São Paulo, sexta-feira, 27 de abril de 2007

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Banda reproduz Beatles na íntegra

Grupo cover em atividade há 27 anos, Beatles4Ever recomeça projeto The Complete Works hoje, em São Bernardo

Com 56 guitarras e uma peruca, Marcus Rampazzo, nosso George Harrison, lidera banda que reencarna o quarteto da Liverpool


IVAN FINOTTI
EDITOR DO FOLHATEEN

Reza uma lenda do rock que, se você se separar da sua mulher e, na divisão do espólio, ela lhe deixar o "Álbum Branco" dos Beatles, significa que ela ainda te ama. Eis uma boa razão, mas não a única, para ficar atento quando o Beatles 4Ever, um dos covers mais antigos em atividade no país -27 anos-, resolve subir ao palco para tocar o "Álbum Branco".
A outra razão é que o show, que aconteceu anteontem no Crowne Plaza, faz parte de um projeto cartesiano e bizarro: 1) reproduzir todos os discos dos Beatles; 2) em ordem cronológica; 3) com as canções na seqüência original em que aparecem nos vinis; 4) um álbum por mês, totalizando 16 espetáculos, iniciados em janeiro de 2006; 5) nota por nota, sem intervenções interpretativas.
O grande responsável pelo projeto The Beatles Complete Works (obra completa dos Beatles) é um professor de música bem-humorado chamado Marcus Rampazzo. Fundador e único remanescente original do Beatles 4Ever, Rampazzo é o nosso George Harrison.
Rampazzo é um homem modesto e demora mais de meia hora para revelar seu trunfo: em 1989, fez chegar ao George Harrison real uma fita em que tocava canções do ídolo. Inicialmente, Harrison achou que fosse ele próprio tocando. Impressionado com a semelhança, gravou uma mensagem de elogio ao brasileiro, que pode ser ouvida no site da banda: www.beatles4ever.com.br.
Além do elogio, Rampazzo possui um estúdio de gravação e um museu com 56 guitarras iguais às do beatle, junto de sua escola de música na Mooca (tel. 0/xx/11/6604-8090). Tem ainda, aos 52, uma peruca de cabelos naturais. "Tive que fazer no ano passado para os shows, sabe como é..."
Rampazzo é um homem modesto, mas está cansado. Tem inúmeras reclamações a respeito do projeto em que se meteu: "Veja só, um músico clássico pode ler partituras. Eu tenho que decorar os discos nota por nota e ainda saber as letras. É injusto". "Nosso Paul anterior não agüentou. Achou loucura. O espaço de um mês entre cada álbum é curto; é cruel."
"Depois que terminar o "Abbey Road", ainda tem os "Past Masters" [duas coletâneas de compactos e raridades], os shows de número 15 e 16. Estou relutando... Acho que não vou fazer. Não quero fazer", parece resolver, de supetão.

Quatro Johns
Rampazzo é um homem modesto e está cansado; por isso, anda se irritando com Ringo Starr. Porque, ao contrário dos Beatles ingleses, no Beatles 4Ever quem manda é George Harrison e Ringo Starr.
Lennon e McCartney são marinheiros de primeira viagem, uma vez que a banda já teve quatro Johns e quatro Pauls. Já nosso Ringo Starr, também conhecido como Ricardo Felício, está no 4Ever desde os primórdios, ainda que sua atuação nos distantes anos 80 tenha sido como roadie, carregando amplificadores e afinando guitarras. Foi dele a concepção do Complete Works, e nosso Ringo, deve-se dizer, é purista.
Puristas, a bem da verdade, todos eles são. Rampazzo mostra como: "Vi recentemente na TV uma apresentação do Paul McCartney nos EUA. Ele deixou o guitarrista inventar um solo para "Let It Be". Um solo ridículo! Rolei de ódio no sofá!".
Mas há níveis diferentes de purismo, e o de George é diferente do de Ringo. "Por causa do purismo, não é permitido nos arranjos do Beatles 4Ever mudarmos sequer uma nota", brada Rampazzo. "Mas o músico acaba colocando um pouquinho da sua interpretação. Quando percebemos isso, temos que voltar atrás, matar a própria personalidade e imitar o original. É chato; é uma doença", resigna-se.

Informação secreta
Rampazzo é modesto, está cansado e até se irrita, mas é, acima de tudo, um homem honesto. Pois olhe só: "Meu solo preferido no "Álbum Branco" é o de "Honey Pie". Me lembra Django Reinhardt e estava louco para tocá-lo ao vivo, mas é aí que mora o perigo. Fui aos livros e descobri que quem tocou na gravação foi o John, não o George. Temos que fazer exatamente como os originais. Por isso, eu não poderia tocar".
"Então pensei em esconder essa informação. Porque, veja bem, o Fabio [Colombini, nosso John] não é tão beatlemaníaco. Se ele tiver um livro dos Beatles em casa, é muito. Eu tenho mais de cem! Só de discos piratas, tenho 80! Sem falar nas minhas guitarras e nos sete pianos e teclados iguais aos dos Beatles. Enfim, resolvi mentir."
Mas quando chegou a hora da reunião, você acha que o nosso George teve coragem? "Não tive. Perguntaram quem tocava o solo e eu contei...".
Anteontem, portanto, quem solou lindamente em "Honey Pie" foi o John. E se você perdeu o "Álbum Branco" (1968) e outros clássicos, como "Sgt. Pepper's" (1967), "Revolver" (1966) e "Rubber Soul" (1965), há uma boa notícia. A banda reinicia hoje todo o Complete Works, agora em São Bernardo do Campo, com o primeiro disco da banda "Please Please Me" (1963). O projeto será apresentado mensalmente no Teatro Lauro Gomes (r. Londrina com r. Helena Jacquey, Rudge Ramos, tel.: 0/xx/11/4368-3483).
Para além do Complete Works, O Beatles 4Ever vai apresentar o "Magical Mistery Tour" (1967) na Virada Cultural em Sampa, em um palco montado na Rua Barão de Itapetininga, às 6h da manhã do próximo dia 6. E tem mais: no dia 19 de maio, os Beatles brasileiros animam um jantar dançante na churrascaria Costela Brasileira, em Guarulhos.
Sobre esse assunto tabu, Rampazzo tem uma frase pronta que mostra que ele não é só modesto, cansado, irritável e honesto. A frase prova que Rampazzo também é um homem realista: "Quando você vê, está cheirando picanha. É, amigo, o sonho acabou mesmo".


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