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ANÁLISE
TMZ representa o mundo em transição
RONALDO LEMOS
COLUNISTA DA FOLHA
Em paralelo às notícias da
morte do Rei do Pop, outra notícia que ganhou destaque em
menor escala foi a de que as
TVs, os rádios e os jornais do
mundo foram "furados" pelo site TMZ, especializado em fofocas de celebridades.
Enquanto a mídia tradicional
lutava contra o tempo para
confirmar a morte do astro, o
TMZ já proclamava que ele havia sofrido uma parada cardíaca. E, pouco tempo depois, destemidamente afirmava que
Jackson havia morrido.
Essa notícia paralela chama a
atenção por pelo menos dois
pontos. O primeiro é o mais óbvio. A internet, em toda a sua
diversidade e complexidade,
estabelece um canal direto
muito mais rápido para a produção de notícias. Cada vez
mais, ela terá impacto mais direto na esfera pública.
A criação de "notícias", antes
privilégio da mídia tradicional,
tornou-se e irá se tornar cada
vez mais descentralizada, valendo-se de Twitter, Facebook,
YouTube, blogs, celulares e o
que vier depois. Esse fato, em
si, chama para a reinvenção da
mídia tradicional. É preciso se
reinventar para não se tornar
caixa de ressonância do que todo mundo já ficou sabendo antes. Já vi teses de doutorado e
editores de jornal dizendo que
a situação atual é a inversa. Que
a internet é a caixa de ressonância da mídia tradicional. Há
um quinhão de verdade nisso.
Mas a tendência, como o caso
Michael Jackson denota, é que
a situação se inverta.
O segundo ponto é verificar
que o TMZ, que vem sendo
apontado como herói das "novas mídias", na verdade é ligado
à Time-Warner. Nada mais mídia tradicional do que isso. No
entanto, vale notar que seu formato é muito mais próximo de
um blog/tablóide do que de um
jornal tradicional.
É como se o navio Time-Warner tivesse lançado uma
lancha de alta velocidade no
oceano das notícias. Essa "lancha" não tem as amarras do jornalismo tradicional, pode se
mover a uma velocidade muito
maior e, sobretudo, não tem de
obedecer aos protocolos de segurança do grande navio.
Em outras palavras, as regras
de cautela, apuração e confiabilidade não são as mesmas para
o site. Ele pode correr riscos. E,
por conta disso, por ser um produto híbrido entre nova e velha
mídia, talvez tenha sido destemido ao afirmar com tanta segurança a morte de Michael
Jackson.
A morte de Michael Jackson
e a forma como foi noticiada
simbolizam um mundo em
transição. Ninguém sabe ainda
para onde irá o jornalismo e como será formada a esfera pública nos próximos anos. E os desafios são enormes. Como reinventar não só as formas de participação, mas também uma
ética nova para a rede, uma ética que não seja nem ingênua
nem obsoleta? E que não seja
imposta, mas sim construída.
O fato é que não existe marcha a ré nesse processo, para
desespero dos saudosistas e das
viúvas do velho mundo. Vamos
ter de aprender a reinventar tudo a 1.000 quilômetros por hora. É hora de experimentação.
É hora de renovação de paradigmas. E de lembrar que o
mundo em que foi possível
existir alguém como Jackson
não existe mais.
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