São Paulo, segunda-feira, 27 de setembro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CINEMA

Programação do Foco África do Sul, no Festival do Rio, reúne filmes de ficção e documentários recentes do país

Jovens africanos levam maturidade à tela

DENISE MOTA
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Crianças e adolescentes são freqüentemente sábios no cinema africano, talvez porque, quando comecem a largar as fraldas, passem a entender e experimentar privações e provações suficientes para carimbá-los para a vida adulta. É o que mostram algumas das produções recentes do continente que o Festival do Rio traz em seu Foco África do Sul.
Premiado no festival de Berlim deste ano com o Urso de Cristal, na seção do evento alemão dedicada a filmes juvenis, "A Câmera de Madeira" descreve, na voz de uma criança, a gênese do destino de dois garotos que descobrem um revólver e uma câmera de vídeo entre os pertences de um morto. O que escolhe o equipamento transforma eventos, pessoas e histórias de sua vizinhança em alvo de interesse. O outro fará o mesmo, mas com a arma.
Pobreza, violência, marginalidade, desocupação, altas aspirações em contraste com modestas oportunidades compõem o cenário dos episódios da série "Yizo Yizo", um mosaico do dia-a-dia de jovens em busca de trabalho, formação profissional e/ou mudança de vida na periferia de Johannesburgo. O tom sombrio das narrativas faz par desconjuntado, e por isso chamativo, com a luz e as vibrantes cores das produções.

Documentários
No ano em que a África do Sul celebra uma década de democracia, dois documentários apresentam ao Brasil versões atualizadas do tenso convívio entre brancos e negros no país, a transformação de costumes, os resquícios de segregação e os conflitos culturais e emocionais que chegam a habitar a raiz da vida cotidiana, como nas relações familiares inter-raciais de "A Celebração" e na discriminação destinada às crianças de "Quero Ser Pavarotti".
"A Celebração" consegue conjugar com naturalidade e contundência religião, homossexualidade, a intimidade de um casamento misto numa sociedade pós-apartheid e até piadas ao mundo do cinema, ao contar a volta do ex-ativista e prisioneiro político Sipho Singiswa (diretor do documentário, ao lado da mulher, Gillian Schütte) à casa dos pais, para completar uma cerimônia de circuncisão que adiou por 23 anos.
É o retorno às tradições de um homem que lutou para construir o projeto de país igualitário e moderno do qual hoje participa. É também a exposição à família de seu modo de viver e a introdução da novidade num ambiente ainda autodefensivo. Será o momento em que o garoto, filho de um africano e uma descendente de holandeses, conhecerá os rituais de seu país -e a ocasião em que tabus da família, da pequena comunidade da qual fazem parte e da África do Sul virão à tona.
E o preconceito emerge com força em "Quero Ser Pavarotti", documentário em torno de Elton, garoto que deseja ser cantor lírico. O menino se apresenta para os turistas, para receber uns trocados. Mas, negro, é enxotado das ruas, com outros jovens como ele.
Elton vem de uma família pobre e desequilibrada, mas é talentoso e acabará ganhando atenção, aulas de canto, promessas, incentivos ocasionais. Porém, sábio que é, se conforma em não sonhar e planeja ser policial, porque, na vida, "é assim que as coisas são".


A CÂMERA DE MADEIRA. Ntshavheni Wa Luruli. Dias 4/10 (16h e 23h30) e 05/ 10 (18h), no Espaço Unibanco 3. 90 min.
YIZO YIZO. Teboho Mahlatsi, Angus Gibson e Andrew Donsunmu. Hoje (12h30) e amanhã (15h30), no C.C.Justiça Federal. Dia 29 (21h30), no Espaço Unibanco 3. 104 min.
A CELEBRAÇÃO. Sipho Singiswa e Gillian Schütte. Dias 2/10 (20h), no Espaço Unibanco 3, e 5/10 (12h30 e 16h20), no C.C.Justiça Federal. 48 min.
QUERO SER PAVAROTTI. Odette Geldenhuys. Dias 03/10 (20h), no Espaço Unibanco 3, e 5/ 10 (12h30 e 16h20), no C.C.Justiça Federal. 52 min.



Texto Anterior: Show/crítica: Mariano e Lubambo em concerto
Próximo Texto: Carol Castro atua em "blockbuster" argentino
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.