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NELSON ASCHER
Eleições nos EUA
Independentemente de partido, cada presidente acaba compelido a governar desde o centro
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POR MAIS desinteressante que a
próxima eleição presidencial
norte-americana prometa ser,
não há como não acompanhá-la de
perto. Convém, logo de início, observar que, em toda parte, a imprensa
simpatiza com os democratas. Afinal, é seu partido que, no sistema do
país, representa a esquerda.
Desde pelo menos Franklin Delano Roosevelt é o Partido Democrata
que mais apostou no crescimento do
Estado, vendo na expansão de políticas governamentais a solução para
qualquer problema. Ademais, faz
meio século que os democratas vêm
se apropriando de causas consideradas progressistas e se tornaram os
auto-proclamados representantes
dos sindicatos, da burocracia estatal
que tanto contribuíram para inchar
e, sobretudo, das minorias e pseudo-minorias como negros, homossexuais, imigrantes ilegais e mulheres,
ou melhor, feministas.
Não que o Partido Republicano se
oponha frontalmente a tudo o que
os democratas consideram seu monopólio. Chegando ao poder, independentemente de seu partido, cada
presidente acaba compelido a governar desde o centro, não se indispondo, por exemplo, nem com o
funcionalismo público nem matando, através de impostos excessivos, a
galinha-dos-ovos-de-ouro da iniciativa privada. Daí que, no dia-a-dia da
administração, presidentes, governadores, senadores etc. egressos das
agremiações rivais tendam a se
comportar de maneira semelhante.
Embora os fatos mudem menos
que o discurso, este, amplificado pelos megafones da mídia, apresenta
as divergências como muito mais
extremas do que são. A rigor, a margem de manobra do governo em democracias maduras, nas quais as
principais escolhas já foram feitas, é
relativamente exígua. Ainda assim,
se é possível caracterizar o centro de
gravidade, a idéia central que norteia os republicanos, ela se resume
no antiestatismo. Menos impostos,
menos regulamentação, menos burocracia, eis o que os republicanos
em geral prometem. Quanto a cumprir, bom, isto já é outra história. Daí
que, no que diz respeito aos candidatos democratas, não haja mistério e,
no que concerne aos republicanos, a
pergunta central seja: quão a sério
cada qual se empenharia em implementar o programa de seu partido?
A disputa interna dos democratas,
entre os senadores Hillary Clinton e
Barack Obama, converteu-se numa
questão mais curiosa do que propriamente séria: seu partido tentará
"fazer" o primeiro presidente negro
ou o primeiro de sexo feminino da
história americana? Essa bobagem
se revela ainda mais ridícula se recordarmos que Hillary não seria, no
cargo, a primeira mulher, mas, sim, a
primeira mulher de alguém, isto é,
do penúltimo presidente, enquanto
Obama seria antes o primeiro mestiço na Casa Branca, pois ele é negro
apenas pela antiga lei racista (one
drop rule), de acordo com a qual bastava ter um remoto ancestral africano para que alguém fosse completamente negro. Como ambos são novos na política e nenhum deles é dado a responder diretamente às perguntas relevantes, tudo que se pode
supor é que sua orientação seja a
média genérica do partido.
O quadro republicano é mais populoso, mas nem por isso mais variado. Deixando de lado Ron Paul, o
texano lunático, os demais candidatos viáveis se compõem de partes
desiguais de conservadorismo em
alguma área e de compromisso com
o liberalismo nas outras. Rudy Giuliani, cujas chances decrescem, é um
falcão na política externa, mas sua
posição acerca do aborto e quesitos
similares espanta o eleitorado religioso. Mike Huckabee, um pastor
que atrai este último, mal o transcende e muitos de seus pontos de
vista têm mais a ver com os democratas do que com os republicanos.
John McCain é, para a base partidária, liberal demais principalmente
no que se refere à imigração ilegal.
Quanto ao candidato mais tipicamente republicano, o mórmon Mitt
Romney, ele é suspeito aos olhos dos
evangélicos e carece de carisma.
O que mais interessa ao restante
do planeta, uma área, aliás, na qual o
executivo dispõe de maior liberdade
de movimento, a saber, a política externa americana, ela é o que será
menos discutido nas primárias. A
próxima administração dará ou não
continuidade ao "influxo" (surge),
ou seja, à campanha de contra-insurgência por meio da qual o general
Richard Petraeus está derrotando a
Al Qaeda no Iraque? A guerra contra
o terror vai ser deixada de lado até o
próximo mega-atentado nos EUA?
O Ocidente permitirá que o Irã tenha armas nucleares ou que fundamentalistas tomem o poder no Paquistão? Tais questões não voltarão
ao centro do debate antes que cada
partido escolha seu candidato.
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