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São Paulo, quinta-feira, 27 de novembro de 2003

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Reino dos BRINCANTES

Lenise Pinheiro/Folha Imagem
Fotomontagem com artistas populares que participam da encenação do conto "A Princesa de Bambuluá" na 1ª Mostra de Cultura Popular na Educação, em Natal


Encenação de conto recolhido por Câmara Cascudo junta alunos e grupos veteranos no RN

VALMIR SANTOS
ENVIADO ESPECIAL A NATAL

Neste final de semana, alunos do ensino médio de Natal e do interior do Rio Grande do Norte vão protagonizar um rito de passagem incomum na adolescência.
Emprestam ritmo, passos e cantigas (que já habitam o imaginário da maioria desde criança) às danças e folguedos de grupos folclóricos veteranos.
A quadra e parte da arquibancada do ginásio de esportes Humberto Nesi (capacidade para 10 mil) serão tomadas por cerca de 3.300 estudantes.
Eles vão se juntar aos artistas tradicionais na 1ª Mostra de Cultura Popular na Educação, que inclui brincadeiras como boi calemba (versão local do bumba-meu-boi nordestino), caboclinho (duas filas de integrantes que usam túnica, cocares e arco-e-flecha), espontão (coreografia que simula um bailado guerreiro, com movimentos de ataque e defesa) e coco (roda na qual os participantes improvisam ao som da percussão e ocupam o centro).
Todos, alunos e artistas, estarão representando a festa de casamento de João e a Princesa no conto popular "A Princesa de Bambuluá", que o folclorista potiguar Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) recolheu do pescador Francisco Ildefonso, o Chico Preto (1894-1966).
É a história de João (representado por Francis Júnior, sempre um aluno), rapaz que passa por maus bocados para libertar e desencantar a Princesa (Iraneide Bezerra da Silva) aprisionada em uma gruta por um feitiço.
A moça lhe promete casamento, mas, antes, retornará para o reino de Bambuluá, onde permanecerá por cinco anos, enquanto ele tomará lições com uma professora sobre os deveres de ofício e afeto de um príncipe.
O destino reserva mais agruras para o rapaz. A professora fica admirada pela sua inteligência e conspira para que ele se case com sua filha, e não com a Princesa. Esta o visita anualmente, como combinado, mas sempre encontra o noivo na modorra, sem saber que ele fora vítima de um copo de vinho com dormideira.
Desiludida, a Princesa deixa de visitá-lo no quinto ano e arruma outro pretendente. João desperta da armadilha da professora, foge para Bambuluá, onde toca um violino de cordas mágicas, a troco do que comer, e chega a tempo de impedir o casamento alheio.
Coloca sua musa a par de tudo e celebram a união com uma grande festa. Simples e direto assim, como nos melhores contos populares, mediados pelo maravilhoso, pelo sobrenatural, e imortalizados pela oralidade.
Essa história será resumida no prólogo narrado pelo bonequeiro Chico Daniel, 62. Enquanto sua voz, gravada, irradiar pelos alto-falantes, ele manipulará um mamulengo, ou joão-redondo, como aprendeu na infância com o pai que lhe transmitiu os conhecimentos do teatro de fantoche.
É a deixa para a festança. Personagens do conto, como João, a Princesa, o Imperador dos Pássaros, além de ícones da cultura potiguar, como a rendeira, o sanfoneiro, a ema, o boi e o galo surgem como bonecos de até nove metros, com faces e mãos esculpidos em isopor e sustentados por estrutura de ferro.
Além de compor o cenário, sob efeitos de luz e fogos de artifício, os bonecos articulados interagem com os coros de brincantes.
Quem coordena o espetáculo é uma equipe de seis pessoas da comissão de arte do boi-bumbá Garantido, da cidade de Parintins (AM). "Tomamos o cuidado em não descaracterizar o folclore local, apenas damos suporte para a movimentação de massa, para a articulação dos bonecos e para o tratamento visual do espetáculo", afirma o músico Fred Góes, que assina a direção-geral, acostumado a conduzir até 3.000 pessoas no desfile do Garantido no festival folclórico de Parintins.
Nas últimas semanas, ele e seus colegas acompanharam os ensaios em parceria com arte-educadores locais. Chegaram anteontem as caravanas com estudantes de cerca de 70 cidades do interior. "Além de assimilar a sua cultura, há o fator auto-estima dos alunos. Eles percebem que também podem ser artistas", diz Góes.

A fotógrafa Lenise Pinheiro e o jornalista Valmir Santos viajaram a convite da Secretaria da Educação, da Cultura e dos Desportos do RN


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