São Paulo, segunda-feira, 27 de novembro de 2000

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FESTIVAL DE BRASÍLIA
"O Chamado de Deus", de José Joffily, encerra a competição hoje com dossiê sobre vida eclesiástica

Documentário investiga vocação religiosa

JOSÉ GERALDO COUTO
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

O que leva um jovem brasileiro de hoje a se entregar à carreira religiosa? O documentário "O Chamado de Deus", de José Joffily, que encerra hoje a competição do 33º Festival de Cinema de Brasília, é construído em torno dessa questão.
Joffily disse à Folha que sua ambição inicial, quando começou a preparar o filme, era a de reconstituir a história da Igreja Católica no Brasil, principalmente a partir do início da República.
Depois de colher cerca de 30 horas de material de arquivo e depoimentos de autoridades eclesiásticas, o cineasta resolveu "jogar tudo fora" quando conheceu, na Romaria da Terra e das Águas, em Bom Jesus da Lapa (BA), um grupo de jovens que se preparava para entrar na ordem dos franciscanos.
"O que mais me impressionou foi o modo como eles se diziam "vocacionados" para o serviço de Deus. Ao mesmo tempo, manifestavam um compromisso muito grande com a nossa realidade social", diz Joffily.
"Acompanhei a rotina deles, seu trabalho com a comunidade e acabei fazendo um dossiê."
O cineasta decidiu então concentrar o foco de seu documentário em uns poucos personagens, todos eles jovens "vocacionados". Três deles são do grupo de franciscanos que ele encontrou na Bahia.
"A posição deles era ligada à chamada Teologia da Libertação, por isso resolvi completar o quadro procurando um grupo que representasse uma tendência oposta, mais conservadora", explica o diretor.
Esse outro grupo Joffily foi encontrar num seminário diocesano em Correias (RJ), onde ficou por um tempo procurando personagens representativos.
"Esses novos personagens são mais ligados à corrente da Renovação Carismática, que tem como proposta reconquistar fiéis com uma liturgia mais festiva", afirma Joffily.
Há no filme um longo depoimento do padre Marcelo Rossi, o expoente "carismático" mais conhecido, e cenas do evento "Em Nome do Pai", promovido pela corrente no Maracanã.
Por fim, Joffily propiciou um contato entre os grupos das duas tendências, mostrando para cada um deles as imagens do outro.
"Eles comentam, no filme, suas concordâncias e discordâncias. Por mais que eu pudesse ter simpatia por um ou outro lado, era impossível manipular seus depoimentos, pois todos se expunham com uma sinceridade muito grande."
Realizado em vídeo digital e depois transposto para a película, "O Chamado de Deus" custou pouco mais de R$ 200 mil.
Há dois meses, o filme foi premiado em Brasília com o troféu Margarida de Prata, conferido pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Apesar do prêmio, Joffily faz questão de dizer que não é católico e não entende nada de religião.
"Desde o início, eu queria falar da Igreja Católica para falar do Brasil, pois o catolicismo é a religião mais entranhada no país. Não é à toa que, toda vez que a igreja critica o poder, o governo manda os padres voltarem para a sacristia", diz o diretor, referindo-se a uma recente declaração do presidente.
A sessão de hoje no Cine Brasília é a primeira exibição pública de "O Chamado de Deus". Até agora só viram o filme os bispos da CNBB que lhe conferiram o prêmio da entidade e os membros da comissão de seleção do Festival de Brasília.
A cerimônia de premiação do festival será amanhã à noite. O resultado, dada a heterogeneidade do júri, é imprevisível, mas "Bicho de 7 Cabeças", de Laís Bodanzky, tem sido apontado como favorito.


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