São Paulo, quarta, 27 de maio de 1998

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Idéia é despersonalizar escrita

especial para a Folha

"Obra em Obras: o Brasil", título provisório do romance em andamento de Décio Pignatari, é, nas palavras do próprio autor, mais uma etapa na revolução já desencadeada por sua obra anterior, sobretudo poética, nas letras brasileiras -e internacionais.
"Esse romance, num certo sentido, segue a linha clássica de escritores que começam líricos e terminam políticos", diz.
Obra política, portanto, já que o autor se apresenta como um homem ideológico: "Não consigo pensar nem ler o mundo sem ideologia. Seja no mundo erótico-amoroso, no artístico-estético ou no sócio-econômico".
E como bom publicitário (trabalhou por 15 anos com isso), Pignatari sabe muito bem que a alma do negócio está em vender bem o seu peixe: "A idéia é despersonalizar o romance e a escritura".
Ué? E Beckett já não tinha proposto algo parecido há 40 anos? "Ele foi discípulo do Joyce. Todos eles fizeram isso. Até gosto dos escritores que não fazem teoria. No Brasil tivemos de ser didáticos, fazer a teoria e a prática", responde.
Então, de que se trata exatamente essa "revolução"? "Não escrevo por instinto. Esse projeto de prosa envolve uma complexidade crescente. Primeiro, é preciso aprender a escrever uma nova prosa. É inútil tentar imitar Joyce ou fazer o que foi feito pelos grandes prosadores", explica o autor, que depois de passar três anos enfurnado num sítio, sem grandes resultados, resolveu "mergulhar de volta no inferno da vida".
Muito bem, mas, na prática, em que consiste afinal esse "grande romance que pretende superar problemas individuais"?
"Não há um herói, um personagem. Não há um herói simplesmente individuado. O herói, se existe, ou anti-herói, se chama Brasil. É um romance de natureza épica, no sentido oswaldiano, rabelaisiano, uma leitura crítica, épica, irônica, cômica, grotesca e lírica do Brasil", esclarece.
No final das contas, Pignatari também já não se importa se seu grande romance brasileiro vier a ser chamado de "mais clássico": "Goethe também foi mais clássico no final da vida e nem por isso o que escreveu foi menor. Existe um experimentalismo implícito que diz respeito à estrutura. Não estou preocupado em fazer jogos de palavras. Estou interessado na estrutura da obra, onde acho que posso fazer melhor do que Cortázar e Cabrera Infante", arremata. (BC)



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