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São Paulo, quinta-feira, 27 de março de 2003

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FESTIVAL DE CURITIBA

Peças e atitudes na 12ª edição do evento aludem ao conflito no Iraque; participantes do Fringe podem realizar manifestação

Ecos da guerra aportam em Curitiba

Lenise Pinheiro/Folha Imagem
Leonardo Alves, 14, e Rodolpho Pinotti, 18, em cena do espetáculo "Commedia Dell'Arte Ensina a Preparar Sopa de Pedra", que fez referências ao conflito no Iraque


VALMIR SANTOS
ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA

Curitiba acompanha um teatro de operações bem diverso daquele que está em jogo na guerra anglo-americana contra o Iraque.
São cerca de 3.700 pessoas entre artistas e profissionais da organização empenhados durante dez dias, até o próximo domingo, na batalha diária de levar uma média de 70 espetáculos ao público.
Palcos e ruas formam o nicho para histórias ou atitudes que aludem a conflitos do passado e do presente, como a lembrar que a humanidade repete seus erros.
No Fringe, a mostra paralela do Festival de Teatro de Curitiba, os três atores do espetáculo de rua "Commedia Dell'Arte Ensina a Preparar Sopa de Pedra" somam à maquiagem tradicional da máscara a palavra "paz".
"A peça fala da tolerância em relação ao próximo, exatamente o que faltou para que não acontecesse a guerra", afirma o diretor Valter Vanir Coelho, 28, da Cia. de Teatro e Poesia sem Máscaras, de São José dos Campos (SP).
De Belo Horizonte, o diretor Luiz Paixão encena "Troianas", um clássico do dramaturgo grego Eurípides. A disputada cidade de Tróia é convertida aqui em campo de concentração nazista.
"Eurípides é de uma atualidade apocalíptica. O ponto principal é o interesse comercial que está por trás de toda guerra. Ele denuncia isso lá na Grécia Antiga, na luta pela roda de oleiro na região do mar Egeu. Hoje, a gente vê os EUA invadindo o Iraque com interesses comerciais bastante claros", diz Paixão, 42.
A dramaturgia político-humanista do alemão Bertolt Brecht é representada por "A Peça Didática de Baden Baden sobre o Acordo", escrita antes da ascensão do regime nazista (1933-45).
"O texto discute a idéia da revolução permanente contra poderes ditatoriais, fascistas, transformando o indivíduo para transformar o mundo. Isso é pertinente à sociedade de consumo em que vivemos", diz o diretor Marcelo Lazzaratto, 36.
Na Mostra Oficial, o grupo Parlapatões coloca parênteses na comicidade para tratar da tragédia da vez em "As Nuvens e/ ou Um Deus Chamado Dinheiro", conjunção de duas peças do comediógrafo grego Aristófanes, que viveu há cerca de 400 anos antes de Cristo.
Durante uma fala-rap, com cédula de cem dólares estampada numa persiana ao fundo, um dos personagens cita a transmissão da rede Rádio e Televisão Portuguesa (RTP) no primeiro pronunciamento de George W. Bush, na noite de 22 de março.
Uma câmara captou o presidente dos EUA treinando fala e sendo penteado para entrar ao vivo. "Aquela imagem é histórica. O Bush parecia um boneco, sorrindo em alguns momentos, numa cena patética, senão trágica, para quem ia matar centenas", afirma o ator e palhaço Hugo Possolo, 40.
A montagem de "Os Sete Afluentes do Rio Ota", texto do canadense Robert Lepage, com direção de Monique Gardenberg, rememora a insensatez das bombas que caíram sobre Hiroshima e Nagasaki durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45). "É muito assustador ver que depois de cerca de 60 anos a história se repete", diz Monique.
Em "João and Maria", sobre os malefícios da mídia, a curitibana Cia. Senhas invocou a paz com um minuto de silêncio em cena aberta. Hoje pela manhã, os artistas que participam do Fringe estão convocados para um encontro que deverá definir uma manifestação contra a guerra.
O primeiro bombardeio ao Iraque aconteceu na quarta-feira passada (horário brasileiro). Na noite seguinte, a paulistana Fraternal Cia. de Arte e Malas-Artes abriu o festival com "Auto da Paixão e da Alegria". Uma tempestade com efeitos naturais de relâmpagos e trovões desabou sobre o teatro Ópera de Arame.

ilustrada online
Confira a programação completa do festival em
www.folha.com.br/especial/2003/festivaldeteatrodecuritiba/


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