São Paulo, terça-feira, 27 de junho de 2000


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TEATRO
Com trama nonsense e jogo de "máscaras" entre personagens, nova peça de Flávio de Souza é lida hoje na Folha
"Algo Azul" propõe enigma no velório

VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Parece piada, mas Flávio de Souza adora velório. É um espaço dileto em sua dramaturgia. Em "Fica Comigo Esta Noite" (88), por exemplo, um defunto sai do caixão para "reviver" pendências com a mulher que o vela.
Na sua peça mais recente, "Algo Azul" (98), que será lida hoje na Folha (leia ao lado), o velório também é sugerido por flores e algumas cadeiras. Dispensa-se o caixão, mas seu ocupante desponta como terceiro personagem da trama.
A Viúva (sem nome) está sozinha na sala velando o marido. Todos os presentes foram tomar um café na esquina e a deixaram só. É neste momento que Angela entra em cena. Elas protagonizam um diálogo nonsense. Sobrepõem suas próprias "máscaras" de personagens e enredam outros, inclusive na entonação de voz, o que pode ser entendido também como um exercício metateatral.
"Todo mundo faz isso na vida, representando o tempo todo. Eu, por exemplo, me sinto um verdadeiro palhaço em determinadas situações, assim como me transformo quando estou de terno e gravata. Parece uma fantasia mesmo", diz Souza.
O enredo é intrincado de tal forma que não se pode detalhar muita coisa.
Há um mote real que inspirou o autor, um gesto radical de amor que um marido manifesta por sua mulher.
Esse enigma é delineado no próprio título. Mas o espectador só poderá desvendá-lo por inteiro na leitura de hoje à noite ou na montagem que, por enquanto, está ancorada no desejo de vê-la no palco. Só não se sabe quando, onde ou como, segundo o autor.
Sobre a utilização do velório como espaço cênico (nem sempre explícito, ressalva), Souza apela à psicologia humana. "Quem acaba de perder uma pessoa sente enorme necessidade de falar, sem pudores, sobre o morto e principalmente sobre si", acredita.
"Algo Azul" será lida por Lígia Cortez (Viúva), Patricia Gaspar (Angela) e Renato Scarpin (Ele, o morto). O próprio autor vai dirigir e pontuar as rubricas, aqui fundamentais para acompanhar a história.
Um exemplo:
"Angela - Ela falou tão bem de você. Com tanto carinho.
Viúva - Só falta você me dizer que ela disse que se arrependeu.
Angela - Não.
Viúva - (Imitando Angela) Isso ela não me disse.
Angela - (Imitando Malu) Credo!
(Elas conversam como se Viúva fosse Angela e Angela fosse Malu.)"
Essa brincadeira vertiginosa ocupa boa parte dos diálogos em "Algo Azul", exigindo bastante atenção do espectador.
Trata-se da 59ª peça de Souza. Ele confessa que tentou parar com a dramaturgia. "Está cada vez mais difícil convencer o público a sair de casa para ir ao teatro", argumenta. Mas desistiu. Continua escrevendo também roteiros para televisão e cinema.
Aliás, o 60º texto, "Peça Com Dois Atores e Pouco Cenário", está quase pronto. O assunto? Um dramaturgo em crise... Mais autobiográfico, impossível.
Atualmente Souza cria roteiros para um novo projeto da TV Cultura, "Ilha Rá-Tim-Bum".


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