfroReggae, em Parada de Lucas, no
Rio. No momento, está em Addis Ababa, capital da Etiópia,
gravando com músicos locais e
pesquisando música etíope.
"Batidas eletrônicas são o
campo onde todo mundo pode
se entender. O computador,
que já foi chamado do primeiro
"instrumento folk universal",
está cada vez mais acessível. O
volume de música que pode ser
encaixada nesse "global ghettotech" está aumentando no
mundo. A morte das gravadoras tradicionais e o crescimento da distribuição de música na
internet estão ajudando essa
popularização", conta Maga Bo.
Já o DJ Dolores, representante brasileiro mais conhecido
dessa tendência, diz que "os
computadores são os tambores
de hoje, um instrumento primal que cada um pode usar do
seu jeito". Em 2004, Dolores
ganhou o prêmio de melhor DJ
na categoria "Club Global" da
Radio One, da BBC inglesa. Dolores acaba de chegar de vários
shows pelos EUA e México e no
ano que vem deve lançar o álbum "Um Real".
Diplo é o nome mais conhecido dessa safra de DJs/produtores. Esse americano de 29 anos
foi um dos principais divulgadores do funk carioca no exterior. Ex-namorado de MIA (cujo primeiro álbum ele co-produziu), Diplo tocou recentemente no Tim Festival.
Ele acredita que é importante retribuir as culturas locais.
Através do projeto Heaps Decent, ele vem fazendo música
com jovens aborígenes de um
centro de detenção de menores
da Austrália. Faixas devem sair
em breve, em parceria com o
selo australiano Modular.
"Já que essas subculturas, de
certa forma, me ajudam a ganhar a vida, fiz algo para ajudar
seu desenvolvimento", explica.
"Nos próximos meses, espero
fazer o mesmo na favela do
Cantagalo, no Rio, com a ajuda
do AfroReggae e do [antropólogo] Hermano Vianna."
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