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POP
"Demon Days", novo CD lançado pelo quarteto, tem dub, rap, indie e rock
Gorillaz substitui a celebração pela melancolia e pelo soul
THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL
Se é verdadeira a afirmação de
que as piadas perdem a graça
depois de contadas uma vez, então a do Gorillaz ainda não terminou. Mais do que isso, jogou a
piada para o outro lado: este segundo álbum da banda-cartum
de Damon Albarn (líder do sério
Blur) é tido, junto do esperado
novo CD do Coldplay, como uma
das poucas esperanças da EMI de
salvar-se da bancarrota.
Então: uma banda-cartum, uma
brincadeira feita por um popstar
em clara decadência e por seu
amigo com quem dividia a casa (o
desenhista Jamie Hewlett, um dos
criadores da HQ "Tank Girl"),
que tirava onda desse mundo de
popstars cantando rap, é agora
uma aposta dos acionistas de uma
das maiores gravadoras do planeta. Onde termina a piada, mesmo?
O Gorillaz "é" um quarteto: o
vocalista 2D, o baixista Murdoc, a
japonesa Noodle e o baterista
Russel. Para dar vida a tudo isso e
lançar o primeiro disco, homônimo, em 2001, Albarn e Hewlett
chamaram gente como o produtor Dan "The Automator" Nakamura, a cantora Miho Hatori (Cibo Matto), o cubano Ibrahim Ferrer e o rapper Del tha Funky Homosapien.
Puxado pelo instantâneo hit
"Clint Eastwood" ("I ain't happy/
I'm feeling glad/ I got sunshine, in
a bag..."), o álbum vendeu, segundo a EMI, mais de 6 milhões de
cópias no mundo. Era um disco
alegre, bem-humorado, pop -e
até por isso teve forte apelo com
as crianças. Mais ironia: após tentativas de Blur, Oasis, Radiohead
e tantos outros nos anos 90, foi o
virtual Gorillaz a banda britânica
a conquistar a América.
Mas isso foi há quatro anos. De
lá para cá, Gorillaz estampou seu
nome em duas compilações e gerou crias na Europa, nos Estados
Unidos e até no Brasil -vide o indescritível Dogão. A novidade
passou. A solução, então, para
Damon Albarn, estava na música.
Para este "Demon Days", trouxe gente nova para seu combo. O
disco foi produzido quase inteiramente por Danger Mouse, o DJ
americano que, no ano passado,
tomou o pop de assalto ao lançar
"The Grey Album", que misturava o "White Album", dos Beatles,
com o "Black Album", de Jay-Z.
Para cantar, entraram alguns
rappers, desde os conhecidos De
La Soul e Roots Manuva até o underground MF Doom.
O disco é bem variado, nada
monótono. Traz dub, rap de batidas quebradas, preguiçosas, indie
rock... músicas que transitam entre um monte de estilos, mas que
resistem e não param em nenhum
deles. Os vocais, em sua maioria,
são cortados, alterados e trazem
cadência paralela às canções.
Enquanto "Gorillaz" era uma
celebração, "Demon Days" é melancólico; menos funk, mais soul.
Após uma intro, "Last Living
Souls" abre o disco com um teclado gélido. Menos de dois minutos
depois, a canção muda para uma
balada quente; logo depois, voltam aqueles teclados frios.
Percussiva, "Kids with Guns"
traz a participação de Neneh
Cherry; "O Green World" é mais
electro e vem com um corinho.
"Dirty Harry" é a prima mais
sombria de "Clint Eastwood".
"Feel Good Inc.", o single que
vem sendo tocado nas rádios, é o
primeiro momento para cima do
disco, num vibrante rap proporcionado pelo De la Soul.
"Demon Days" ainda tem a ótima "Dare", psicodélica e dançante; "November Has Come", um
rap pontuado por interjeições; a
suja "White Light"; o ator Dennis
Hopper num monólogo em "Fire
Coming Out of the Monkey's
Head" e a dobradinha final,
"Don't Get Lost in Heaven" e "Demon Days", que se completam
com a ajuda do coro gospel da
London Community Gospel
Choir, com pianos e cordas.
Talvez este "Demon Days" não
venda 6 milhões, talvez a novidade tenha passado, talvez não seja a
solução definitiva para os problemas do mundo, mas a piada, em
vez de perder a graça, está sendo
aperfeiçoada.
Demon Days
Artista: Gorillaz
Lançamento: EMI
Quanto: R$ 35, em média
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