São Paulo, sexta-feira, 27 de maio de 2005

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POP

"Demon Days", novo CD lançado pelo quarteto, tem dub, rap, indie e rock

Gorillaz substitui a celebração pela melancolia e pelo soul

THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL

Se é verdadeira a afirmação de que as piadas perdem a graça depois de contadas uma vez, então a do Gorillaz ainda não terminou. Mais do que isso, jogou a piada para o outro lado: este segundo álbum da banda-cartum de Damon Albarn (líder do sério Blur) é tido, junto do esperado novo CD do Coldplay, como uma das poucas esperanças da EMI de salvar-se da bancarrota.
Então: uma banda-cartum, uma brincadeira feita por um popstar em clara decadência e por seu amigo com quem dividia a casa (o desenhista Jamie Hewlett, um dos criadores da HQ "Tank Girl"), que tirava onda desse mundo de popstars cantando rap, é agora uma aposta dos acionistas de uma das maiores gravadoras do planeta. Onde termina a piada, mesmo?
O Gorillaz "é" um quarteto: o vocalista 2D, o baixista Murdoc, a japonesa Noodle e o baterista Russel. Para dar vida a tudo isso e lançar o primeiro disco, homônimo, em 2001, Albarn e Hewlett chamaram gente como o produtor Dan "The Automator" Nakamura, a cantora Miho Hatori (Cibo Matto), o cubano Ibrahim Ferrer e o rapper Del tha Funky Homosapien.
Puxado pelo instantâneo hit "Clint Eastwood" ("I ain't happy/ I'm feeling glad/ I got sunshine, in a bag..."), o álbum vendeu, segundo a EMI, mais de 6 milhões de cópias no mundo. Era um disco alegre, bem-humorado, pop -e até por isso teve forte apelo com as crianças. Mais ironia: após tentativas de Blur, Oasis, Radiohead e tantos outros nos anos 90, foi o virtual Gorillaz a banda britânica a conquistar a América.
Mas isso foi há quatro anos. De lá para cá, Gorillaz estampou seu nome em duas compilações e gerou crias na Europa, nos Estados Unidos e até no Brasil -vide o indescritível Dogão. A novidade passou. A solução, então, para Damon Albarn, estava na música.
Para este "Demon Days", trouxe gente nova para seu combo. O disco foi produzido quase inteiramente por Danger Mouse, o DJ americano que, no ano passado, tomou o pop de assalto ao lançar "The Grey Album", que misturava o "White Album", dos Beatles, com o "Black Album", de Jay-Z.
Para cantar, entraram alguns rappers, desde os conhecidos De La Soul e Roots Manuva até o underground MF Doom.
O disco é bem variado, nada monótono. Traz dub, rap de batidas quebradas, preguiçosas, indie rock... músicas que transitam entre um monte de estilos, mas que resistem e não param em nenhum deles. Os vocais, em sua maioria, são cortados, alterados e trazem cadência paralela às canções.
Enquanto "Gorillaz" era uma celebração, "Demon Days" é melancólico; menos funk, mais soul.
Após uma intro, "Last Living Souls" abre o disco com um teclado gélido. Menos de dois minutos depois, a canção muda para uma balada quente; logo depois, voltam aqueles teclados frios.
Percussiva, "Kids with Guns" traz a participação de Neneh Cherry; "O Green World" é mais electro e vem com um corinho. "Dirty Harry" é a prima mais sombria de "Clint Eastwood". "Feel Good Inc.", o single que vem sendo tocado nas rádios, é o primeiro momento para cima do disco, num vibrante rap proporcionado pelo De la Soul.
"Demon Days" ainda tem a ótima "Dare", psicodélica e dançante; "November Has Come", um rap pontuado por interjeições; a suja "White Light"; o ator Dennis Hopper num monólogo em "Fire Coming Out of the Monkey's Head" e a dobradinha final, "Don't Get Lost in Heaven" e "Demon Days", que se completam com a ajuda do coro gospel da London Community Gospel Choir, com pianos e cordas.
Talvez este "Demon Days" não venda 6 milhões, talvez a novidade tenha passado, talvez não seja a solução definitiva para os problemas do mundo, mas a piada, em vez de perder a graça, está sendo aperfeiçoada.

Demon Days
     Artista: Gorillaz
Lançamento: EMI
Quanto: R$ 35, em média

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