São Paulo, terça-feira, 27 de março de 2007

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Deodato traz "sabor brasileiro"

Arranjador reconhecido nos EUA e na Europa volta para shows no Brasil após 20 anos

Pianista trabalhou no Brasil com medalhões da bossa nova, como Tom Jobim, e depois assinou hit do Kool & The Gang, entre outros


RONALDO EVANGELISTA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Hoje, enquanto você lê esta reportagem, Eumir Deodato está em São Paulo, preparando-se para fazer seu primeiro show em terras brasileiras em quase duas décadas.
Pouco mais de duas semanas atrás, quando Deodato atendeu a Folha ao telefone, estava em um hotel na Alemanha, preparando-se para um show que faria ali horas mais tarde.
Nosso assunto principal: exatamente o porquê de, mesmo com respeito e admiração internacionais que garantem apresentações em lugares tão distantes, demorar tanto para o músico ter a oportunidade de se apresentar em seu país.
"O Brasil é um dos lugares em que me conhecem menos", explica ele, resignado. "Santo de casa não faz milagre, né? Quando fiz sucesso, ouvi críticas do tipo "Ah, fez sucesso, sim, mas... podia ter sido com samba-canção". Ou seja: não explica nada, é burrice. Nem me preocupo muito, quem responde a burrice acaba ficando burro."
Desta vez é diferente. Ele chega ao país cercado de interesse, para se apresentar na quarta e na quinta como convidado da Orquestra Jazz Sinfônica dentro da série "Jazz+", em que diferentes convidados apresentam seus repertórios acompanhados da orquestra.
Além disso, o compositor, arranjador, produtor e pianista aproveita para fazer sábado e domingo apresentações menores, tocando no formato de trio.
Deodato também se apresenta no Rio, nos dias 3 e 4 de abril, na Sala Cecília Meirelles.
A idéia, ele conta, é condensar toda a sua longa história no piano. Quando o carioca autodidata Deodato começou na música, nos anos 60, não era mais do que um adolescente, um garoto-prodígio no meio dos gênios da bossa nova.
Por trás de grupos como Os Gatos, Os Catedráticos, Roberto Menescal e Seu Conjunto, mostrou enorme talento para arranjos -e em pouco tempo se tornou efetivamente arranjador de gente grande da música brasileira.
Não demorou para estar comandando discos de artistas como Tom Jobim, Milton Nascimento, Marcos Valle, Astrud Gilberto, Wilson Simonal, Elis Regina e outros. Até que percebeu que não tinha muito mais a fazer por aqui.
"Chegou um momento em que eu estava escrevendo de um jeito que os artistas não entendiam", acredita. Como eu não tinha compromisso com ninguém, resolvi sair fora."
A música de Deodato poderia ser classificada na área do jazz fusion, embora ele mesmo não goste dessa definição. Ele combina elementos do jazz com funk e referências brasileiras.

Nos EUA
Começava ali a segunda fase de sua carreira. Mudou-se para os EUA e logo já estava criando arranjos para luminares da música americana como Roberta Flack, Wes Montgomery e Stanley Turrentine.
Graças ao sucesso de seus arranjos e da série de discos solo que lançou nos anos 70 pela gravadora CTI (especialmente o da conhecida música "2001"), ele se tornou um dos arranjadores mais requisitados do mundo naquele momento. Depois, assumiu a batuta como produtor do conjunto Kool & The Gang e chegou ao megasucesso com "Celebration".
Mais recentemente com arranjos esporádicos escritos para bandas e artistas como Penélope, Titãs, Herbert Vianna, Carlinhos Brown e Marisa Monte, Deodato encontrou também nova lufada de criatividade ao trabalhar com a cantora islandesa Björk, fã notória de música brasileira -e com quem Deodato se apresentou no Brasil em 1996.
"Ela é difícil, artista não gosta de competição", conta, rindo. "Ela quer ser vista como produtora, cantora, arranjadora, então não gosta de dizer que eu tive qualquer coisa a ver com a produção, me pôs apenas como arranjador. Tudo bem, estou satisfeito, mas foi muito mais."
E, mesmo sem se apresentar regularmente por aqui, o Brasil continua uma influência? "É uma pena eu não ter feito mais sucesso no Brasil", diz ele. "Porque o meu trabalho é sempre valorizar as coisas brasileiras. Eu uso ritmos diferentes, mas o meu piano sempre teve sabor brasileiro. No próprio "2001", que é um funk baseado em "Assim Falou Zarathustra", do Strauss, eu coloquei no meio um baiãozinho que eu tinha escrito quando era garoto, e deu tudo certo. Não tem que ser bossa nova pra dizer que é brasileiro. É só prestar atenção que está tudo ali."


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