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FESTIVAL DE BRASÍLIA DO CINEMA BRASILEIRO
Seleção foi a mais magnífica que se viu desde os anos 70
INÁCIO ARAUJO
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
"Filme de Amor", vencedor
do prêmio de melhor filme
no Festival de Brasília do Cinema
Brasileiro, é, certamente, um filme impressionante: cada plano
parece estudado para trazer ao cinema um tanto das artes plásticas;
cada diálogo, para remeter à palavra sublime da literatura; cada
gesto, para enfatizar o movimento, isto é, o cinema.
A narrativa diz respeito a duas
mulheres e um homem que celebram o amor. São as Três Graças
da mitologia grega, que Julio
Bressane traz ao Rio, levando
adiante seu projeto de uma arte
que desconhece fronteiras de
tempo e espaço. Chega-se a momentos notáveis. Um deles, talvez
o mais forte, quando os personagens começam a flutuar no espaço, livres, plenos. Outros se devem às passagens de preto-e-branco a colorido, que realçam a
força pictórica da luz de Walter
Carvalho (ganhador do prêmio
de melhor fotografia -a julgar
pelos festivais, é, aliás, nosso único fotógrafo).
Talvez se possa pensar que a esse prêmio não é alheio o dispositivo intimidatório que a produção
mobiliza.
Existe beleza, sem dúvida, mas
existem também os signos muito
evidentes da beleza, e talvez possamos pensar no que ganha o cinema a imitar a beleza a que outras artes chegaram anteriormente. Existe a erudição formidável de
Julio Bressane, que abarca da música popular à filosofia, e sem dúvida subjuga o espectador e o júri.
No entanto, como lembra a frase
de Rafael Cansinos Assens, vivemos cercados pela beleza.
Ou seja: será que "Filme de
Amor" confronta a realidade com
o mesmo vigor que "O Signo do
Caos", de Rogério Sganzerla, ganhador do prêmio de melhor direção? Será que enfrenta contradições, tensiona o real e o controla
com o vigor que o faz "Garotas do
ABC", de Carlos Reichenbach,
prêmio especial do júri?
São, certamente, questões a lançar no encerramento do festival,
quase certamente o mais magnífico que se viu desde os anos 70. Foi
um momento em que o cinema
brasileiro permitiu-se parar para
refletir sobre a adoção de um modelo industrial que já mostrou
seus limites no resto do mundo, e
que procuramos hoje imitar (síndrome de Vera Cruz, talvez).
Há prêmios indiscutíveis. Melhor ator para Paulo César Pereio,
magra recompensa a "Harmada",
notável retorno de Maurice Capovilla. O melhor roteiro foi para
"Lost Zweig", de Sylvio Back. Prêmio lógico: era a rigor o único "filme de roteiro" da seleção. Mas
também é verdade que esse roteiro cria, bem à moda das co-produções internacionais, um enredo
de mocinho e vilão. O governo
Vargas paga o pato também pela
morte de Zweig. Já é um hábito.
Em poucas palavras: diante da
difícil tarefa de chegar a uma premiação equilibrada, o júri optou
quase sempre pelo caminho mais
fácil, menos polêmico. Sobrou então para "Garotas do ABC" e, em
menor medida, para "Harmada".
Já o júri da crítica foi reformulado há pouco, quando se chegou à
conclusão que um número excessivo de votantes estava tornando
o prêmio da crítica uma sucursal
do júri popular. Houve uma depuração, diminuiu-se o número
de eleitores. O prêmio da crítica
foi para "Glauber o Filme, Labirinto do Brasil", de Sílvio Tendler.
Ah, o prêmio do júri popular também foi para "Glauber o Filme".
O crítico Inácio Araujo viajou a convite
da organização do festival
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