São Paulo, quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

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A alma do negócio

Com crise da indústria fonográfica, artistas como Santogold e a dupla Groove Armada gravam músicas ou mesmo discos por encomenda de empresas

THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL

A propaganda é a alma do negócio, alardeia a surrada máxima. Enfraquecida por uma crise que a corrói há anos, a indústria fonográfica vende sua alma -a música- à publicidade.
Há anos a música é utilizada para agregar valor a um produto ou serviço. Mas, hoje, em um mundo em que se encontra música de graça em qualquer blog ou site, ficou complicado para um artista ganhar a sua parte. A solução encontrada por muitos foi o marketing.
Um exemplo dessa nova ordem ocorreu na semana passada, no Midem, a feira da indústria fonográfica, em Cannes. Em geral não se veem artistas nas mesas de conversas do Midem. Mas Andy Cato, do Groove Armada, estava lá -para explicar a parceria entre a dupla inglesa, que já fez megahits como "Superstilyn", e a Bacardi.
O Groove Armada já lançou sete discos de estúdio. No ano passado, rompeu com a gigante Sony BMG e assinou um contrato de 12 meses com a empresa de bebidas. Por esse contrato, o GA excursiona pelo mundo em 25 eventos da companhia e acaba de soltar um EP de quatro faixas, que podem ser baixadas gratuitamente por um site criado pela empresa (www.bliveshare.com).
No dia 2 de março, o Groove Armada lança o EP no formato físico, e os downloads gratuitos serão suspensos. "Queríamos abraçar o fato de que há música gratuita por aí, mas dar a ela algum tipo de valor", disse Andy Cato, durante o Midem.

Strokes e tênis
No final de 2008, uma reportagem do "New York Times" jogava luz sobre o fato de a novata vocalista Santogold ter licenciado oito faixas de seu álbum de estreia para publicidade e games. Algo que já havia sido feito por Moby -todas as músicas do disco "Play" (1999) foram vendidas para publicidade.
A mesma Santogold estrela um comercial da Converse ao lado de Julian Casablancas (dos Strokes) e do superprodutor Pharrell Williams. Eles não apenas estrelaram o anúncio como fizeram uma música ("My Drive Thru") especialmente para a marca de tênis -o vídeo se tornou hit no YouTube.
"Com as verbas que têm, as empresas conseguem convencer artistas a criarem trabalhos especiais", afirma Manir Fadel, diretor de criação da agência Lew'Lara/TBWA. Ele exemplifica: "Fizemos um comercial para a Tim com um menino dentro de um carro e gotas de chuva escorrendo. Compramos uma música de uma dupla desconhecida, Herbatta. O comercial ficou melhor do que se tivéssemos composto a trilha. E ela ficou conhecida. Muita gente foi no YouTube para descobrir quem havia feito a música."
Enquanto alguns veem essa ligação entre música e publicidade como nefasta (a música perderia valor artístico), o veterano produtor Pena Schmidt mostra-se a favor da união.
"É uma oportunidade. É significativo em termos de dinheiro", diz. "Outro ponto é a visibilidade [que gera para o artista]. Qualquer artista luta muito por isso hoje. É algo que acrescenta valor à obra do cara. De alguma forma, ele está sendo reconhecido. Isso não pode ser ruim."
É mais ou menos a opinião de Seu Jorge, que em 2007 compôs uma canção, "Eterna Magia", para a cachaça Sagatiba. A música entrou no álbum "América Brasil". A empresa pagou não apenas pela música mas bancou a turnê do músico. "Isso é negócio, é business", argumentou Seu Jorge, à época.
"É uma das formas de ter sua música ouvida. Os artistas seriam estúpidos se não aproveitassem", diz Santogold.


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