|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Deodato traz "sabor brasileiro"
Arranjador reconhecido nos EUA e na Europa volta para shows no Brasil após 20 anos
Pianista trabalhou no Brasil com medalhões da bossa nova, como Tom Jobim, e depois assinou hit do Kool & The Gang, entre outros
RONALDO EVANGELISTA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Hoje, enquanto você lê esta
reportagem, Eumir Deodato
está em São Paulo, preparando-se para fazer seu primeiro show
em terras brasileiras em quase
duas décadas.
Pouco mais de duas semanas
atrás, quando Deodato atendeu
a Folha ao telefone, estava em
um hotel na Alemanha, preparando-se para um show que faria ali horas mais tarde.
Nosso assunto principal:
exatamente o porquê de, mesmo com respeito e admiração
internacionais que garantem
apresentações em lugares tão
distantes, demorar tanto para o
músico ter a oportunidade de
se apresentar em seu país.
"O Brasil é um dos lugares
em que me conhecem menos",
explica ele, resignado. "Santo
de casa não faz milagre, né?
Quando fiz sucesso, ouvi críticas do tipo "Ah, fez sucesso, sim,
mas... podia ter sido com samba-canção". Ou seja: não explica
nada, é burrice. Nem me preocupo muito, quem responde a
burrice acaba ficando burro."
Desta vez é diferente. Ele
chega ao país cercado de interesse, para se apresentar na
quarta e na quinta como convidado da Orquestra Jazz Sinfônica dentro da série "Jazz+",
em que diferentes convidados
apresentam seus repertórios
acompanhados da orquestra.
Além disso, o compositor, arranjador, produtor e pianista
aproveita para fazer sábado e
domingo apresentações menores, tocando no formato de trio.
Deodato também se apresenta no Rio, nos dias 3 e 4 de
abril, na Sala Cecília Meirelles.
A idéia, ele conta, é condensar toda a sua longa história no
piano. Quando o carioca autodidata Deodato começou na
música, nos anos 60, não era
mais do que um adolescente,
um garoto-prodígio no meio
dos gênios da bossa nova.
Por trás de grupos como Os
Gatos, Os Catedráticos, Roberto Menescal e Seu Conjunto,
mostrou enorme talento para
arranjos -e em pouco tempo
se tornou efetivamente arranjador de gente grande da música brasileira.
Não demorou para estar comandando discos de artistas
como Tom Jobim, Milton Nascimento, Marcos Valle, Astrud
Gilberto, Wilson Simonal, Elis
Regina e outros. Até que percebeu que não tinha muito mais a
fazer por aqui.
"Chegou um momento em
que eu estava escrevendo de
um jeito que os artistas não entendiam", acredita. Como eu
não tinha compromisso com
ninguém, resolvi sair fora."
A música de Deodato poderia
ser classificada na área do jazz
fusion, embora ele mesmo não
goste dessa definição. Ele combina elementos do jazz com
funk e referências brasileiras.
Nos EUA
Começava ali a segunda fase
de sua carreira. Mudou-se para
os EUA e logo já estava criando
arranjos para luminares da música americana como Roberta
Flack, Wes Montgomery e Stanley Turrentine.
Graças ao sucesso de seus arranjos e da série de discos solo
que lançou nos anos 70 pela
gravadora CTI (especialmente
o da conhecida música "2001"),
ele se tornou um dos arranjadores mais requisitados do
mundo naquele momento. Depois, assumiu a batuta como
produtor do conjunto Kool &
The Gang e chegou ao megasucesso com "Celebration".
Mais recentemente com arranjos esporádicos escritos para bandas e artistas como Penélope, Titãs, Herbert Vianna,
Carlinhos Brown e Marisa
Monte, Deodato encontrou
também nova lufada de criatividade ao trabalhar com a cantora islandesa Björk, fã notória
de música brasileira -e com
quem Deodato se apresentou
no Brasil em 1996.
"Ela é difícil, artista não gosta
de competição", conta, rindo.
"Ela quer ser vista como produtora, cantora, arranjadora, então não gosta de dizer que eu tive qualquer coisa a ver com a
produção, me pôs apenas como
arranjador. Tudo bem, estou
satisfeito, mas foi muito mais."
E, mesmo sem se apresentar
regularmente por aqui, o Brasil
continua uma influência? "É
uma pena eu não ter feito mais
sucesso no Brasil", diz ele.
"Porque o meu trabalho é sempre valorizar as coisas brasileiras. Eu uso ritmos diferentes,
mas o meu piano sempre teve
sabor brasileiro. No próprio
"2001", que é um funk baseado
em "Assim Falou Zarathustra",
do Strauss, eu coloquei no meio
um baiãozinho que eu tinha escrito quando era garoto, e deu
tudo certo. Não tem que ser
bossa nova pra dizer que é brasileiro. É só prestar atenção que
está tudo ali."
Texto Anterior: Cecilia Giannetti: Palácio do suicida Próximo Texto: Deodato em SP Índice
|