São Paulo, sexta-feira, 27 de março de 2009

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CINEMA/ESTREIAS

Crítica/"Simplesmente Feliz"

Fácil e agradável de ver, filme mostra felicidade perpétua

Longa de Mike Leigh aborda professora que vê apenas o lado positivo da vida

CRÍTICO DA FOLHA

No fabulário de Mike Leigh há lugar para quase tudo, sobretudo no feminino. Existe a mãe branca com filha negra (ou vice-versa), assim como Vera Drake e sua estranha profissão. Elas desfilam em geral por um mundo remediado, quando não pobre, de sotaques suburbanos, de tipos esquisitos.
Assim é com a Poppy (Sally Hawkins) de "Simplesmente Feliz", professora primária tremendamente voltada a ver da vida apenas o que ela pode ter de positivo. A primeira cena é sintomática: Poppy deixa sua bicicleta na calçada e entra em uma livraria. Ao sair, a bicicleta não está lá, foi roubada. Conversando com a amiga, ela diz apenas que a bicicleta deixou o ninho, ganhou vida própria.
Não vai comprar outra. Vai aprender a guiar. Entre o trabalho na escola, os embalos de fim de semana, a presença da irmã, Poppy é uma pessoa disposta a partilhar seu modo de experimentar o mundo e fazer os outros também felizes. Funciona melhor, pelo jeito, dentro dos muros da escola, onde as crianças são receptivas a suas maneiras. Menos bem num mundo de adultos neuróticos, como Scott (Eddie Marsan), o instrutor de autoescola.

Água com açúcar
Como as fábulas têm sempre um caráter normativo, seria o caso de indagar se o certo nesse mundo conturbado é procurar agir como Poppy, aceitando as coisas como são e tentando melhorá-las.
Ou antes: será isso de fato possível fora do âmbito da escola primária ou de certas atitudes religiosas? Eis a questão que o filme nos lega. Poppy é uma pessoa tão aberta à vida que pode se encontrar com um estranho mendigo, em um local ermo, sem nenhum medo do contato com o outro (uma sequência tão mais estranha quanto poderia ser muito bem suprimida, do ponto de vista estrito da narrativa). Fácil e agradável de ver, existe algo de incomodamente água com açúcar no filme. É como se a personalidade de Poppy expressasse uma disposição para a felicidade que não condiz com o mundo.
Ainda que seja assim, mil vezes é preferível ver essa perpétua felicidade do que as bochechas tristes de Vera Drake -do longa anterior de Leigh, "O Segredo de Vera Drake". A cena inicial, com Poppy passeando na bicicleta, é bela e provavelmente a que melhor sabe expressar o que sua atitude diante do mundo propõe não de conformismo, mas de liberdade. (INÁCIO ARAUJO)


SIMPLESMENTE FELIZ

Direção: Mike Leigh
Produção: Reino Unido, 2008
Com: Sally Hawkins, Alexis Zegerman
Onde: em cartaz no Cine Bombril, Reserva Cultural e circuito
Classificação: não indicado a menores de 14 anos
Avaliação: bom



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